Powerpoint: Dallagnol “extrapolou” contra Lula, mas não vai ser demitido, decide CNMP

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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Autor do voto vencedor reconhece que Lula foi tratado na mídia como culpado antes de seu julgamento, mas sequer cogitou a demissão dos procuradores por causa disso

Jornal GGN – Após protelar o julgamento por quatro anos, o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) se reuniu nesta terça-feira (25) para discutir o pedido de providências que a defesa de Lula apresentou contra Deltan Dallagnol e seus colegas de força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, ainda em setembro de 2016.

Os advogados reclamaram que os procuradores “enxovalharam a honra” de Lula e anteciparam juízo de culpa, violando seu direito constitucional à presunção de inocência, quando convocaram a imprensa nacional e internacional para divulgar a petição inicial (acusação) do caso triplex. Na ocasião, usaram uma apresentação em Powerpoint atribuindo a Lula a chefia de uma organização criminosa – uma acusação fora de sua competência e jamais comprovada na Justiça.

O relator do caso, conselheiro Marcelo Weitzel, sinalizou discordância em relação à postura da Lava Jato, mas decidiu poupá-la de críticas mais duras durante o julgamento. Ele disse que quando recebeu o processo do primeiro relator, em janeiro de 2018, as penas moderadas já estavam todas prescritas. Weitzel encaminhou voto pela integral rejeição dos pedidos de Lula.

Aberto o debate entre conselheiros, a maioria reconheceu que os procuradores “extrapolaram” na forma como trataram Lula na imprensa.

Sebastião Caixeta [em destaque na foto acima] puxou o voto divergente, avaliando que a conduta da força-tarefa “maculou” a imagem do Ministério Público Federal. “Pareceu que a apresentação [em Powerpoint] vinha com o propósito de fazer o chamado julgamento pela mídia“, admitiu.

Segundo ele, os procuradores externaram na entrevista coletiva a convicção de que Lula era culpado por “fatos que estavam em investigação”. A divulgação foi marcada pela “ausência de zelo” em esclarecer que as acusações ainda seriam processadas. Passaram da “transmissão da informação”, um direito e dever do MPF, ao “juízo de valor”, “influenciando a opinião pública” contra o réu.

“Apesar de não ser possível o provimento quanto a qualquer tipo de censura aos membros do Ministério Público, há indícios de autoria e materialidade de infração disciplinar”, avaliou Caixeta. Para ele, o ideal seria a abertura de um PAD (processo administrativo disciplinar) contra Dallagnol e demais envolvidos. Mas a proposta logo foi abandonada.

“A CULPA É DO PRÓPRIO CNMP”

A questão da prescrição das penas “fulminou” a instauração do PAD. Depois de quatro anos de lentidão no CNMP, a única pena que ainda não prescreveu neste processo seria a exoneração dos procuradores. Mas os conselheiros não consideraram “cabível”. Caixeta disse: “Não cogitei jamais em meu voto a situação de demissão.”

Diante da “aparente prescrição das penas mais brandas”, abriu-se uma discussão sobre a efetividade de abrir um processo administrativo, como sugeriu Caixeta, se a pena que restou – a demissão – era vista pela maioria como dura demais. Além disso, ela também prescreve daqui a 20 dias.

O conselheiro Luiz Fernando Bandeira de Mello Filho foi quem fez um mea culpa institucional com contundência. “Não acho que o CNMP se afirma ao deixar de decidir porque um caso prescreveu por sua própria culpa“, disse. “É a primeira vez que esse caso vem ao plenário do CNMP. Nós vamos ficar discutindo a prescrição ou vamos discutir de fato o que está por trás desse processo, as tintas que foram carregadas?”

Ele defendeu que a prescrição fosse discutida no âmbito do PAD, convergindo com a defesa de Lula.

Já o conselheiro Silvio Roberto saiu em defesa da Lava Jato em todas as suas manifestações. Quando o debate estava caminhando para a abertura do PAD, foi ele quem puxou o freio de mão e pautou a questão da prescrição.

“O que não está prescrito é a pena de demissão. Prescreve em 14 de setembro. Vamos ao PAD para apurar uma conduta que geraria demissão por causa de uma apresentação [em Powerpoint]?”, questionou aos colegas, em tom de descrença. “É preciso que seja muito bem colocado que o que se pretende com abertura de PAD é a demissão.”

“Uma conduta que já prescreveu não enseja abertura de PAD”, emendou Caixeta, recuando de sua proposta inicial.

PRESTIGIANDO A IMPUNIDADE

O advogado Cristiano Zanin sustentou que não promover a abertura do PAD, conforme aventado por Caixeta, seria “utilizar a prescrição para impedir a ocorrência de uma investigação”.

“Se houver a prescrição, ela deve ser reconhecida no processo adequado. Reconhecer a prescrição por antecipação, para não investigar, com o devido respeito ao Conselho, seria prestigiar a impunidade.”

Após quatro anos de imbróglio, a maioria do CNMP decidiu jogar panos quentes na história.

O corregedor do CNMP Rinaldo Reis, que presidia a sessão, proclamou o resultado: por maioria, o Conselho determina o arquivamento do pedido de Lula “pelo reconhecimento da prescrição”, embora “reconheça que seria procedente o pedido de instauração de processo administrativo disciplinar, nos termos do voto divergente do conselheiro Sebastião Caixeta”.

Também por maioria, o CNMP determinou que os membros da Lava Jato se abstenham de usar a estrutura do MPF “para fins de divulgação de atividades políticas ou político-partidárias.”

Os conselheiros lamentaram que a demora no processamento tenha gerado a prescrição.

Em coletiva de imprensa com veículos da grande mídia, Zanin afirmou que aguardará a publicação do acórdão para verificar se entrará com recurso (embargos de declaração) ao próprio CNMP.

