Redução de danos no combate às drogas

Pesquisadora defende uso seguro de drogas

Por Lilian Milena, do brasilianas.org

Dificilmente encontraremos alguém que nunca passou por problemas relacionados ao consumo de drogas, dentro ou fora da família. Todos conhecem histórias ou, pelo menos, já tiveram momentos desagradáveis envolvendo o uso de substâncias entorpecentes, que produzem alterações nos sentidos, sejam elas leves ou pesadas.

“O uso prejudicial não depende apenas da quantidade, mas da qualidade da relação estabelecida com a droga”, explica a mestre em saúde pública e educação pela FGV e pesquisadora no Laboratório de Políticas Públicas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Gilberta Acserald.

Em entrevista, realizada por e-mail ao Brasilianas.org, a professora diz que as políticas de repressão ao uso de algumas dessas substâncias é ineficaz, considerando que a proibição jamais conseguirá impedir alguém de causar danos a si próprio, “no limite, o suicídio teria que ser proibido por lei, o que é impossível”, argumenta.

O tema, delicado, é tratado de forma natural pela pesquisadora ao lembrar que, historicamente, todas as sociedades conviveram com o uso de substâncias entorpecentes. “Na antiguidade romana, por exemplo, beber vinho puro era considerado um ato não cidadão, a norma era beber o vinho misturado à água (…). Crianças não eram autorizadas a beber, mas recomendavam-lhes algumas gotas de ópio, para garantir um bom sono”, contextualiza.

Em momento algum Gilberta se diz favorável ao livre consumo de substâncias pesadas sem controle do Estado, mas analisa que a política repressiva que idealiza uma sociedade sem drogas é inviável e durante os cem últimos anos – período que contabiliza a sua aplicação – além de não atingir seu objetivo, tem se mostrado danosa.

A professora defende a sistematização de programas de redução de danos a todas as drogas – leves ou pesadas – assim como já é feito com as substâncias legalizadas (álcool e tabaco). O principio da ilegalidade prejudica a aplicação de políticas públicas de conscientização e atenção aos usuários de entorpecentes que se tornam viciados, além de alimentar o aliciamento de crianças e adolescentes mais pobres no comércio ilegal de drogas.

“Os programas de redução de danos decorrentes do uso de drogas partem do princípio de que há pessoas que não conseguem, não podem ou não querem deixar de usar drogas e atuam na convicção de que esses usuários podem desenvolver usos seguros. Esses programas, ainda que isolados, tem obtido resultados satisfatórios, ou seja, usos seguros”.

Acompanhe a entrevista. 

O uso de drogas é um fenômeno da modernidade?

Não. Todas as sociedades conheceram o uso de drogas. A história das drogas é tão longa quanto a da humanidade e paralela a esta, sendo próprio de quem tem consciência querer experimentar com a consciência.  Acontece que no passado, normas de convivência buscaram proteger essa experiência. Na antiguidade romana, por exemplo, beber vinho puro era considerado um ato não cidadão, a norma era beber o vinho misturado à água: para uma medida de vinho, duas de água. Não se bebia antes nem durante as refeições; bebia-se apenas depois do jantar. Homens e mulheres bebiam em locais separados. Crianças não eram autorizadas a beber, mas recomendavam-lhes algumas gotas de ópio, para garantir um bom sono. Já mais próximo de nós, no século XIX, a cocaína em pílulas era recomendada para curar a dor de dentes das crianças e a heroína um remédio para curar a tosse. Nos dicionários farmacológicos sugeriam-se algumas marcas respeitadas – Vicário ou Bayer, com a recomendação não aceite imitações. O que diferenciava remédio e veneno era a quantidade da droga. O fenômeno da modernidade é de fato a proibição de substâncias que, no passado, tiveram sua produção, venda e uso permitidos; inclusive seu valor terapêutico era reconhecido. Essa proibição e a política repressiva que passou a prevalecer na busca da idealizada de uma sociedade sem drogas, é recente; tem cerca de cem anos, não conseguiu atingir seu objetivo e tem se mostrado danosa. Se, no passado, normas coletivas de convivência com as drogas garantiam usos seguros, ainda que houvesse aqui e ali excessos, hoje, com a proibição, o descontrole é total.

