Mudanças à vista nas relações Estados Unidos-México, por Rafael Bernal

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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do OPEU – Observatório Político dos Estados Unidos

Mudanças à vista nas relações Estados Unidos-México

por Rafael Bernal

Traduzido do The Hill*

O vencedor da eleição presidencial de domingo no México está pronto para fazer mudanças profundas no relacionamento do país com os Estados Unidos, no momento em que as duas nações discordam cada vez mais sobre as políticas do presidente Trump.

Andrés Manuel López Obrador, conhecido coloquialmente como AMLO, fez uma campanha radical contra a corrupção. Mas, em muitos aspectos, sua abordagem para as relações EUA-México foi semelhante à de seus oponentes, pois Trump e suas políticas continuam profundamente impopulares em todo o espectro político mexicano.

“AMLO foi bastante reservado em relação aos Estados Unidos durante a campanha; todos os candidatos foram críticos (de Trump)”, disse o Earl Anthony Wayne, ex-embaixador dos Estados Unidos no México no governo do ex-presidente Obama.

Espera-se que López Obrador traga um tom claramente diferente para as relações bilaterais do que o atual presidente Enrique Peña Nieto, cuja abordagem cautelosa e diplomática em relação a Trump foi, quase unanimamente, criticada pelos eleitores mexicanos.

Ainda assim, López Obrador provavelmente enfrentará muitos dos mesmos desafios em questões fundamentais, desde o Acordo de Livre Comércio da América do Norte (NAFTA) e a imigração, até as relações pessoais com Trump.

“Ele terá de andar nessa linha tênue e fina que o atual governo teve que percorrer nos últimos dois anos”, disse Christopher Wilson, vice-diretor do Instituto do México, do Woodrow Wilson Center.

NAFTA

López Obrador, que na década de 1990 era um adversário do NAFTA, poderia trazer uma abordagem radicalmente diferente às negociações em andamento para reformular o tratado, que afeta mais de 80% das exportações do país.

López Obrador diz que agora apoia o tratado, mas sua oposição passada e sua ideologia de esquerda preocupam alguns dos proponentes mais fortes do NAFTA.

“Soube por algumas pessoas que ele está moderado e que seus conselheiros econômicos não são socialistas completos, mas estamos muito preocupados em ter uma situação como a da Venezuela ao sul de nossa fronteira”, disse o deputado Michael McCaul (R-TX), presidente do Comitê de Segurança Doméstica da Câmara e um poderoso defensor do NAFTA.

Enquanto isso, Trump provavelmente continuará com a política de tarifas e de ameaças de sair do acordo como tática de negociação para lidar com o México e o Canadá. O presidente eleito do México sofre pressão política para ser visto como “não intimidado”, disse Christopher Wilson.

Conhecido por ter pavio curto e pela intolerância com dissidentes, espera-se que López Obrador exerça controle direto sobre seu partido, o Movimento Regeneração Nacional, e sobre seus aliados, assumindo tom mais agressivo nas negociações.

“Acho que ele não será tão passivo quanto Peña Nieto em relação ao NAFTA. Defenderá a soberania do México fortemente”, disse o deputado Raúl Grijalva (D-AZ.).

Ainda assim, o novo governo de López Obrador pode ver o NAFTA como uma forma de começar o mandato presidencial com pé direito.

“A primeira coisa positiva que se pode fazer é concluir as negociações do Nafta”, disse Wayne.

Imigração

Trump e López Obrador terão que se falar com cuidado sobre o tema quente da imigração.

Lopez Obrador, um defensor da tradicional doutrina mexicana de não intervenção e autodeterminação nos assuntos externos, será forçado a sair de sua zona de conforto para criticar o histórico de direitos humanos de um país estrangeiro, a menos que a política dos Estados Unidos em relação aos migrantes mude.

“Seremos amigos de todos os povos e governos do mundo”, disse ele. “Na política externa, vamos praticar de novo os princípios de não-intervenção, autodeterminação dos povos e solução pacífica de controvérsias.”

Mas, enfrentando pressões internas e externas, López Obrador terá que encarar diretamente Trump quando se trata de imigração.

“Gostando ou não, sendo ou não um típico político que se envolve em assuntos de outras nações, terá que abordar a questão”, disse a deputada Norma Torres (D-CA.), integrante do Comitê de Relações Externas da Câmara.

De acordo com os resultados das eleições preliminares, López Obrador venceu entre os eleitores fora do México – esta foi a primeira eleição a apresentar oportunidades significativas de voto para os expatriados – numa proporção de quase 3 para 1 sobre o segundo colocado, Ricardo Anaya.

É um sinal de que os mexicanos que vivem nos Estados Unidos esperam que ele cumpra as promessas de proteger os migrantes das ações do governo Trump.

“Com o governo dos Estados Unidos da América buscamos uma relação de amizade e cooperação para o desenvolvimento, sempre baseada no respeito mútuo e na defesa de nossos compatriotas migrantes que vivem e trabalham honestamente naquele país”, disse López Obrador em seu discurso de vitória.

