Mas afinal, o Brasil possui uma elite?, por Carlos Potiara Castro

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Mas afinal, o Brasil possui uma elite?

por Carlos Potiara Castro

Em 2006 durante a feira de aviação de Fairford, na Inglaterra, foi realizada uma rara demonstração pública de uma dos aparelhos mais estratégicos da aeronáutica norte-americana, o bombardeiro B-2 Spirit. Com tecnologia furtiva que o torna invisível aos radares, suas aparições são sempre rodeadas de cuidados para que ele não seja espionado por empresas e governos de outros países. Quando o B-2 fez seu voo de exibição ao público entretanto, alguns oficiais britânicos discretamente posicionados próximos à pista do aeroporto testaram um radar desenvolvido localmente com novos sensores que conseguiu rastrear perfeitamente o avião. Essa cena foi filmada e foi um dos assuntos do jornal da noite da televisão britânica, onde apareciam os jovens e sorridentes oficiais contando a história.

Naturalmente, os Estados Unidos fizeram uma reclamação pública. Mas em realidade não havia uma afronta direta a esse país. Ao contrário, foi uma forma ousada e para eles bem humorada de não permitir que imaginem que o Reino Unido é uma carta fora do baralho das relações estratégicas mundiais. Pequenas provocações como essas acontecem esporadicamente entre os países que possuem políticas de construção e sustentação de uma influência global, mesmo entre os parceiros históricos.

Por trás de uma ação como essa há uma cultura popular legitimadora. Em particular, há uma classe social, que podemos identificar como uma elite local, não necessariamente econômica, mas que cuida dos assuntos de interesse direto de seu país. Bem formada e intelectualizada, essa elite ocupa posições no estado e em organizações privadas cujo acesso se fez pelo mérito. E compartilha valores comuns no que refere ao fortalecimento da sociedade a que pertence e ao posicionamento de seu país enquanto jogador pleno no xadrez internacional.

Obviamente, não se trata de uma exclusividade daquele país. França e Alemanha, seus vizinhos, China, Japão, Coreia, Canadá e Rússia, todos possuem um corpo semelhante, que não se legitima socialmente pelo patrimônio, mas pela função que desempenha. Para essa elite, o grande esporte não é o futebol, mas a demonstração de sua capacidade de ação estratégica e de realização de uma leitura de mundo de longo prazo.

O Brasil se empenhou nas últimas duas décadas em profissionalizar o estado e construir carreiras com um perfil que se assemelhasse a esses corpos, com um nível de sucesso mitigado. Entretanto, não há clareza sobre sua real margem de manobra diante do nível de subordinação das instituições deste país a todo tipo de interesses setoriais privados. Em princípio, não temos portanto algo que se assemelhe a uma elite no sentido global do termo.

O que temos de fato são pessoas ricas. E são elas que definem em larga medida os assuntos estratégicos do país, mesmo sem o instrumental e a legitimidade social necessária. A falta de transparência que acompanha esse quadro e o foco eterno dessas pessoas no aparelhamento da coisa pública reduz o potencial coletivo da sociedade brasileira a uma sombra de si mesmo. Para elas, lidar por exemplo com uma agenda estratégica como a tecnológica cria um antagonismo imediato. Pois aquilo que se desenvolveu nas últimas décadas em tecnologia de ponta deveu-se ao mérito e seriedade de seus criadores e não à promiscuidade com instituições reguladoras.

Os momentos de grande crise de legitimidade, como o que vivemos atualmente, podem servir para se erguer os melhores valores que uma sociedade possui. O espetáculo diante dos olhos de todos de uma fratura de classes e da complacência de uma larga parcela de novos e velhos ricos com o ethos deste período político, permite que surja um interessante campo de ativismo popular.

E este país, pela própria posição que ocupa, precisa urgentemente domesticar esses segmentos sociais que pouco contribuem com o seu potencial latente. E há um largo espaço de trabalho para introduzir esse novo esporte nacional, que tanto mobilizou os povos na história das sociedades mais bem sucedidas, que é o jogo da disputa da inteligência e da capacidade técnica nacional com a de outros países e regiões. Esporte sério mas também lúdico, ele demanda uma sociedade igualitária e dinâmica, mas só pode se consolidar sem a inconveniência dessas pretendidas elites.