O que levou as sociedades a demonizar e proibir o uso de substâncias entorpecentes? 

Toda sociedade tem dificuldade em aceitar os problemas causados pelo seu próprio modelo de organização e tende a deslocar a responsabilidade desses desacertos para alguns sujeitos sociais que assumem o lugar de bode expiatório. Em cada momento da história da humanidade, loucos, subversivos e, hoje, usuários de drogas, foram colocados nesse lugar. Com suas percepções diferentes daquelas do mundo estabelecido foram vistos como ameaça e se tornaram objeto de preconceito, discriminação, segregação. Usuários de drogas, principalmente os dependentes, são considerados como sujeitos frágeis, impotentes diante do poder todo poderoso da droga e precisariam ser contidos, afastados do convívio social. Da perseguição às drogas muito rapidamente passou-se à perseguição dos usuários e, em particular, dos usuários pobres, potencializando vulnerabilidades já existentes. A proibição também tem sido um álibi que, de alguma forma, justifica o controle social de grupos sociais que incomodam a tranquilidade da sociedade. Nos termos de Fernando Savater, a demonização das drogas estimula o medo do espírito, dissimula a ancestral inveja do gozo improdutivo e não compartilhado. Possuídos, sob o efeito delas, que forças estranhas seríamos capazes de liberar?

Como analisa o fato dos principais produtores de drogas, como maconha e cocaína, serem de países em desenvolvimento, e os maiores consumidores de países desenvolvidos? Os países consumidores (o consumidor em si) são responsáveis pela criminalidade que permeia o tema?

É difícil avaliar de forma objetiva o que, por ser proibido, não se deixa mostrar. A maconha data de milênios e hoje suas plantações se espalham pelo mundo inteiro, inclusive o plantio domiciliar de difícil identificação. A plantação de coca nos paises andinos tem crescido, segundo registros da literatura, em que pesem as fumigações sistemáticas que não só não tem conseguido erradicar o plantio, como comprometem o meio ambiente, destruindo a plantação alimentar, a flora, a fauna e, do ponto de vista psicológico, afetando o imaginário infantil (desenhos das crianças identificam fumigações à morte). O plantio da coca e seu uso como planta medicinal, objeto ritual e estimulante é tradição desde as sociedades pré-colombianas. A partir de pesquisas européias, em 1865, elucidou-se a fórmula da cocaína. Dez anos mais tarde, seus derivados foram usados como anestésicos, como “forma inofensiva de curar a tristeza”, prescrita na forma de pílulas contra a dor de dentes das crianças. No final do século XIX, seu uso tornou-se popular nos EUA. Hoje, a localização da maior ou menor produção dessas drogas, tornadas ilícitas, é muitas vezes indicada em decorrência das apreensões realizadas pelos órgãos de repressão. Quanto a quem consome mais maconha e cocaína, segundo as pesquisas (dados nacionais de pesquisas do CEBRID, em 2005, dados internacionais referidos pelo CEBRID, em 2005), realmente os maiores consumidores são os paises desenvolvidos. Os EUA e alguns paises da Europa consomem mais maconha que o Brasil que tem um índice de uso na vida (quem usou maconha pelo menos uma vez nos últimos seis meses) igual a 8,6%, ou seja, menor que o verificado nos EUA (40,2%), Reino Unido (30,8%), Dinamarca (24,3%) e Chile (22,4%), ainda que próximo da Grécia (8,9%) e da Polônia (7,7%). Em relação à cocaína, o uso na vida é mais baixo no Brasil (2,9%) do que nos EUA (14,2%), Alemanha (3,2%) e Chile (5,3%).
Responsabilizar o consumidor pela criminalidade relacionada a drogas é uma afirmação do senso comum, bastante banalizada, mas que, de fato, inverte o problema de forma perversa, semeando o medo: a vítima se torna culpada, forma simplista da sociedade se eximir de sua responsabilidade, criando um bode expiatório.

Porque as políticas públicas foram condescendentes com a legalização do álcool e tabaco e não com outras drogas?

