Os brasilianistas que se previnam: vem ai o pensamento vivo do Ministro Barroso

Com a financeirização dos anos 90 em diante, muda o padrão de referência. Passam a ser profissionais bem remunerados, com seu salário de juizes e procuradores ou, no caso de Barroso, acumulando ganhos de procurador com escritório privado de advocacia.

Ouço agora que o Ministro Luis Roberto Barroso vai lançar um livro com três pontos relevantes.

O primeiro ponto é sua explicação sobre o mundo.

O segundo ponto é sua autobiografia.

O terceiro ponto é sua interpretação sobre o Brasil e a justificativa de seus votos, à luz das mudanças históricas do Brasil.

No inicio de sua carreira midiática, ele se colocou no mesmo nível de outros juristas que abraçaram a política, Joaquim Nabuco, Rui Barbosa, San Thiago Dantas e… ele, Barroso. Modéstia, é claro! Seu nível é maior do que o grupo mencionado. Está em linha com Gama e Silva, Francisco Campos e Vicente Rao.

Desde então, Barroso desandou a distribuir interpretações históricas, políticas e sociológicas, mostrando  um leitor displicente de orelhas de livros de brasilianistas. Endossou todos os estereótipos preconceituosos sobre os brasileiros, a ideia de que todo brasileiro é malandro, indisciplinado, displicente. E seu conhecimento de sociologia e política fez com que visse uma luz no final do túnel, anunciasse a chegada do novo Iluminismo, e era o trem de carga do bolsonarismo. Com sua leveza característica, nem se importou com o resultado de sua  pregação.

Barroso foi incapaz até do mais elementar dos exercícios teóricos: a observação empírica, pela absoluta incapacidade de desenvolver qualquer empatia com o que vulgarmente chama de povo. Qualquer observador das pessoas diria que os de baixo, que conseguem se incluir, são muito mais exigentes nas questões morais, na observância das leis e das regras, porque são os mais expostos à mão pesada da Justiça.

Os juristas diferenciados saberiam que mudanças tecnológicas exigem novas formas de proteção ao trabalho: Barroso, com sua superficialidade exasperante, ajudou a destruir toda forma de proteção ao trabalho, devolvendo o Brasil ao início da revolução industrial.

No sábado fiz uma entrevista com Alysson Mascaro, professor da faculdade de Direito do Largo São Francisco. Ele trouxe uma interpretação interessante da mudança do perfil dos juristas.

Antes, buscavam a aprovação do seu meio. Primavam pela discrição, por um certo pernosticismo de linguagem e pela busca incessante de conhecimento e da erudição.

Com a financeirização dos anos 90 em diante, muda o padrão de referência. Passam a ser profissionais bem remunerados, com seu salário de juizes e procuradores ou, no caso de Barroso, acumulando ganhos de procurador com escritório privado de advocacia. A partir daí, sua referência passa a ser de classe econômica. Consideram-se membros de classes altas e a referência deixa de ser a corporação, para ser os da mesma classe, de preferência empresários, financistas, grandes escritórios. Seu sonho de consumo passa a ser Miami.

É o caso de Barroso e sua ânsia irresistível pelos holofotes e pela aprovação do empresariado. Não foi por outro motivo em que, ao mesmo tempo em que citava as orelhas de livros de brasilianistas, se pautava pelo pensamento econômico e social do grande pensador Flávio Rocha, das lojas Riachuelo, aquele que trata as ideias com a mesma profundidade com que vende roupas.

A leitura do livro de Barroso será um exercício interessante para analisar a mediocrização do pensamento jurídico do país. Sua única salvação é se recorreu a algum ghost writer.

