Proposta de Moro sobre cigarro é ingênua e só favorece a indústria do tabaco

Ex-ministro da Saúde e o presidente da federação dos fiscais tributários avaliam que redução de impostos não serve para combater o contrabando e vai levar a aumento no consumo

Por Rodrigo Gomes

Da Rede Brasil Atual

A proposta do ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, de criar um grupo de trabalho para avaliar a redução de impostos sobre cigarros para combater o contrabando desse produto foi recebida com severas críticas por especialistas em tributação e saúde pública. “Chega a ser ingênuo acreditar que vai combater o contrabando de cigarro ou qualquer outro produto no Brasil abaixando o imposto sobre o produto original. O contrabando simplesmente vai se adequar a esse novo preço”, explicou o presidente da Federação Nacional do Fisco Estadual e Distrital (Fenafisco), Charles Alcantara.

Para ele, não vai haver melhora na perda de arrecadação decorrente do cigarro contrabandeado, hoje estimada em R$ 10 bilhões ao ano. E a ação só vai beneficiar a indústria do cigarro. “É uma medida extraordinária para a indústria do tabaco, mas prejudicial à saúde e à economia do país. Tem que ter mais fiscalização da receita e mais ação de repressão da Polícia Federal para combater o contrabando. Mas a fiscalização não tem recebido investimento nos últimos anos”, ressaltou.

O presidente do Fenafisco também considera preocupante que uma proposta desse tipo venha do Ministério da Justiça e não de um estudo da Receita Federal. E avalia que a proposta “joga por terra o princípio da seletividade tributária”. “A taxação deve ser maior sobre produtos menos essenciais. O princípio da seletividade é que quanto mais essencial é um produto, menor são os impostos. Então, sobre o cigarro, que além de não ser essencial é prejudicial para a saúde, a taxação é a maior possível”, explicou. Hoje incide sobre o preço do cigarro uma tributação de aproximadamente 30% de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).

Alcantara avalia que o esquema de contrabando simplesmente vai se adequar à situação, podendo reduzir sua margem de lucro, mas não vai deixar de existir. “Todas as etapas do processo produtivo e circulação do contrabando são mais baratas que as do mercado oficial. Justamente por estar à margem da legalidade. O que vai ocorrer é que o cigarro vai ficar mais acessível às pessoas de baixa renda. A tendência é que elas adquiram mais, pois se o preço do cigarro brasileiro cair, o do contrabandeado também vai. E isso vai aumentar os custos do Estado com a saúde pública”, afirmou.

Em entrevista à Rádio Brasil Atual, o deputado federal e ex-ministro da Saúde Alexandre Padilha (PT-SP) considerou chocante a proposta de Moro e avalia que ela vai na contramão de todos os avanços que o Brasil realizou nos últimos anos para reduzir o consumo de cigarros. “Em 2011 tivemos um embate com a indústria de tabaco ao aumentar os tributos do cigarro e o preço mínimo. Não se pode vender cigarro abaixo de determinado preço – atualmente R$ 5, um dos mais baixos no mundo –, exatamente para tentar combater o contrabando. Isso contribuiu para uma redução do consumo cigarros de 15% da população, em 2011, para 10% em 2016.”

Padilha também ressaltou que não há nenhuma experiência assim em nenhum país do mundo. “Pelo contrário. A recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS) é de aumentar impostos porque isso impacta no consumo. Essa ideia remonta a um discurso antigo da indústria do tabaco, tentando construir uma ideia de que se baixar o imposto do cigarro, vai baixar o preço do cigarro e com isso teria redução do contrabando. Primeiro que essa proposta não pensa na saúde. Por que se baixar o preço vai aumentar o consumo”, afirmou.

O ex-ministro lembrou que o Brasil tem desenvolvido políticas de combate ao fumo reconhecidas pela OMS e que o percentual de fumantes dentre a população chegou a ser de 30% no início dos anos 1990. A OMS estima que 300 mil pessoas morram por ano no Brasil em consequência do fumo. “Essa medida é um estímulo ao consumo do cigarro à população de baixa renda e os mais jovens”, completou.