Carlos Potiara Castro – jornalista, formado pela Universidade de Paris 8 e doutor em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Campinas. Professor da Faculdade de Comunicação da Universidade de Brasília

 
Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

20 Comentários

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  1. Sim.
    O Brasil possui uma

    Sim.

    O Brasil possui uma elite.

    Mas a elite brasileira é bestial.

    Ela se distingue pelo consumo e, sobretudo, pela perversidade.

    Causa da miséria, ela culpa o miserável e o desumaniza até que ele seja morto pela PM ou preso porque sentou na porta de um Fórum.

    A bestialidade da nossa elite impede que ela seja tratada como elite nos outros países. Mas isto parece não incomodá-la, pois ela prefere ser um “cachorro vira latas” entre europeus e norte-americanos desde que a hierarquia a mantenha no topo da pirâmide social no Brasil.

    As realizações artísticas, humanas, literárias, científicas, jurídicas, filosóficas e econômicas da elite bestial brasileira são nulas. Mas isto também parece não incomodá-la. Ela prefere consumir as realizações dos outros povos para poder se achar melhor do que os miseráveis que ela odeia e mesmo criou. 

    1. Bem resumido, Fábio. Para

      Bem resumido, Fábio. Para termos uma elite civilizada, esta que está aí terá que desaparecer. Para tanto, parece que a única alternativa é o golpe produzir uma hecatombe social e à partir do zero nascer uma nova sociedade. 

  2. Ouvi da boca de um empresário

    Ouvi da boca de um empresário “médio” a seguinte afirmação: Nâo me importa se o regime é capitalista, socialista ou se estão roubando, desde que eu esteja ganhando meu dinheiro.

    Não preciso dizer que votou no aécio e apoiou o golpeachment.

  3. Em tudo há uma elite!
    No

    Em tudo há uma elite!

    No esporte, por atividades temos a elite dos melhores

    Na tecnologia, a mesma coisa

    Na saude, temos a elite dos profissionais que sobressaem

    No caso da politica e no Brasil, temos uma só elite: POLITICOS, JUDICIÁRIO, FFAAs, temos a ELITE MAIS ENTREGUISTA DO MUNDO.

  4. Então… As universidades

    Então… As universidades estão a mingua. O único seguimento da sociedade que se levanta para defender o país são as Forças Armadas,  que vem do golpe de 64.A imprensa é a miséria intelectual e moral  que esta aí. O Judiciário,além de corrupto,faz questão de destruir a Constituição cuja guarda lhe cabe e a elite financeira é o Lemman, que doa 19 milhões  de dólares para Harvard e fez o golpe para se apropriar da Eletrobrás que vale 220 bilhões e ele vai passar a mão por 20. 

    Sobra o Chico Buarque, os jornalistas dos blogs sujos, o Lula que vai ser cassado, o Raduan Nassar, o Criolo, Racionais e os jovens que vão ser acusados de terroristas.

    O Brasil continua sendo o país do futuro.

      1. Mas foi a única instituição

        Mas foi a única instituição que se posicionou sobre o desmonte do país. Não estou defendendo um golpe militar só citando que a única voz dissonante foi uma instituição que, como tradição, tem a violência do golpe de 64.

        Estamos lascados.

        1. Discordo, Vera…

          Se tivessem REALMENTE preocupados com algum desmonte, não teriam participado do Golpe DESDE O INÍCIO. Ou você acha que um golpe desses seria dado SEM O AVAL MILITAR?

          O que estamos vendo agora é uma série de mensagens cifradas de lideranças militares voltadas principalmente PARA O PÚBLICO INTERNO. É uma disputa INTRAMUROS. É o alto oficialato mandando recados para o alto oficialato.

          A razão para as FFAA estarem se manifestando agora, no meu modo de entender, se deve única e exclusivamente ao fato de não terem sido contempladas no butim. Se receberem alguma migalha, voltam a ficar quietinhos.

          As FFAA continuam onde sempre estiveram: com a cabeça no mundo da Guerra Fria.

          O alto oficialato de hoje é formado por recrutas que ingressaram nas FFAA (e foram doutrinados) durante a Ditadura Civil-Militar.