Venezuela

López Obrador também poderia se diferenciar de seu antecessor quando se trata da abordagem em relação à Venezuela.

Peña Nieto e Trump encontraram campo em comum na críticas ao ditador da Venezuela, Nicolás Maduro.

Por outro lado, os líderes do partido de López Obrador anunciaram publicamente suas ligações com Maduro.

O vice-presidente Pence destacou as relações latino-americanas do governo, cortejando os poderes regionais em oposição aos países considerados hostis aos Estados Unidos, incluindo Venezuela, Cuba e Nicarágua.

E o México liderou o Grupo de Lima e a Aliança do Pacífico, alianças nacionais com interesses democráticos e econômicos semelhantes.

“É possível que o México desempenhe um papel de liderança menor no Grupo Lima”, disse Eric Olson, vice-diretor do Programa Latino-Americano do Wilson Center, acrescentando “ser improvável que o México se retire”.

Maureen Meyer, diretora sobre México e direitos de migrantes no escritório do Washington Office on Latin America, um centro de estudos progressista, disse que “ainda é cedo para dizer se os objetivos da política externa de Trump e López Obrador coincidirão”.

“Se o governo López Obrador adotar uma política externa focada no não intervencionismo, isso não impedirá que ele mostre preocupação com políticas e práticas em outros países, incluindo graves violações dos direitos humanos, embora seu governo provavelmente vá desempenhar um papel diferente do atual governo mexicano nos diálogos regionais “, disse Meyer.

Duncan Wood, diretor do Instituto do México, no Wilson Center, disse que há ânsia na América Latina por um líder pan-regional de esquerda que consiga liderar o processo anticorrupção regional.

“A América Latina é uma das áreas em que (López Obrador) pode aparecer como super estrela política”, disse Wood.

Relações pessoais com Trump

O estilo pessoal de López Obrador contrasta nitidamente com o de Peña Nieto – e muitas vezes lembra muito o de Trump.

O líder mexicano é propenso a respostas prolixas e prescrições políticas vagas, incluindo seu principal lema de campanha para erradicar a corrupção no México. Perguntado várias vezes durante a campanha sobre detalhes de sua política anticorrupção, López Obrador repetiu que acabaria com a corrupção dando o exemplo.

Sua equipe foi considerada uma influência moderada sobre um político eventualmente irascível.

“Soa muito familiar. A questão que fica: será como Trump, que todos nós pensamos que seria suavizado por seu gabinete e seus assessores? Vimos que isso não aconteceu. Essa é uma pergunta aberta para Obrador. “Não sei”, disse o deputado Henry Cuellar (D-TX).

As primeiras interações entre Trump e López Obrador foram aparentemente cordiais.

Trump ligou para López Obrador na segunda-feira – presumivelmente com a ajuda de um tradutor, já que o presidente eleito tem fama de não falar inglês.

“Recebi um telefonema de Donald Trump e conversamos por meia hora. Propus explorar um acordo abrangente; de ​​projetos de desenvolvimento que gerem empregos no México … reduzir a migração e melhorar a segurança. Houve tratamento respeitoso e nossos representantes vão conversar”, tuitou López Obrador logo após a ligação.

Observadores disseram que as semelhanças entre as personalidades dos dois homens – e as campanhas que os levaram ao poder – poderiam fomentar um relacionamento próximo.

“Ele usou plataforma parecida – México Primeiro – e as personalidades são provavelmente muito semelhantes. Se isso significa que haverá um conflito ou respeito mútuo, não sei dizer. Às vezes, Trump respeita os homens fortes “, disse McCaul.

Tradução por Solange Reis

*Artigo originalmente publicado em 02/07/2018, em http://thehill.com/latino/395278-a-change-is-coming-to-us-mexico-relations

 
Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

5 Comentários

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  1. Cambada de vira-latas

    Se no México, igualmente toda América latina, não tivesse só vira-latas eles desenvolveriam até uma bomba atômica, aí mudava a relação com os EUA de vez. Mas é uma elite que ama Miame, vai continuar de cócoras como sempre foi.

    1. Sob a América
       

      O México fica exatamente debaixo dos states.

      O mais que ele pode fazer e dizer é mexico primeiro.

      Se é que v. me entende.

      Afora o chiste, enquanto o México não se livrar da Televisa, ele será um Brasil na américa do norte.

  2. O que pode um homem?

    é um homem!

    AMLO.

    Se esse homem se tornar uma ameaça ao sistema, será esmagado, claro.

    Na minha opinião, esse centralismo não tem futuro..

    .. é preciso criar estruturas para que o povo sustente as mudanças que deseja..

    .. colocar isso nas costas de um homem tornou-se inviável..

    .. sequer é justo..

    1. Neste caso específico o

      Neste caso específico o centralismo é da imprensa.

      Ou o Partido de Obrador não tem ingerência nenhuma

      em seu programa de governo?

  3. “Peña Nieto e Trump

    “Peña Nieto e Trump encontraram campo em comum na críticas ao ditador da Venezuela, Nicolás Maduro.”  

    Agora entendi, artigo totalmente imparcial; Traduzido do THE HILL!

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