Redação

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  1. “Corrida pra vender cigarro
    Cigarro pra vender remédio
    Remédio pra curar a tosse
    Tossir, cuspir, jogar pra fora
    Corrida pra vender os carros
    Pneu, cerveja e gasolina
    Cabeça pra usar boné
    E professar a fé de quem patrocina

    Eles querem te vender, eles querem te comprar
    Querem te matar, de rir … querem te fazer chorar
    Quem são eles?
    Quem eles pensam que são?
    Quem são eles?
    Quem eles pensam que são?”

    Engenheiros do Hawaii – 3ª do Plural.

  2. Vaidade das Vaidades

    (Dedicado ao juiz Sérgio Moro)

    O Pavão foi escolhido magistrado por causa da ostentação de sua cauda, que todos consideravam muito semelhante a uma toga.
    Uma vez no cargo e cheio de si, passou a condenar a torto e a direito, para ganhar fama de implacável. Preferia de início encarcerar os animais mais humildes e esfomeados – lobos, hienas, ratos infecciosos -, mas depois, cada vez mais vaidoso, pôs-se a perseguir até os animais da nobreza. Com isso, sua cauda ia ficando cada vez maior, mais colorida, mais espalhafatosa.
    Vieram então uns caçadores e cercaram a comarca do Pavão.
    – Esses bichos aí são muito feios e sujos – disseram entre si. – Vamos levar apenas aquele da cauda flamejante.
    Levaram-no e trancafiaram-no num zoológico, onde permaneceu pelo resto da vida.

  3. Corrente do atraso. Vai contra medidas inúmeras no Brasil e no mundo, ainda mais depois que ficou constatado que o que se arrecada, ainda com alíquotas elevadas sobre o cigarro não basta para tratar a maioria das doenças graves, incapacitantes e muitas sem cura que o uso do tabaco traz. Acredita-se que é quase tres vezes maior o gasto com relação a arrecadação. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), em 2013, o tabagismo passivo foi a terceira maior causa de morte evitável no mundo, perdendo apenas para o tabagismo ativo e para o consumo excessivo de álcool. No Brasil, os adultos fumantes correspondem a 10,2% da população.
    A senadora Simone Tebet (MDB-MS) afirmou a Moro que a queda no preço dos cigarros fabricados no Brasil seria o que chamou de “lobby ilegítimo”.

    Ilustrando o quanto o atual ministro está querendo o atraso, eis algumas medidas atuais:
    – é divulgado que a Disney que há tempos proibiu que personagens em seus filmes fumassem, agora vai proibir o uso do cigarro em seus parques.
    – vereadora de Osasco/SP tem projeto para proibir o uso de cigarro em parques e praças do município.
    – em Tóquio, desde 2002 é proibido fumar nas ruas
    – há um projeto do senador Humberto Costa, de 2015 que altera lei de 1996, para entre outras coisas proibir o fumo dentro de veículos particulares, quando houver passageiros menores de 18 anos (baseado na questão do fumo passivo).

  4. Ingênua porque, porque você não sabe quanto vai entrar na conta do agente dos gringos!
    Na pec das armas antes de sair a lei ele já estava fazendo lob na Tauros!

  5. O “erro” de Ernesto Araújo, a “ingenuidade” de Sergio Moro… dar o devido nome aos bois dá processo hoje em dia?

    Não por nada, quem-sou-eu, deixa-disso, mas… sugiro uma abordagem um pouco diferente. Que tal ao menos – sem fugir da busca de neutralidade – aproximar da realidade tais chamadas? Que tal “a distorção de Ernesto Araújo”, o “descabimento da proposta de Sergio Moro”… não ofende o demente, digo, o autor de tais pérolas, ao mesmo tempo em que respeita o leitor.

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