          Quem se desesperou com o desmonte do país (e não foi o único), foi o Prof. Moniz Bandeira. Entendo perfeitamente o desespero dele, que fez com que pedisse uma intervenção militar.

          Ocorre que, para as FFAA, o inimigo continua sendo o mesmo de sempre: a esquerda.

  5. Nosso tipo de elite é o pior

    O Brasil tyem sua elite. Mas sua origem é em grande causa sua danação e a danação do país.

    Quando Portugal invadiu o Brasil, a Elite portuguesa não veio pra cá. Ficaram lá, como nobreza ou ricos comerciantes, explorando a distancia e só colhendo os lucros.

    Mas mandaram pra cá capitães mor e representantes. Estes tinham total poder sobre a terra, podiam explorar e mesmo matar os locais inferiores, desde que obedecessem aos verdadeiros chefões no exterior e enviassem o grosso do lucro pra verdadeira elite lá fora. Assim se formou a elite local, assim é até hoje: Uma elite pelega, capacho, sub tenente, comodista, mediocre, obediente, e qeu rpecisa ter um superior estrangeiro rpa obedecer, serja português, inlgês, estadunidense ou chinês.

    Assim Lula tentou criar os super campeões nacioanis, a nossa elite mundial, e estes sabotaram Lula, o país e o próprio plano, pois, no funod, são covardes, comodistas,entreguistas e mediocres em suas peqeunas ambições.

    Precisamos ter uma elite que ambicione ser dona do mundo, como as elites alemãs, japonesas, chinesas e estaduninses são. mas como?

  6. Não. O Brasil tem uma

    Não. O Brasil tem uma ladronite. Não salva um. Todos são pig, todos são psdb. E abaixo da ladronite está a classe mérdia, bucha de canhão da ladronite, seres desprovidos de caráter e inteligência cujo único objetivo é fazer parte da roubalheira, mas pouquíssimos chegam lá, donde se conclui que são mais burros do que ladrões. As reuniões de condomínio estão infestadas desses seres.

    1. não…

      O sr. só não especificou quem é nossa única Elite.Elite Esquedopata do Poder Público. Enquanto tivermios um país, riquezas naturais para sustentá-la, não haverá uma revolução social. Esta é a transformação democrática a ser conquistada. Para que desenvolvimento, expansão econômica e formação de classe média? Se nossaElite apenas precisa ir se alternando em Cargos Públicos Indicados. O que creem ser parte da sua herança na Capitania Hereditária. São Desembargadores, Conselheiros em Tribunais de Contas, Secretários, Procuradores, Ministros, Advogados do Estado, da União…Quando este Estado não comporta mais tamanha Elite, então se privatiza uma parte deste Estado. Então Conselheiros de Agências Reguladoras, Diretores de Estatais, Donos de Cartórios (porque cartório é algo imprescindível à Humanidade), Leiloeiros Oficiais…. Nomes, sobrenomes e Famílias se revezam. Vamos começara dar nomes aos bois?   

  7. Definitivamente NÃO. Tem é um

    Definitivamente NÃO. Tem é um bando de asnos incultos bastante endinheirados que pensam que este os torna menos estúpidos, preconceituosos, ignorantes e vulgares do que realmente são.

    São tão primários e simplórios que o que veem diante de si não é um território com potencial para se tornar superpotência, mas apenas um imenso território que podem predar e um juntamento de pessoas que consideram lixo.

    Na verdade quando penso nesses imprestáveis me vem a mente imediantamente a imagem de um senhor feudal que reservava uma parte de suas terras exclusivamente para seu deleite. É isso. Acho que, muito mais do que senhores de escravos, esses burros que nos governam não passam de senhores feudais.

  8. há algum tempo não uso o

    há algum tempo não uso o termo elite pra designar ricaços estúpidos, entreguistas, predadores, egoístas. estou usando magnata, que só tem mesmo dinheiro e exerce o poder por meio da compra de consciências mais maleáveis.