Luis Nassif

8 Comentários

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  1. Barroso conquistou tudo. Dinheiro, reconhecimento público, mais dinheiro, cargos importantes, muito mais dinheiro. Agora ele que contempla o inevitável, a morte e o esquecimento, o ministro fumetinha quer conquistar a eternidade. Barroso, o grande. O mundo é pequeno para conter o tamanho de sua personalidade. Barroso, o justo. A deusa da justiça fica molhadinha de tesão diante dele. Barroso, imortal. É evidente que ele ganhará uma cadeira na Academia Brasileira de Letras. Julgamento do STF de manhã, chá de fardão à tardinha. E um cigarrinho de maconha para dormir. Esse ministro fumetinha sairá da história para entrar nas páginas da ficção. Barroso é um juiz das Bruzungangas. Se procurar com calma é possível vê-lo vestindo farda de gala da marinha num romance de Machado de Assis, comandando navios que apodreceram no porto depois da Guerra do Paraguai chegar ao fim. Barroso não tem a profundidade de um personagem trágico, nem a graciosidade de um ator cômico. Ele é aquele irmão de Macunaíma que ficou branco e virou candango enamorado de uma puta desdentada numa favela paulista. Essa puta é a justiça brasileira, obviamente. E ela não é uma deusa.

  2. Essa talvez tenha sido a herança mais nefasta da ditadura de 64: mataram no nascedouro duas gerações de líderes do país. Políticos, juízes e juristas, economistas, burocratas de gabarito e técnicos, todos os novos líderes do país, formados essencialmente na herança acumulada de valores e referências culturais foram impedidos de frutificar. Uma das consequências desse lapso de 21 anos no desenvolvimento dos recursos humanos do país, foi essa coleção de medíocres e arrivistas que temos aguentado no Supremo Tribunal Federal, mas não só, também no Congresso, na administração pública, nas universidades…

    1. Concordo, exceto com a causa, esse não é um pecado da ditadura militar. Sem entrar na discussão ideológica, que nem há lugar a esse tipo de discussão, na própria ditadura houve pessoas infinitamente mais competentes do que as de hoje. Exemplos ? ACM, Tancredo Neves, Ulisses Guimarães, Leitão de Abreu, Roberto Campos, Simonsen, Paulo Brossard. Tragédia total, até os ditadores se formos comparar com o atual presidente. Esses cito de memória, tem muito mais se garimparmos nomes.

      1. Eduardo, você está certo num ponto, é verdade que todos os nomes que você citou eram maiores do que essa ralé que temos aguentado, mas eram como os solitários combatentes dos torneios de cavalaria da Idade Média, eles faziam o que podiam num ambiente hostil, perigoso, e, o pior, sempre a espera de uma possível cassação, como Geisel fez com Alencar Furtado.
        Para mim, adolescente que entrou na FFLCH-USP em 1978, até mesmo votar em Audálio Dantas e Eduardo Suplicy nas eleições de 78, como eu fiz, já era um ato quase subversivo. Que elite dirigente democrática poderia se desenvolver em tal ambiente?
        A ditadura militar matou ou aleijou duas gerações de líderes.

    1. Luis Roberto Barroso não merece um artigo, um post, ele não é nada, nunca passou de um arrivista de repartição pública, sua alma é a de um valseiro dos salões de baile do Rio de Janeiro do Imperador Pedro II, o “Rio machadiano”. Erra quem repercute suas vazias platitudes, sua mente oca.
      Vem de longe a gama de motivos que nos trouxe até aqui, até a essa turbulência de areia no deserto que estamos vivendo desde 2013, porque os nossos problemas têm raízes muito mais profundas do que esse deslumbrado Barroso pode alcançar ou entender com suas falas floreadas e suas sentenças de ocasião, feitas para ganhar promoção.
      Vamos sair disso, porque a história do Brasil tem sido sempre um vetor para o futuro, por mais paradas angustiantes que tenhamos no caminho. Nós vamos superar esse momento triste e turbulento, e esse sujeito vulgar e profundamente medíocre, Luis Roberto Barroso, vai ocupar na história do nosso país o mesmo lugar dos juízes da Inquisição, das Visitações do Santo Ofício, que muito julgaram e muito condenaram, mas nem sequer seus nomes são lembrados. Eles passaram…
      Luís Roberto Barroso é só uma pena nos ventos que sopram por todo o Brasil.

  3. Há décadas, o inesquecível Millor Fernandes escreveu impagáveis artigos em que analisava a obra literária do José Ribamar, então na presidência da república.

    Com este belo precedente, ficaremos aguardando as belas crônicas do Nassif sobre o livro do Barroso.

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