Rebelo retira autorização de estados para mudar APP

Na proposta de mudança do Código Florestal Brasileiro (Lei 4.771/65), apresentada hoje (05) à comissão especial que estuda o PL, o relator do projeto Aldo Rebelo (PCdoB) propôs a redução das áreas de preservação permanente de 30 para 15 metros, para o caso de rios de 5 a 10 metros de largura – no texto apresentado na última sessão (29) a faixa mínima sugerida era de 7,5 metros.

O deputado também retirou a autorização para os estados reduzirem em 50% a vegetação das áreas de preservação permanente (APP). Estima-se que 20% do território brasileiro é APP.

A análise do texto de Aldo Rebelo continuará nesta terça-feira (6 de junho). Os reformistas esperam que a aprovação da proposta termine no mesmo dia, mas os ambientalistas querem levar a discussão até depois das eleições.

O deputado Moreira Mendes (PPS-RO), defensor das mudanças propostas para o CF, apresentou dados da Embrapa Monitoramentos, ressaltando que se a lei federal fosse cumprida integralmente, e somando as Unidades de Conservação já estabelecidas em todo país e terras indígenas, as áreas preservadas cobririam 71% do território brasileiro, restando apenas 29% para todas as atividades do país – áreas urbanas e produção agropecuária. Hoje, com toda a produção de alimentos, e somando as áreas urbanas, o país mantém 53% da área de cobertura florestal nativa.

Sarney Filho (PV-MA) rebateu ao afirmar que nos últimos anos a produção agrária cresceu e o desmatamento foi reduzido não sendo necessário um novo código para auxiliar os produtores – nos últimos 40 anos a produção de grãos no país aumentou em 624%, e a área de produção agrícola, no mesmo período, 145%.

A Esalq-USP (Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”) tem se posicionado contra as mudanças do Código Florestal proposta pelo deputado. O professor Paulo Kageyama, que representou a instituição em duas das 33 audiências públicas realizadas para discutir a reforma do CF, afirma que os dispositivos da lei federal são embasados cientificamente e que é possível a pequenos produtores seguirem o atual Código Florestal sem irem à falência.

Entretanto, existem culturas que, por suas características, se desenvolvem melhor nas áreas de encostas e úmidas, a exemplo da banana, arroz, café e uva. Essas zonas (localizadas em topos de montanhas e próximas aos corpos hídricos) são definidas pela Lei 4.771/65 como áreas de preservação permanente (APP). Logo, não devem sofrer qualquer alteração, pois, além de serem frágeis (caso das encostas), contribuem para conservação da biodiversidade e manutenção dos recursos hídricos.

A consultora e engenheira florestal, Maria José Zakia, reconhece que áreas frágeis têm vocação para cultivo agrícola e são importantes, sobretudo, para os pequenos proprietários, que têm menos acesso às tecnologias e terras. Zakia é autora de estudo que verificou os impactos da preservação de matas ciliares pelas medidas mínimas estabelecidas no atual CF em corpos hídricos, ou seja, de 30 metros em cada lado de rios com até dez metros de largura.

Zakia conclui que o limite estabelecido de 30 metros “é satisfatório”, mas ressalta: “isso não quer dizer que para alguns tipos de propriedades não se possa ter o uso controlado dessas áreas [de preservação permanente]”. A pesquisadora explica que os rios não guardam uma relação assimétrica entre si. Isso quer dizer que cada propriedade deve ser estudada. A cientista também defende a diferenciação da lei para pequenos, médios e grandes proprietários.

Estima-se que 90% dos produtores brasileiros transgridem de alguma forma a Lei 4.771/65, o que significa 5 milhões de pessoas. A justificativa dos reformistas é que o cumprimento de todas as diretrizes da lei federal torna a produção agropecuária insustentável. O deputado Moreira Mendes (PPS-RO), destacou, durante reunião da comissão especial, que das 10 mil propriedades agrícolas do estado de Rondonia, 90 mil são pequenas propriedades, e todas estariam na ilegalidade por conta da legislação atual.

A lei estabelece que todas as propriedades, independentes do seu porte, respeitem as reservas legais (RL), ou seja, que proprietários em áreas de Mata Atlântica mantenham 20% da cobertura vegetal original – se estiverem desmatadas, o dono do terreno terá que replantar os 20%. Proprietários no Cerrado devem proteger 35% do bioma, e na Amazônia, o índice mínimo de preservação é de 80%. RL são distintas de APP, logo, se o agricultor tiver em seu terreno áreas de encostas ou recursos hídricos, também deverá excluí-las do seu sistema de produção.

Kageyama trabalha há 15 anos em programas de recuperação de áreas de pastagem degradadas na região do Pontal do Paranapanema, interior de São Paulo, junto a associações de assentados de reforma agrária. As pesquisas foram feitas com base nos chamados Sistemas Agrosilvoflorestais, onde a produção agrícola e criação de gado são conjuntas a atividades de reflorestamento de espécies típicas da região e importantes para a manutenção da biodiversidade.

No caso de Paranapanema, os pesquisadores escolheram a macaúba como espécie-chefe dos sistemas agrícolas por conta da sua importância econômica na produção de biocombustíveis. O fruto desse tipo de palmeira produz até dez vezes mais óleo do que a soja por hectare, e, por ser natural da região do oeste paulista, pode ser utilizado na recomposição de reservas legais nas propriedades.

Kageyama explica que os assentamentos rurais diversificaram a cultura com cerca de 20 espécies de plantas, incluindo macaúba, e variedades recorrentes na mesa do brasileiro (feijão, arroz, milho), e frutíferas.  

A produtividade do óleo de macaúba é de 5 toneladas por ano/hectare, e o trabalho está sendo desenvolvido com 6 mil famílias. Kageyama estima que, levando em consideração que cada grupo familiar tem em média 20 hectares para produzir, e utilizando 5 hectares de cada pequena propriedade, é possível chegar a produção de 150 mil toneladas de óleo de macaúba por hectare/ano. “Mesmo se a produção for menor, ou seja, em apenas 10% desse território, ou 15 mil toneladas de óleo por hectare/ano, já seria o suficiente para atender uma indústria que queira se estabelecer no local”, calcula.

A Esalq recomenda que os próprios assentados estabeleçam futuramente uma pequena indústria de esmagamento das sementes de macaúba. Para Kageyama as pesquisas em campo comprovam que é possível produzir espécies nativas, recompondo RL, com ganhos econômicos. No caso da macaúba, como a produtividade de óleo por hectare é satisfatória, os assentados teriam condições de manter as APP, RL, e, ainda assim, obterem retorno financeiro por meio do sistema agrosilvofloretal.

Luis Nassif

0 Comentário

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador