Os desafios de Dilma, nos novos tempos da política

Do Jornal GGN – O xadrez da política está sumamente interessante.

As respostas iniciais de Dilma Rousseff às manifestações comprovaram que cresce quando sob pressão. Venceu o desafio inicial, de transitar pela esfera pública mostrando compreensão do fenômeno e comportando-se com segurança.

Agiu assim em um momento em que havia quase um sentimento de histeria tomando conta de amplos setores da esquerda, com o que consideravam conspiração internacional querendo lhes tomar a primazia das ruas; e de setores da mídia achando que manipulariam os manifestantes, como fizeram no episódio dos “caras pintadas”.

O fenômeno é muito mais complexo, exigia uma capacidade de análise superior. E Dilma demonstrou ter, recuperou o protagonismo e fez a pauta. Ponto para ela. Mas é apenas o início.

O primeiro tempo

Nos próximos meses, haverá os seguintes processos – comuns após grandes episódios de catarse que derrubam a popularidade dos governantes.

Barato-caro – Um governante é bem ou mal avaliado de acordo com as expectativas que se tem em relação a ele. Quando as expectativas são excessivas, dizem que está caro. A tendência, então, será superdimensionar todos seus defeitos e subdimensionar as virtudes. A queda se inicia no momento em que se bate no teto da precificação.

E não se dá de uma vez. Começa com os círculos formadores de opinião nos diversos segmentos. Quando já tem a massa crítica suficiente, explode de uma vez, impulsionado por qualquer fato externo. É por isso que é comum o fato de, no auge da popularidade, sucessivos governantes tornarem-se condescendentes com as vulnerabilidades que vão se formando no seu entorno. E serem surpreendidos pela queda brusca. Desde o fenômeno Dilson Funaro (pai do Cruzado) esses processos têm se repetido.

Aí o personagem cai, cai e cai até se tornar barato. É o chamado fenômeno do “overshooting”, que exagera os movimentos para baixo ou para cima. No momento em que fica barato, as pessoas começam a refazer seu julgamento. Redescobrem virtudes que tinham sido esquecidas e a valorizar os feitos. E aí, entra-se no segundo fenômeno, o da segunda chance.

Segunda chance – Precisaria pesquisar mais para saber como é o fenômeno da “segunda chance” em outros países. No Brasil, trata-se de componente intrínseco no ânimo da opinião pública brasileira. Até Paulo Maluf teve a segunda chance, quando eleito prefeito de São Paulo. Lula conseguiu em pleno episódio do mensalão. Após a maxidesvalorização de 1999, FHC teria conseguido sua segunda chance, não fosse o desastre do apagão. Então, Dilma terá a sua. Especialmente porque mantém intactas várias virtudes públicas (hoje soterradas pelo “overshooting” das manifestações): é tida como séria, responsável, sinceramente empenhada em melhorar o país.

O segundo tempo

Ingressando no segundo tempo do jogo, haverá um duplo sentimento da opinião pública. Terá condescendência com o inevitável; e será rigorosa com tudo o que soe teimosia.

Tenderá a apoiar Dilma nos grandes embates. Mas será implacável se persistirem alguns dos aspectos criticados da sua personalidade: teimosia, centralização administrativa, espírito autocrático, condescendência com auxiliares medíocres.

Para se fortalecer, paradoxalmente Dilma terá que abrir mão de poder. Não se entenda por tal reduzir seu poder de governar, mas o de intervir no dia-a-dia dos Ministérios. Necessitará de Ministros com luz própria para restabelecer a interlocução com os diversos setores da sociedade. Ministros que recebam as orientações de Dilma, agreguem sugestões e se ponham a campo. Em suma, um exército composto por generais com luz própria obedecendo ao comandante maior.

Terá que trazer empresários de peso, figuras de peso do meio jurídico, interlocutores de peso dos movimentos sociais, articuladores de peso nas relações políticas. Especialmente, economistas de peso na área econômica. E pessoas que saibam dizer não, quando necessário.

Não se pode tergiversar com nenhuma vulnerabilidade, por menor que seja, porque a grande batalha ainda nem começou: a da economia. Nos próximos meses, haverá deterioração ainda maior das contas externas. Dilma terá que enfrentar opções complexas, entre crescimento magro, inflação alta e contas externas em deterioração.

Não haverá opção indolor.

