A Neoway, do comercial de Dallagnol, e o comércio nebuloso de bancos de dados do setor público

Em um mundo progressivamente financeirizado, os mercados preferenciais para lavagem de dinheiro são aqueles em que há maior dificuldade em precificar os ativos.

Peça 1 – as faces pouco conhecidas da lavagem de dinheiro

Não se pense que o crime organizado atue apenas através de mercados tradicionais, como o tráfico de drogas e pessoas, mercado de armas. Em um mundo progressivamente financeirizado, os mercados preferenciais para lavagem de dinheiro são aqueles em que há maior dificuldade em precificar os ativos.

Exemplos clássicos são o mercado de arte, de jogadores de futebol, de joias e, principalmente, de tecnologia.

Na área de corrupção política, os ativos preferenciais são os contratos públicos com empresas de tecnologia, até mais do que com empresas de limpeza e terceirização de mão-de-obra. No caso da limpeza, há medidas, como número de funcionários por área coberta. No caso da tecnologia, não, especialmente quando se sabe que, depois do sistema desenvolvido, a ampliação dos serviços tem custo marginal. Justamente por isso, a corrupção preferencial do setor público mais sofisticado, nas últimas décadas, foi com empresas de tecnologia.

Cada parágrafo que começa com BIDGATA contém sugestões de uso das grandes bases de dados pelos Ministérios Públicos que adquiriram o sistema Neoway ou produtos similares.

Peça 2 – o valor das bases de dados

Um dos mercados mais cobiçados – e obscuros – é o da venda de bases de dados públicas. São bases que valem muito dinheiro. Criou-se um mercado de negociação com empresas privadas, abrindo espaço para negócios pouco republicanos uma forma mais sofisticada de lavagem de dinheiro.

Experian-TSE – Em 2013, a então corregedora do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) Nancy Aldrigh, aceitou entregar para a Serasa-Experian a base de dados de 143 milhões de eleitores. Alertada a tempo, a então presidente do TSE, Carmen Lúcia, vetou a entrega, mas só depois de alertada por matérias da imprensa. Não se descarte a possibilidade de completa ignorância da Ministra Aldrigh sobre o valor dessas bases.

Experian-José Serra – No final de sua gestão como governador, José Serra doou para a Serasa-Experian o CADIN (Cadastro dos Inadimplentes), sem nenhuma contrapartida para o estado. Meses depois, a Experian adquiriu de Verônica Serra a empresa de telemarketing Verid. A empresa deveria valer no máximo R$ 15 milhões. Foi comprada por mais de R$ 100 milhões. Como a Experian tem ações na Bolsa de Londres, solicitamos informações sobre o valor pago. E a resposta foi de que era sigiloso. Com a porta aberta por São Paulo, a Serasa-Experian negociou com vários outros estados. Empenhada em politizar a Lava Jato, e como, na época, havia uma blindagem ampla sobre o PSDB, nem Ministério Público Estadual, nem estadual, nem a imprensa se interessaram pela denúncia.

A própria casa de Serra, na praça Panamericana, foi esquentada através de um contrato entre sua filha Verônica com a irmã de Daniel Dantas, em um site em Miami que nunca levantou voo. No início, o tal site conseguiu acesso a todos os extratos do Banco do Brasil.

Bigdata  – levantar todos os estados que forneceram seus CADINs para a Experian e cruzar com doações eleitorais ou movimentações estranhas nas contas de parentes das autoridades.

Peça 3 – o acordo da Neoway com a prefeitura de São Paulo

Segundo informações do próprio Deltan Dallagnol, nas conversas de WhatsApp divulgadas pelo The Intercept, a Neoway conseguiu fechar contratos com inegibilidade com várias Procuradorias da Fazenda e Ministérios Públicos estaduais. No caso da Petrobras, foi denunciado pelo fato de o intermediário da venda ter pago propina.

