Grupelho de baderneiros.
Creio que foi no Blog do Mello que encontrei uma frase de Bernard Shaw que me perturbou.
“Você vê as coisas que existem e se pergunta: por quê? Eu imagino coisas que não existem e me pergunto: por que não?”
O que isso tem a ver com as manifestações que têm incendiado o centro de São Paulo promovidas pelos jovens do Movimento Passe Livre?
A busca da razão e do motivo. E a intuição de que não vou achá-los no aumento das passagens.
Todos fomos surpreendidos, quando quinta ou sexta-feira da semana passada um grupo de estudantes e militantes de partidos de extrema esquerda paralisaram a Avenida Paulista aqui em São Paulo, quebraram vidraças de agências bancárias, picharam ônibus e paredes, destruíram cabines da polícia e atearam fogo a sacos de lixo como barricadas.
O caos instalado sem prévio aviso.
Perguntamo-nos: contra que esse protesto?
Contra o aumento de vinte centavos na passagem de ônibus.
É irrazoável. As passagens não eram reajustadas desde 2011, o aumento estava anunciado desde janeiro e era de 6,67%, muito abaixo da inflação do período.
Quem eram os manifestantes? Eram de um movimento que se agrupa pela internet, MPL – Movimento pelo Passe Livre. Já haviam feito outros protestos e o que reivindicam, ou seja, transporte gratuito, podia ser algo romântico mas irrealizável. Como sabemos, o dinheiro para custear as passagens livres teria de ser tirado de algum lugar. De onde o tirar, da educação, da saúde ou dos investimentos?
Idealismo ou irresponsabilidade, típicos de jovens de pouca idade, a maioria abaixo de 25 anos.
Eram muitos? Não. Alguns poucos milhares.
Muito menos do que se agrupa em uma partida de final campeonato, talvez dez vezes menos.
Têm apoio popular? Nenhum. Representam a si mesmos e suas ideias.
Alguns manifestantes diziam que lutavam pelo povo, mas estava claro que não lutavam com o povo.
No mesmo momento em que protestavam pelo aumento das passagens, ocorria uma greve de ferroviários da CPTM. Nenhum integrante do sindicato participou das manifestações e as reivindicações dos trabalhadores não despertaram nenhum interesse no movimento. São assuntos e interesses claramente associados.
Nenhuma ONG de bairros dos extremos das zonas sul e leste, periferias que sofrem cotidianamente com o transporte coletivo, participou da manifestação. Enquanto os manifestantes fechavam as avenidas, os trabalhadores presos nos ônibus tentavam voltar para suas casas.
A violência utilizada nos protestos nos assustou, e somada a pouca relevância da reivindicação nos fez concluir: grupelho de baderneiros.
Um grupelho de baderneiros e porras-loucas não precisa de uma causa, basta-lhe um pretexto. Ainda que vinte centavos seja pouco até como pretexto.
Mas os protestos seguiram-se e o grupo se renovava em ânimo.
Não eram porras-loucas, portanto, mas não tinham uma causa aparente. Lutavam tanto por quê? E por que a violência como forma de atuação política? Ela é contra producente.
Fomos olhar mais de perto os manifestantes. Parecem com os nossos filhos. São os mesmos jovens que foram espancados na USP e na marcha da maconha. São jovens intelectualizados, aparentemente das classes média remediada e baixa.
É diferente em qualquer jogo de futebol com grandes torcidas? Não estão lá também a cavalaria, o choque, as balas de borracha e os hematomas em costas jovens. Essas cenas não ocorrem a cada semana durante o ano inteiro? Por que não nos indignamos, por que não identificamos os jovens integrantes das uniformizadas como nossos filhos?
Terrorista suja.
Zeitgeist, ou o mal estar de uma geração.
Como na década de 60, há um mal estar no ar. Um clima de revolta jovem e planetária.
Occupy Wall Street nos EEUU, Indignados 15M na Espanha e outros tantos na Grécia, a Praça Tahrir no Egito e a Praça Taksim na Turquia. Paris novamente em chamas, agora pelas mãos de jovens imigrantes africanos e mulçumanos alijados de qualquer direito de cidadania.
Os manifestantes do Movimento Passe Livre que incendeiam o centro de São Paulo estão alinhados ao seu tempo.
Mas lutam por vinte centavos?
Talvez não, talvez os 20 centavos sejam o símbolo de algo ainda não racionalizado. O mal estar de uma geração.
Uma geração sufocada por um conservadorismo que a tudo e a todos regula, rege, vigia e pune. Talvez, como os cães da Tunísia durante a Primavera Árabe, não queiram comer e sim poder ladrar.
Talvez os que se identificaram com eles não os tenham visto como seus filhos, mas como a si mesmos e o seu próprio mal estar.
Talvez.
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