Onde ficou a Tradição Oral?, por Pedro Henrique Magalhães

Onde ficou a Tradição Oral?

 Pedro Henrique Muniz Fernandes Magalhães

“Saulo, Saulo, por que me persegues?” (At 9,4). Estando Saulo sozinho neste episódio, ou ainda acompanhado, como soubemos deste fato que mudou o rumo do Cristianismo?

Segundo uma colocação de Chico Xavier, no Programa Pinga Fogo na extinta rede Tupi, as Tábuas da Lei foram recebidas por Moisés via escrita direta. A afirmação era de Emmanuel. Tirando esse único fato, todos os outros são contos, são histórias contadas.

Segundo a História do Espiritismo, Kardec enviou centenas de perguntas para vários médiuns e os espíritos responderam (http://www.febnet.org.br/blog/geral/o-espiritismo/historia-do-espiritismo/)! Como os homens receberam tais informações senão por histórias contadas por espíritos a médiuns?

Ainda que fossem psicografias, em algum momento um espírito contou a outro, que escreveu através de um médium, pois nenhum deles foi testemunha e relator direto dos fatos. Todo conhecimento se alastra pelos contos aos quatro cantos do mundo e cria no último ouvinte a sensação de ser o primeiro a aprender por que ouviu. O encanto é aprender e todo aprendiz é o primeiro a sentir o prazer do aprendizado. Que enrolado, não?

“No princípio Deus criou o céu e a terra.” (Gn 1,1). Como foi que o Homem ficou sabendo disto? Testemunhou?  A Filosofia nasceu dos questionamentos do Homem, criando mais questões que nasceram de outras que lhes antecederam para tentar explicar todas as perguntas que a alma humana cria para responder o vazio de si mesma. Enrolou de novo, né?

Quando o Caboclo Sete Encruzilhadas se manifestou num longínquo dia de 1908 através de Zélio Fernandino de Morais, ele anunciou a fundação de uma nova religião em terras brasileiras. Dava início a uma retomada dos contos através dos ensinamentos dos ancestrais dos homens, contando histórias para educar, assim como o Cristo o fazia. Como é o nome desta modalidade? Tradição oral, não?

Todos os ensinamentos retirados dos diálogos entre médiuns e mentores, assim como foi com Chico Xavier e Emmanuel, são ou foram o que? Será que somente os ensinamentos que médiuns renomados receberam têm valia? Credibilidade? Por que eles têm essa primazia e os menos conhecidos não? O ensinamento que eles retransmitem e referenciam seus mentores como fonte é o que mesmo? Resultado de uma tradição oral!

Vivemos um período na História da humanidade de infinitas conexões, o que faz da transmissão de informações, da possibilidade de diálogos e troca de conhecimentos um número impossível de ser quantificado. O que nos faz acreditar numa história contada ou informação repassada? A fonte! Sempre foi assim e sempre será.

Não necessariamente a fonte precisa ser famosa. Ela precisa satisfazer a nossa confiança e confiança é uma questão de fé também. Mulçumanos não creem no Cristo senão como profeta, enquanto que para os cristãos Maomé não representa mais que outra religião.  

Isto nos parece perfeitamente normal porque estas características impulsionaram as Cruzadas, dando corpo ao preconceito religioso, que ficaram conhecidas como Guerra Santa.

Sei, claro, que existem muitos outros fatores e interesses históricos, quero apenas estabelecer uma coisa: crer ou não crer… na forma shakespeariana. Além da divisão clássica entre ateus e crentes, temos uma outra que merece nossa especial atenção: espíritas e espiritualistas. O homem sempre arrumou motivos para se separar de um grupo para se agregar em outro e com a fé não foi diferente; aliás, foi determinante para dominar sem armas, ou com elas.

As religiões orientais,  quer seja com o budismo ou o hinduísmo, são respeitadas pelo meio espírita, sem sofrer ataques ou preconceitos. Isto se deve, muito provavelmente pelos aspectos de sua cultura milenar, não pelas raças a que estão atreladas ambas. 

Será que a Umbanda  sofre a descrença de sua tradição oral por que suas fontes foram não apenas escravos, mas homens  e mulheres negros escravizados e também analfabetos?

Por serem negros, um preconceito; por serem escravos, outro preconceito; por serem sem instrução, mais outro. Será por isso? Quando se é um espiritualista se entende a preciosidade de cada religião. Sem barreiras, sem preconceitos. A busca é pelo entendimento que cada uma tem sobre o Bem, como praticá-lo e levar paz aos seres humanos, livrando-os do desespero quer seja pela caridade material ou espiritual. Isto é o que importa.

Sabemos também que a Umbanda essencialmente não é cristã, embora tenha assumido em alguns lugares tal característica e isto não entra neste mérito agora, mas o que separa os espíritas dos espiritualistas? Não é um fato de uma ser cristã e a outra não, assim como nas Cruzadas. 

O Brasil hoje está destinado a ser um país laico, onde ateus nunca serão maioria, tendo a sua maioria católica, a quem os espíritas também não combatem. Os espíritas também não combatem os protestantes, igualmente crentes na ressurreição assim como os católicos.

Mas, por que a tradição oral dos negros escravizados gera tanto separatismo, apesar da Umbanda também crer na reencarnação? Os hindus e budistas também são reencarnacionistas, até uma parte dos judeus também acredita, entretanto somente a Umbanda é rejeitada na sua tradição oral. Seria por sua teologia ou teogonia? Acho que não.

A linguagem simples dos pretos-velhos ou pais-velhos, dos índios e caboclos igualmente ignorados, traduz o ensino da mais difícil Ciência do mundo, o Amor. O amor pode ser Filosofia, mas deveria ser a Religião Universal. É preciso falar para que as pessoas entendam.

Falar de amor não é falar de Teologia, isto é uma Ciência diferente e que separa os crentes. Temos muita ciência e pouco afeto, esquecemos da caridade e preferimos a cátedra. Sem conversões, precisamos de trabalho em favor dos sofridos ainda vivos. Se falarmos de forma inteligível para quem sofre de qualquer dor, de qualquer desespero, estaremos fazendo o que o governador da Terra veio fazer em cada vez que implantou uma religião diferente para tocar os diferentes corações do planeta, que falam diferentes línguas, de diferentes culturas, mas que sabem todos inconscientes o que é o Amor; afinal, todos se amam também entre si, mas precisam amar o que é diferente do seu todo, do semelhante da sua raça.

A tradição oral de todos ensina apenas o Amor. Vamos aceitar o ponto de vista para aprendermos o amor através de uma língua diferente, entendendo o amor como língua universal.

O Sermão da Montanha contém um código escalado de entendimento do Amor, seccionado para facilitar a compreensão dos cristãos. Esse foi o legado oral do Cristo planificado através de sua vida, de seu exemplo, narrado pelos evangelistas. Um código de ética, assim o Cristo nos deixou como deixou também Moisés. 

Que viagem fizemos e ainda não conseguimos entender tamanha separação em terras brasileiras… Não mais Espiritismo na França, não o deixado por Kardec. O Brasil assume o Espiritismo e os espíritas, pelo purismo doutrinário, excluem a Umbanda. Essa Nova Jerusalém disputada é um retrocesso espiritual para o progresso da nação que profeticamente é o coração do mundo, pátria do Evangelho… Ou seria melhor do Amor?!

Pedro Henrique Muniz Fernandes Magalhães – Orador/Doutrinador do GEFA – Grupo Espírita Francisco de Assis – em Groaíras-Ce

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