Bigdata – levantar todas as instituições clientes e o nome e CNPJ dos intermediários que venderam o sistema.

No ano passado, a Neoway – empresa para a qual Deltan Dallagnol se tornou garoto propaganda –  conseguiu acesso à base de dados de todos os funcionários da prefeitura de São Paulo, através de um expediente que é um primor de esperteza: um contrato definindo que, em vez de ser uma doação da Prefeitura da base de dados de seus funcionários, era uma doação da Neoway à Prefeitura, de serviços que poderiam ser feitos em cima da base de dados recebida.

Ela recebeu uma base de dados de valor inestimável. Mas o contrato estipula um valor de R$ 1.155.003,00, referente aos serviços da Neoway “doados” para a prefeitura.

  • O objeto do presente termo consiste na doação sem encargos, pela DOADORA, de estudo na área de recursos humanos, consistente na coleta de informações de servidores da PMSP e cruzamento através das soluções de inteligência e base de dados qualificadas da DOADORA com o objetivo de identificar indícios de fraudes e/ou irregularidades.

A Neoway recebeu a base de dados com CPF e nome completo do servidor, informações cadastrais, informações de rendimento, inclusive gratificações, carga horária, pedidos e tipos de afastamento.

Peça 4 – o uso privado de informações reservadas do setor público

É evidente que é o tipo de informação que colocará qualquer servidor da Prefeitura a mercê de empresas clientes da Neoway. Bastará consultar a Neoway e levantar qualquer falta administrativa do funcionário.

O caso Dolly

Recentemente, os serviços da Neoway na Procuradora Estadual da Fazenda de São Paulo foram fundamentais para um golpe de morte na polêmica fábrica de refrigerantes Dolly. Os cruzamentos de dados da Neoway permitiram entrar no labirinto societário da Dolly e fornecer elementos para o bloqueio de todas suas contas.

O proprietário da empresa acusou a Neoway de trabalhar para a Coca Cola. É possível que tenha chutado. Mesmo assim, revela o risco de se ter uma empresa privada, especializada em bidgatas, e com clientes privados, ter acesso às bases de dados do setor público.

Bigdata – levantar nomes de todos os clientes da Neoway e cruzar com ações de inteligência preparadas por Ministérios Públicos ou Procuradorias da Fazenda clientes da empresa.

Peça 5 – as ligações da empresa com a LIDE

No início da gestão Dória, sugerimos aqui que houvesse uma investigação para analisar as ligações de fornecedores da Prefeitura com eventos bancados pela LIDE.

A Neoway é uma cliente cativa da LIDE.

Seu CEO Jamie de Paula foi  premiado pela LIDE de Santa Catarina em junho de 2017.

https://www.facebook.com/neoway.nw/videos/1578037098908744/

Participou dos eventos da LIDE diretamente de Nova York

https://www.facebook.com/Fernandabornhausensa/videos/10155031687226225/

Foi uma das apoiadoras do 5º Fórum Nacional do Varejo, Consumo e Shopping Centers, promovido pela LIDE em 2017

Antes disso, ajudou a LIDE a lançar LIDE Futuro Santa Catarina.

O vice-presidente da Neoway, Pedro de Paula, assumiu o cargo de diretor da LIDE Jovem SC.

No dia 30 de abril de 2019, foi o palestrante do primeiro almoço debate da LIDE Santa Catarina

Esta semana, Jaime de Paula foi afastado do comando da Neoway e anuncia-se que está saindo do Brasil com a família.

Termo de Doacao 6-SMG-2018 – NEOWAY

 

 

Luis Nassif

10 Comentários

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  1. INTUIÇÃO DO ROUBO
    O mercado da tecnologia também se vê livre para a prática de abusos nas relações de consumo. As duas únicas prestações oferecidas ao público consumidor – ligações e acesso a internet – são subdivididos em inúmeros outros serviços, precificados em diversas formas desconhecidas até mesmo pelos mais atentos usuários. Esse mercado movimenta bilhões de reais em cifras pulverizadas pelas diversas nomenclaturas de dois únicos serviços.
    Inadmissível exigir do consumidor saber as variações de preço dos minutos de ligações a depender do dia, hora, local, operadora e modalidade fixa ou móvel. Inadmissível exigir do consumidor ciência sobre o consumo de pacote de dados de certa página virtual, aplicativo, dowload, upload a ser realizado em certo local, hora, e dia.
    Entretanto, quatro ou cinco empresas dominam o mercado nacional, com destaque para duas empresas, e delas pouco se exige, pouco se fala, pouco se fiscaliza, pouco se investiga.
    Você que me lê, a título de exemplo, sabe se 25 centavos foram realmente inseridos em sua conta em razão do uso de determinado serviço? Levando em consideração o numero de pessoas conectadas a internet (120 milhões – IBGE 2018), os 25 centavos se transformariam em 360 milhões de reais ano.
    Algo me diz que não são só 25 centavos. Mas aí é só uma intuição minha, nada além de intuição.

  2. O dono da Dolly tinha um programa de tv no qual denunciava que o principal ingrediente do concorrente era desconhecido e as autoridades nunca se se esforçaram em fiscalizar, o que colocaria a saúde pública em risco……

    Depois disso sempre foi perseguido…….não acredito que cometa mais erros do que outros empresários……..

  3. Nassif, parece ter havido um equívoco no texto, onde trata do item 5.5: a PARTE RECEPTORA é a Neoway, e a PARTE REVELADORA é a Prefeitura (veja p. 12 do documento). Ou seja: se a Prefeitura pedir, a Neoway deve destruir todos os dados que recebeu.

    Afora isso: a Prefeitura não teria que ter autorização expressa dos servidores para entregar os seus dados funcionais para um terceiro fazer análises?

  4. Gleim Gle Eim Valdi dando aulas de jornalismo primario, basico, elementar, a 6 jornalistas do Roda Viva eu ate entendo…

    Luis Nassif dando aulas de investigacao e pesquisa a centenas de delegados de merda e “procuradores” de merda… Eu entendo MAIS ainda…

    O BRASIL EH DEMAIS ATE PRA MIM!!! Nao, espere… O BRASIL EH DEMENOS ATE PRA M…

    Me cafundi. Sorry. Jamais pensei que o Brasil pudesse chegar a esse nivel de burrice. Por mais pragas e obscenidades que saiam da minha boca –e nao sao poucs nem ruins– eu sempre fui comentarista essencialmente TECNICO.

    Jamais me ocorreu lidar com tanta burrice autista assim… a nivel continental!!!!!

  5. Pontapé inicial quem deu foram os bancos, com a compra das folhas de pagamento das estatais no governo de FHC…
    em troca, apenas um alívio passageiro no arrocho salarial pelo acesso direto ao crédito ou à mais dívidas, com tudo atrelado à uma pequena ajuda, uma merreca, esmola, para pagar o plano de saúde, por exemplo

  6. Imaginem o que ocorrerá quando da privatização de SERPRO e DATAPREV . As informações fiscais de pessoas físicas e jurídicas , os dados da administração públicas de pessoal e financeiro(SIAFI e SIAPE) , os dados do comércio exterior (SICOMEX , PORTO SEM PAPEL ) , os dados dos processos da PGFN , os dados do sistema de passaporte , os dados dos sistemas do DENATRAM (RENACH e RENAVAM ) , os dados da Previdência Social ( folha de pagamentos dos aposentandos e benefícios) , os dados dos trabalhadores (CAGED) . Dados importantes da segurança nacional sem a tutela do estado .

    1. disse tudo…
      neste então teremos um escritório da CIA em cada cidade do Brasil

      acredito que bem mais cedo do que muitos imaginam, porque a família que governa o país já deve estar providenciando

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