  9. Não temos elites nem à esquerda, nem à direita

    Nossa esquerda se tornou preguiçosa com a adesão incondicional ao petismo e a dogmas do século passado. Lula decepcionou pelo pensamento de curto prazo, sem pretensões a nenhuma reforma para o país, e por se misturar ao ponto da simbiose com o que existe de pior.  Já nossa direita, quando não é semi-analfabeta, é protecionista e ama uma teta estatal, como se vê na FIESP. Nosso problema não são as elites, mas sim sua inexistência no Brasil.

  10. A gente fala do que não conhece

    Mas Hildegard Angel – que fez há dias um belíssimo texto defendendo Zé Dirceu – circula entre os superricos e tem mais propriedade no assunto.

    Num artigo que explica porque Lava Jato e mídia não entendem nada do mercado de luxo, sua análise sobre a nossa elite é de dar ânsias de vômito.

    Cabral não lavou dinheiro com joias, teve prejuízo

    https://www.brasil247.com/pt/247/rio247/304785/Hildegard-Angel-Cabral-n%C3%A3o-lavou-dinheiro-com-joias-teve-preju%C3%ADzo.htm

    […]

    A mídia nacional, no capítulo luxo, é completamente desorientada. Qualquer casa de dois pisos é mansão. Qualquer copeiro é mordomo. Igual novela de Gloria Magadan.

    Aliás, e já que estou embalada, o mesmo está acontecendo com as antiguidades, cujo mercado no Brasil está super na baixa. As peças boas não são mais encontradas nos antiquários, está tudo nos leilões internacionais. E o brasileiro rico (rico rico) só está comprando nos leilões lá de fora. As peças importantes, pinturas da Renascença, torsos romanos de mármore do século 1, vasos gregos do século 6 Antes de Cristo, os móveis do século 18 assinados, as cômodas Biedermeier, as joias de Van Cleef, Bulgari e Fabergé – até o cachimbo do Einstein! – ele adquire nesses leilões bacanas e deixa em seus depósitos no exterior ou em seus apartamentos em Londres, Paris, Nova York.

    O rico brasileiro de verdade já desistiu do Brasil. Está pouco se lixando se tem gente pobre, vivendo e defecando nas ruas. Não é que ele seja insensível, é que ele não vive aqui. Ele está por aqui. Tem seu apartamento à beira mar, frequenta seu clube, onde joga tênis, convive com seu reduzido círculo de amigos e ponto. Depois, embarca no seu jato para a residência lá fora. O Brasil é para ganhar dinheiro e remeter dinheiro. Este rico não tem mais o embaraço da língua, como alguns ricos de gerações anteriores, pois os filhos e netos já dominam o inglês desde que nascem e sequer conhecem a nossa História. O rico brasileiro é globalizado, não tem brio patriótico, ao contrário, sente bastante preconceito e desprezo em relação ao nosso país, onde lamenta ter nascido. Existem, naturalmente, as raras exceções. Por isso mesmo, louváveis.”
     

  11. “O Brazil não merece o Brasil”

    A elite brasileira é aquela que quando abre a boca para falar do Brasil so sai desprezo. Certa vez Gilberto Braga disse que a “Odete Roitmann” não é era uma personagem inventada ou tão caricata assim. Ela existia e aos montes na elite carioca que ele conhecia bastante bem.

  12. Poder econômico não é elite…

    Poder econômico não é elite… mas este  a suplanta pois, de forma geral, o indíviduo que ascende ao poder não é propriamente um intectual culturalmente e sim um ganancioso. Tão sem valores que mente, engana, para que o seu interesse e de seus pares de (falta de) caráter prevaleça. Unidos, em muitos momentos (como neste), desafiam a elite verdadeira e estão vencendo. Torço para que a elite intelectual e cultural volte a civilizar os destinos deste País, e do mundo também. O mal acontece em muitos lugares, não estamos sós. 

  13. Poder econômico não é elite…

    Poder econômico não é elite… mas este a suplanta pois, de forma geral, o indivíduo que ascende ao poder não é propriamente um intelectual culturalmente e sim um ganancioso. Tão sem valores que mente, engana, para que o seu interesse e de seus pares de (falta de) caráter prevaleça. Unidos, em muitos momentos (como neste), desafiam a elite verdadeira e estão vencendo. Torço para que a elite intelectual e cultural volte a civilizar os destinos deste País, e do mundo também. O mal acontece em muitos lugares, não estamos sós…

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