Nem sempre as políticas públicas foram condescendentes com essas drogas. Nos EUA, em 1657, rum, uísque, vinho e conhaque foram proibidos, em decorrência de seu forte teor alcoólico. Mais tarde, sob a pressão das Ligas de Temperança, a Lei Seca, aprovada em 1922, baniu com violência a produção, venda e uso de bebidas alcoólicas, com consequências sociais danosas. A proibição impôs ação repressiva violenta, deixou a população em geral e grupos já vulneráveis sem orientação e ajuda, deu margem à organização da criminalidade. Constatado seu fracasso, foi revogada em 1933. No inicio do século passado, na França, o consumo popular do absinto ameaçou o mercado do vinho, tradição no país, levando os vinicultores a demonizar o uso do absinto supostamente associado à violência, fato não comprovado na época, mas que não impediu sua proibição. O uso do tabaco, no passado, já foi punido com pena de morte na Inglaterra, nos paises muçulmanos e na Rússia; mas na França, se tornou fonte de renda e, em 1674, o Estado instaurou o monopólio das vendas. Hoje, as razões de incentivo e mesmo negligência em relação ao álcool e ao tabaco, em parte podem ser explicadas pela forte tradição de uso no ocidente, e também pelos lucros obtidos a partir da industrialização dessas duas drogas.  
    
Como deveria ser a legalização do uso de substâncias psicoativas? O uso de qualquer tipo de entorpecente deve ser descriminalizado, se possível, até mesmo legalizado?

