O grande jogo do século XXI

A imprensa ocidental ataca ferozmente o Estado Islâmico, mas raramente diz que o mesmo foi criado com ajuda dos EUA. A existência de consultores militares norte-americanos na região é uma possibilidade real e explica porque a Casa Branca insiste em impedir que outros países dêem assistência ao regime de Damasco.

O primeiro enfrentamento entre russos e norte-americanos na região foi naval. Uma frota dos EUA ficou frente a frente com uma frota da Rússia próxima ao litoral sírio. Segundo alguns, os norte-americanos chegaram a disparar alguns mísseis que foram interceptados pelos russos.

Nos últimos dias fomos surpreendidos por duas notícias que geram interesse e cautela. A primeira é o envio de soldados iranianos para combater os degoladores de infiéis na fronteira de Síria e Iraque. A segunda é a existência de uma frota chinesa rumando para a região de conflito. Russos e chineses solidificaram uma aliança para garantir um regime que norte-americanos estão tentando destruir de todas as maneiras.

O envolvimento da China e da Rússia no conflito da Síria é perfeitamente compreensível. Os chineses importam petróleo do Irã, país ameaçado pela expansão do Estado Islâmico, fato que sem dúvida ocorrerá caso Assad seja removido do poder na Síria. Os iranianos compram armamentos e tecnologia nuclear da Rússia. China e Rússia tem interesses econômicos e estratégicos na região e, sem dúvida alguma, resolveram desafiar abertamente a hegemonia planetária dos EUA.

Gostemos ou não as relações internacionais em curso se definem pela hegemonia dos EUA.

“Giovanni Arrighi, que dificilmente pode ser visto como um membro da Teoria da Dependência,  havia percebido que a ascensão das grandes potências, que definem o sistema internacional, ocorre justamente em ambiente de guerras e disputas coloniais. Disso nascem os ciclos históricos comandados pelos países hegemônicos que transformam a parte derrotada política e economicamente em periferia. Assim  se deu com a preeminência holandesa no século XVII e posteriormente com a Grã-Bretanha no século XIX.

E o século XX contaria com a hegemonia norte-americana que demonstraria desenvoltura internacional, que não apenas reproduziria a das antigas potências mundiais, mas traria renovações que somente um país das qualificações dos Estados Unidos teria condições. O volumoso parque industrial presente em todo o mundo, a grandiosa máquina de guerra e a poderosa relação financeira com o dólar são itens que, para Arrigh, impulsionam Washington à posição de centro mundial da política internacional.” (Teoria das Relações Internacionais, André Luis Varella Nunes (org.), editora Vozes, Petrópolis-RJ, 2014, Capitulo 6 de autoria de José Alexandre Altahyde Hage, p. 271)

É exatamente a credibilidade desta hegemonia que está em disputa na Síria. Russos e chineses deixaram aos norte-americanos apenas duas opções: abandonar o Estado Islâmico à própria sorte e se aceitar a redução de sua influência no Oriente Médio; entrar em guerra com a Rússia e a China sob a alegação de que ambas não tem direito de proteger o regime de Assad. Um terremoto de proporções inimagináveis está ocorrendo no mundo e certamente afetará a política externa dos EUA nos próximos meses. A afirmação do pré-candidato Donald Trump de que não entraria em guerra por causa da Síria é um fato importantíssimo. Se ele for eleito o império começará a ser desmantelado? As palavras dele, contudo, não representam um consenso.

O Japão aprovou uma nova lei que o coloca militarmente ao lado dos EUA em caso de conflito. É sintomática a reivindicação japonesa de retomada do controle das Ilhas Sakalinas, conquistadas pela Rússia durante a II Guerra Mundial. O aumento da presença militar orte-americana na Ucrânia e no Mar da China sugerem que o grande jogo apenas começou. Os EUA e os traficantes cariocas agem segundo a mesma lógica: ambos se preparam para a guerra a fim de preservar o controle dos territórios em que traficam suas mercadorias (drogas, armamentos e influência).

Qualquer que seja a solução desta disputa, o mundo não será o mesmo. Se houver guerra entre potências na Europa, no Oriente Médio e na Ásia, será melhor para o Brasil se esforçar para garantir a paz no Atlântico Sul. 

Fábio de Oliveira Ribeiro

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