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O vídeo do julgamento:

 

 

Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

11 Comentários

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  1. Como viver em um País desse?
    Ou você sai dessa MERDA ou se revolta e sai matando um a um toda essa casta podre.
    O judiciário e podre da nuca ao rabo,é purulento,gosmento,fedorento,pestilento e contagioso.
    Não da mais pra colocar os pés no Brasil ou ficamos ou derrubamos essas instituições BANDIDAS que servem ao crime,que trai a Pátria,a vendem como cafetões vendem suas prostitutas.

  2. Numa escabrosa coletiva de TV o imberbe Deltan Dellagnol decapitou o direito de Lula de não ser humilhado. Hoje o CNMP apenas assinou o atestado de óbito da presunção de inocência antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória. Se degolar o próprio réu Deltan ficará impune?

  3. Trata-se de um julgamento pelo CNMP com resultado manipulado e antecipadamente pretendido. A questão que se coloca não está centrada na prescrição, mas, porque prescreveu. Por que? Porque, deliberadamente, durante quatros longos anos se protelou a sessão plenária até que a prescrição surgisse. E, somente não prescreveu automaticamente sem julgamento, por ter o ministro Fachin determinado que o caso fosse analisado pelo plenário do CNMP. Mas, também, não é crível o ministro não ter previsto qual seria o desfecho. É uma dança de iniquidades em torno de algo além do corporativismo. É apenas mais comprovação do viés assumido, tanto pelo MPF quanto pelo Poder Judiciário, quando se trata da Lava Jato.
    E, como de hábito, não se esqueceu de atribuir a falha ao reclamante dada a afirmação de que houve dois arquivamentos anteriores contra os quais este não apresentou recurso. Ora, se agora depois da Vaza Jato e dos sucessivos fatos incontestes que vieram a público ainda se observa a força do referido viés, é risível o argumento.
    Noves fora, a defesa do Presidente Lula obteve um ponto a favor. Pequeno, mas importante. O acórdão reconheceu haver mérito no pedido de abertura de processo administrativo disciplinar. Isto representa mais um elemento que vai compor o quadro de evidências que dá conta do tratamento impróprio, da deliberada manipulação da opinião pública e da deturpação dos fatos em prejuízo da defesa.
    Dia-a-dia a situação da Lava Jato fica mais precarizada.

  4. A LÓGICA DA ESCRAVIDÃO VOLTOU AO BRASIL,Lula é o escravo negro/branco do Judiciário,pode chicoteá-lo,açoitá-lo,um CIDADÃO SEM DIREITOS,o seu caso com certeza tem haver com a lógica da escravidão,voltamos no tempo.
    Obs;O BRASIL EM GERAL VOLTOU AO SÉCULO PASSADO DA ESCRAVIDÃO,LULA E OS TRABALHADORES SEM DIREITOS,TUDO HAVER,TODO O SISTEMA ESTÁ CONTRA LULA E OS TRABALHADORES(tirando seus direitos)QUEM FAZ ISSO SÃO OS MESMOS Q SUSTENTAVAM ESTE SISTEMA ARCAICO PRECONCEITUOSO,DESUMANO E CRUEL!
    Obs2:Há uma interligação com o Corona no mundo,mas deixa pra lá por enquanto,isto é mais algo geral/mundo !!
    Ass:José Marcelo-candidato a intelectual,historiador,sociólogo ou sei lá mais o quê !!

  5. O Ex-Procurador do MPF Carlos Fernando Santos Lima, à época atuando na Vaza-Jato, afirmou em uma entrevista:

    “Estadão: A Lava Jato caminha para reproduzir as Mãos Limpas, em relação ao seu final – na Itália, o combate à corrupção na década de 1990 teve seus resultados remediados por uma dura reação do sistema político e pela queda de apoio público?

    Carlos Fernando: O caminho é outro, por conhecermos a experiência das Mãos Limpas, quais são as armadilhas que são colocadas no caminho de uma grande investigação. Percebemos e reagimos sempre. Toda vez que (políticos) tentaram uma modificação igual como foi a (lei) salva ladre (que concedia anistia aos presos), na Itália, fomos abertamente à imprensa e falamos: olha população, está acontecendo isso. Porque o político só entende a pressão da população”.

    O que o $érgio Moro acha do uso da imprensa para acuar os acusados?

    “Os responsáveis pela operação Mani Pulite [mãos limpas, em italiano] fizeram largo uso da imprensa. Com efeito: para o desgosto dos líderes do PSI [um dos partidos investigados, que acabou extinto], que, por certo, nunca pararam de manipular a imprensa, a investigação da ‘mani pulite’ vazava como uma peneira”, escreveu Moro em um artigo de 2004, dez anos antes de dar início a operação que o tornou conhecido nacionalmente. Ele fez um copia/cola das estratégias do procurador italiano Antonio Di Pietro.

    “Tão logo alguém era preso, detalhes de sua confissão eram veiculados no L’Expresso, no La Republica e em outros jornais e revistas simpatizantes. Apesar de não existir nenhuma sugestão de que algum dos procuradores mais envolvidos com a investigação teria deliberadamente alimentado a imprensa com informações, os vazamentos serviram a um propósito útil. O constante fluxo de revelações manteve o interesse do público elevado e os líderes partidários na defensiva”, continuou o juiz, já dando pistas de como achava que uma operação desse tipo deveria ser tratada.

    A Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) enviou um parecer ao Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) afirmando que procuradores não devem ser obrigados a falar apenas nos autos e que calar Carlos Fernando dos Santos Lima, membro da Lava Jato em Curitiba, “é impor mordaça a todos os membros do Ministério Público brasileiro”.

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