Legalizar significa regulamentar e controlar produção, venda e consumo de todas as drogas, respeitados os direitos dos cidadãos. A legalização é um processo complexo que pressupõe políticas públicas articuladas de justiça, saúde, educação, juventude, família, previdência social, emprego, nacionais e locais, integrando atividades públicas e privadas. O papel do Estado deve ser o de amparar o cidadão na construção do seu projeto de vida. A maioria das pessoas terá contato, algum dia, com alguma substância psicoativa. O que faz com que algumas passem por essa experiência sem maiores consequências e outras se tornem dependentes? O que parece fazer diferença, o que protege da dependência, é o projeto de vida de cada um e as garantias proporcionadas pelo Estado. O tratamento compulsório como o que se impõe recentemente aos dependentes de crack em centros especializados, com vistas a sua cura, poderá ser mais ou menos longo, mas se não for associado a políticas de inclusão mais amplas, de forma a (re)integrar esses usuários ao convívio social, servirá apenas para afastá-los da vista da sociedade. Devolvidos ao lugar de onde foram recolhidos, sem projetos que os fortaleçam, ficarão reféns de sucessivas internações e recaídas.
A legalização das drogas pressupõe substituir a prevenção das drogas (prevenir significa impedir que o próprio uso aconteça o que até agora, mesmo com tanta repressão, não só não se conseguiu, como tem se demonstrado impossível) pela educação. Lembrem-se da historia da Bela Adormecida. Quando nasceu, seus pais não convidaram as bruxas para o seu batizado e elas rogaram uma praga, a menina mais tarde iria se machucar com uma roca e adormeceria para sempre. Os pais acharam que a melhor solução seria a prevenção das rocas, que foram proibidas, banidas do reino. Mas as rocas existem, sobrou uma pelo menos no sótão e a menina ignorante do que seria aquilo, mas com a curiosidade natural que caracteriza a todos nós, mexeu no que não sabia mexer e adormeceu para sempre até que um príncipe a salvou com um beijo. Não teria sido mais seguro para a Bela crescer vendo os adultos mexerem na roca, entender que não era coisa pra criança, que exigia algum conhecimento, discernimento para usar sem se machucar? A educação para autonomia é a pedagogia que aposta na capacidade do sujeito de decidir o que é melhor para si e para a sua comunidade. Afinal, quem pode decidir pelo outro o que ele pode ou não consumir? E se a decisão é pessoal, melhor será ajudar a pensar, a refletir e a decidir de forma a se proteger.
A legalização implica na responsabilidade do Estado em esclarecer sobre os riscos de uso de todas as drogas, com base nos conhecimentos científicos de que já dispomos, recuperar o uso terapêutico de algumas drogas (o que já é uma realidade, por exemplo, em alguns estados dos EUA e no Canadá, aliviando o sofrimento decorrente de algumas patologias), incentivar e ampliar o sistema de apoio às famílias de maneira geral e aos usuários dependentes, em particular, permitindo que muita gente que sofre escondida e envergonhada, hoje, tenha assistência.
Ao Estado caberá controlar a qualidade das drogas, da mesma forma como é sua responsabilidade controlar a produção, venda e consumo das drogas hoje lícitas como álcool, tabaco e remédios. Afinal, não se trata de liberar as drogas hoje tornadas ilícitas a um mercado livre de controles. Também os consumidores deverão estar atentos e zelar pelo respeito aos seus direitos, que nem sempre estarão de acordo com os interesses do mercado. A política recente do tabaco demonstrou que, sem repressão, sem violência, foi possível conseguir o que há anos atrás seria impensável – quem acreditaria que os fumantes aceitariam restrições de local de uso do tabaco? Entretanto, é preciso substituir a pedagogia do terror ilustrada nos maços de cigarro e que não é produtiva já que, quem usa acredita que danos só acontecem aos outros. Avaliar também até que ponto o câncer como decorrência do hábito de fumar não estaria associado à forma de produção atual do cigarro.
Legalizar reduzirá a violência associada às drogas, fruto danoso da sua proibição. Se alguém compra uma bebida alcoólica e não fica satisfeito com a compra que fez, exerce seus direitos, amparado pelo Código de Defesa do Consumidor que o protege; ou seja, há espaço legal de negociação. Em relação às drogas hoje ilícitas, na ilegalidade, só há espaço para violência.
Mas a legalização não virá por decreto e sim num processo de discussão da sociedade sobre normas de convivência, (re)criadas coletivamente. Experiências de programas de redução de danos sinalizam que é possível ir mais além com vistas à legalização. Na década de 90, na cidade de Frankfurt, na Alemanha, a policia local, cansada de reprimir os usuários, solicitou às autoridades uma ação coordenada que então se organizou como um Grupo de Trabalho Intersetorial com o objetivo de definir linhas de conduta, revistas semanalmente, buscando conviver com os usuários, reduzir sua marginalização e os danos inerentes à dependência, com estabilização sanitária e social. Redistribuiu-se o orçamento, privilegiando as ações de educação, tratamento, pesquisa e coordenação da política. Como resultado desse programa, segundo pesquisa da policia local, o número de usuários se manteve constante, aumentou a demanda por orientação e ajuda, não houve a explosão de consumo temida, sendo constatada uma queda significativa de mortes ligadas à dependência. Eis um sinal de que podemos e devemos criar formas solidárias e democráticas de convivência com as drogas. A legalização das drogas será um processo em etapas até a normalidade discriminada. Não poderá acontecer num só país, é claro; por isso será preciso adotar medidas conjuntas. A proibição das drogas, hoje tornadas ilícitas, tem apenas cem anos e, tendo em vista os danos por ela causados, não há dúvida que mais cedo ou mais tarde sua legalização será adotada.

Esse trecho é de um artigo seu: “O uso de drogas generalizou-se, tornou-se prática banalizada. Qualquer um – em quase qualquer espaço, jovens, adultos, idosos, ricos e pobres – pode experimentar, habituar-se, correndo o risco de tornar-se dependente”. Que política/ação pode reverter o uso prejudicial, digamos, de drogas?

O uso de drogas implica em riscos eventuais não obrigatórios. O uso prejudicial é aquele que é nocivo, lesivo, traz danos à pessoa que usa ou a terceiros. A sociedade contemporânea está baseada na realização complexa e plural da liberdade do individuo e a política de drogas não poderá impedir que alguém cause dano a si próprio; no limite, o suicídio teria que ser proibido por lei, o que é impossível. No Brasil, as pesquisas do CEBRID definem vários tipos de uso de drogas, o uso na vida (uma vez nos últimos seis meses), o uso freqüente (seis ou mais vezes no ultimo mês) e uso pesado (mais de vinte vezes no ultimo mês) e verificam a ocorrência de problemas associados a esses usos. O uso prejudicial não depende apenas da quantidade, mas da qualidade da relação estabalecida com a droga. O uso prejudicial associado a danos a terceiros pode e deve ser evitado, controlado. “Se beber, não dirija”, é uma recomendação que tem tido sucesso. Proibir a propaganda de bebidas alcoólicas e de tabaco, proibir a venda de bebidas alcoólicas nas estradas e nos postos de gasolina da cidade, são formas de regulamentar e controlar o uso de drogas. Dessa forma, tenta-se adiar a primeira experiência, busca-se evitar acidentes de transito. Mais uma vez, segundo as pesquisas do CEBRID, o uso prejudicial de drogas não é o mais comum entre os jovens.   