Trata-se de desafio que derruba governantes, mas que poderá consagrar estadistas. O grande mérito de Dilma é governar de olho no futuro; sua grande fraqueza é não olhar o presente. Com a crise, ficará claro que o futuro dependerá, mais do que nunca, de conduzir o país nessa travessia atual.

Luis Nassif

3 Comentários

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  1. Dilma tem que ficar muito

    Dilma tem que ficar muito esperta! Como diria Janio Quadrios forças ocultas conspirão para sua queda. Nós, meros mortais, só poderemos oferecer apoio no caso dela adotar medidas que venha de encontro a transparencia do serviços público e o fim da corrupção em todos os segmentos do Estado.

  2. Os desafios de Dilma

    Gostaria de saber,se você realmente acredita que virá uma reforma que substitua os ministros medíocres,por nomes

    de peso.Enfim,os tais generais colocados na frente de batalha.Isso vai ocorrer mesmo Nassif ?

    Quais sinais a própria Dilma já emitiu neste sentido ?Espera-se que os ministros quinta coluna (Bernardo,Cardoso,

    Helena Chagas),sejam substituidos?

  3. desde de antes da maneira de avaliar a vale que não mando e-mail

    Caro Nassif Gostei dos comentários sobre a situação, e sobre o ônibus chinês. Acho que é hora de ressuscitar o debate sobre este ônibus, afinal ele é mais barato que o metrô em todos os aspectos, até combustível por não ter o efeito pistão, e usar menos iluminação. Hibridos, com a tecnologia brasileira do tróleibus “amchão” de São Paulo, antigo d3 78 a 84, o primeiro do mundo a ter controle por recortador e frenagem regenerativa, seria um sucesso. Há a electrabus em SP que ainda trabalha com ônibus híbridos, mas não sei muito bem a que nível. Divulgar o conceito de bolo menos exigível comprimido de governo para monitorar os políticos seria interessante. Bolo, seria a receita de impostos mais empréstimos, mais receita escondida obtida de concessionários com situação estranha. Exigível é o que deveria ser feito. O exigível comprimido, o que os poderosos convencem a plebe, povão que dá para fazer. Se o povo não souber que a ponte custa x, e o governante disser que custa 2x, e que só tem 2x em caixa o povão leva uma ponte só, e o fornecedor faz a festa. Também são importantes a divulgação dos conceitos de Hurwicz, Nobel de 2007, do “Quem toma conta do guardião”, que fala de equilíbrio de teoria de jogos e controle de desvios de conduta em sistemas sociais. Finalmente a ideia das passagens de Jesus e Pilatos. Quem achava que Pilatos tinha todo o poder do mundo, alguns evangelistas, dizem que ele condenou Jesus porque assim o quis, o simplista como muitos do povão. Mas há quem diga que Pilatos tentou soltá-lo. Provavelmente porque soltando Jesus não soltaria Barrabás, o chefe de uma revolta. O que ele não contava é com dois exércitos na praça, o dos zelotas e o do templo, e falta de chance de agir com o que tinha. É o Kennedy morto por querer sair do Vietname e o Nixon saindo sem o desejar, já que era sócio da General Dynamics que vendia os caças para esta guerra, e saindo porque o povão pressionou.Se eu fosse um governante rezaria por manifestações populares, afinal só com elas teria toda a força necessária para enfrentar os lobbistas na situação atual do Brasil. A pressão sobre qualquer um que comande qualquer coisa é sempre muito grande, e sem uma pressão positiva da sociedade é muito difícil esquivar-se, acho que é por isto que a Dilma parece crescer sobre pressão, afinal ela se liberta da prisão, e vê que sua ação deixa de ser suicídio ou murro em ponta de faca. Mas não é só ela que cresce. Temos que dar a mão a palmatória e reconhecer a luta de qualquer um que baixe a diferença entre o bolo e o exigível comprimido, seja do modo que for ou na situação que for. Aliás se os partidos tivessem direitos ligados ao tamanho da sua militância e tivessem que trazer para dentro de si a força dos movimentos das ruas para sobreviver, o Brasil seria muito melhor. A países com este modelo de partidos na Europa. Use do melhor modo que quiser qualquer ideia. Apenas não demore porque a chance passa, e eu você sabemos muito bem como foi o caso da Vale. O fazer na hora certa, nem antes demais, porque a opinião pública esfria, nem tarde demais, porque as demoras naturais do sistema não permitem que a ação tenha efeito antes que algo ruim ocorra, é extremamente importante.

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