Lula, Gramsci, consciência de classe e bloco histórico

Lula afirmou recentemente, em entrevista concedida a uma determinada emissora de rádio, que ele era o resultado do nível de consciência dos trabalhadores brasileiros.

Reproduzi as falas do Lula na rede social do Reflexões à Esquerda, grupo de discussão política com “sede”  em São Luiz Gonzaga (RS).

Meu amigo Flávio Bettanin, organizador do Reflexões à Esquerda, expediu a seguinte manifestação acerca dos dizeres do Lula:

– Eis a causa dos tropeços. O pensamento dominante de uma época é o pensamento da classe dominante (Marx). A condição de classe difere da consciência de classe. Os que adquirem consciência de classe, rompendo o pensamento dominante, superando o nível de consciência imposto, adquirem a condição de organicamente se posicionarem na luta de classes.

Pois interpreto a fala do Lula de forma diversa, não como a revelação direta da “causa dos tropeços” do PT, dos governos Lula/Dilma, da esquerda ou das lutas sociais (no caso, a falta de consciência de classe de Lula).

Para mim, Lula, em seu discurso sobre a “sintonia fina” de sua consciência individual em relação à consciência coletiva dos trabalhadores brasileiros faz sobressair dois aspectos: (1) um sentimento de pertença de Lula em relação à classe assalariada brasileira; (2) que ele, Lula, não se coloca como uma “vanguarda” da classe assalariada, mas como a expressão viva do estágio de consciência desta classe.

Quero dizer com isso que o objeto mais adequado para eventual reflexão sobre tropeços do PT ou da esquerda (ou de fração importante da esquerda brasileira) talvez não seja o grau de consciência de um individuo isolado, mas o estágio de consciência dos assalariados enquanto classe.

Esse esforço investigativo é que vai permitir a elaboração de um diagnóstico útil para definir os termos da intervenção da esquerda para a tentativa de construção de um novo “bloco histórico”, perceber qual a articulação interna possível na atual situação histórica, levando em consta as experiências recentes.

Falo aqui em bloco histórico naquele sentido gramsciano, da intersecção entre o conjunto das relações materiais e o conjunto das relações ideológico-culturais.

Voltando ao Lula e à crítica formulada pelo Bettanin. Embora sua liderança política e o seu carisma, Lula não tem o perfil de um “agente da superestrutura”, um intelectual orgânico das classes subalternas, com capacidade para fomentar a construção de uma ideologia (consciência) de classe. Lula é mais influenciado do que influencia o conjunto das relações ideológico-culturais – esse é o sentido da sua manifestação!

Quero dizer com isso o seguinte: se a burguesia sustenta sua hegemonia ideológica, mantendo em pé seu bloco histórico (ainda que numa grande crise do capitalismo), isso decorre da incapacidade do conjunto de “intelectuais orgânicos” da esquerda em fazer avançar um novo bloco, de disseminar junto às massas, especialmente no mundo do trabalho, a concepção socialista e libertária.

Poderia se dizer, por exemplo, que o passeio do PT pelo sistema de financiamento de campanha tradicional não ajudou muito. E é verdade. Mas, por outro lado, inúmeras políticas de inclusão social dos governos Lula/Dilma foram favoráveis à construção de consciência. Placar empatado.

O problema, portanto, é bem maior.

Redação

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