Sabemos que cresce o consumo de drogas entre jovens, assim como de menores com o tráfico de drogas. Que mudanças práticas a legalização (ou descriminalização) do uso de drogas traria à sociedade?

O consumo de drogas entre os jovens cresce no Brasil, mas ainda é muito inferior ao verificado em paises desenvolvidos. Pesquisas no Brasil sobre o consumo de drogas entre estudantes de escolas de 1º e 2º grau (CEBRID 2005) mostram que o álcool e o tabaco continuam sendo as drogas de maior incidência entre os jovens. Mas fala-se da droga como se ela fosse a causa dos males da juventude, quando na realidade se tornou efeito de uma determinada situação social. A proibição e o comércio das drogas ilícitas tem contribuído para o aliciamento de crianças e adolescentes mais ingênuos, na maioria dos casos, pobres, sem uma perspectiva de vida objetiva e que com a ousadia e coragem típica da idade buscam reconhecimento, integração social ainda que de forma negativa. Precisamos de uma pedagogia que respeite e estimule a inteligência dos jovens, muito além da insistência apenas nos males associados às drogas ilícitas, como se fossem inevitáveis. Algumas iniciativas tentam romper com essa prevenção tradicional, como, por exemplo, o manual Drogas, saber mais para se arriscar menos, publicado pelo governo francês, em 2000, com o objetivo de estabelecer um diálogo entre os jovens e os adultos, com informações sobre os produtos, lícitos e ilícitos, histórico de uso no passado, efeitos e riscos, índices de uso e dependência, informações úteis sobre a legislação vigente, tipos de tratamento, endereços de centros de tratamento, formas de agir, reagir, ajudar, ser ajudado. Trata-se de uma publicação que entende que não há sociedade sem drogas, que não existem soluções milagrosas, mas que é possível um diálogo que reduza consumos perigosos e que a função dos adultos é a de orientar e ajudar os jovens na passagem para a vida adulta, sem pretender tomar decisões por eles. Um outro exemplo, a publicação de Balconeando las drogas, no México, em 2010, tem proposta semelhante e coloca uma questão básica – quem pode decidir pelo outro o que deve ou não consumir quando não há danos a terceiros? Com a legalização das drogas, a possibilidade de publicações como essas, hoje exceções, seria ampliada.

A doutora defende que a educação para a autonomia e a possibilidade de conhecer e dispor de informações sempre atualizadas e amplas é o melhor caminho para afastar os jovens das drogas. Gostaria que falasse um pouco disso, e se existem evidências objetivas que isso tenha dado certo.

A educação para a autonomia é um conceito pedagógico que significa possibilitar ao sujeito conhecimentos e informações atualizadas, cientificas, amparadas na cultura, de maneira a favorecer sua reflexão e ação protetora de si e de sua comunidade. A pedagogia proposta por Paulo Freire também tem como base a autonomia, porque para aprender a ler o mundo é preciso ir além do mero acumulo de informações, é preciso refletir e criar seu projeto de vida, construir sua história. Encher a cabeça dos jovens de informações restritas sobre a ação das drogas no sistema nervoso central, aos riscos de uso como se fossem inevitáveis, fazendo-os crer na abstinência é uma ilusão perigosa que só os deixa despreparados para viver. O que é possível e desejável é construir a possibilidade de usos seguros. Os programas de redução de danos decorrentes do uso de drogas partem do principio de que há pessoas que não conseguem, não podem ou não querem deixar de usar drogas e atuam na convicção de que esses usuários podem desenvolver usos seguros. Esses programas, ainda que isolados, têm obtido resultados satisfatórios, ou seja, usos seguros. Com a legalização teremos um quadro jurídico que garantirá sua plena realização como política pública.

Luis Nassif

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