Renegociação das dívidas estaduais e retomada de um projeto para o Brasil, por Marco Aurélio Cabral Pinto

A possibilidade do alongamento de dívidas entre os Estados e a União, no contexto de consolidação de um pacto federativo, pode ser a condição necessária para a retomada dos investimentos públicos no Brasil a partir de 2019

do Brasil Debate

Renegociação das dívidas estaduais e retomada de um projeto para o Brasil

por Marco Aurélio Cabral Pinto

A situação financeira de alguns Estados tem se agravado após a ruptura política observada desde o início de 2015 no Governo Federal. Como consequência do rápido aumento do desemprego e de crescentes dificuldades para empresas não financeiras, a arrecadação caiu em quase todas as unidades da federação (UFs).

Não por coincidência, desde o início de 2015 o Governo Federal foi dominado pelo objetivo público de geração de superávit fiscal. Na medida em que a crise evoluiu, contudo, alguns Estados não reuniram condições para contenção de despesas. Conforme se pode perceber na Figura 1, Espírito Santo, Minas Gerais, Rio de Janeiro (ERJ), Santa Catarina. Rio Grande do Sul e São Paulo apresentaram piora durante o período de “ajustes” (2015-2018?). Dentre esses, São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul ultrapassaram o “limite” imposto aos entes subnacionais na relação entre dívida e receitas.

Figura 1: Situação fiscal dos Estados

Fonte: Tesouro Nacional, elaboração própria

No caso específico do ERJ, a piora se deveu a superposição de efeitos negativos, somando-se crise interna a intensa desvalorização nos preços internacionais de petróleo entre 2014 e 2016. O Tesouro do ERJ, juntamente com Espírito Santo, Rio Grande do Norte e Bahia, foi asfixiado até o limite da inviabilidade, principalmente pela redução na arrecadação com royalties e participações especiais (Figura 2).

Figura 2: Arrecadação de royalties e participações especiais pelos Estados da Federação

Fonte: ANP, elaboração própria

O objetivo deste artigo é discutir o alongamento de dívidas entre os Estados e a União, no contexto de consolidação de pacto federativo, como condição necessária para retomada dos investimentos públicos no Brasil a partir de 2019.

Bancos públicos e dívidas dos Estados com Governo Federal

Ao termo de 2016, a dívida financeira dos Estados totalizou cerca de R$ 920 bilhões. Algo em torno de R$ 100 bilhões (14% do total) encontrava-se contraído junto a bancos federais. Deste montante, aproximadamente 44% devidos ao BNDES, o qual ainda dispõe de ao menos R$ 150 bilhões em reservas prontas para apoiar novos projetos de investimentos (Tabela 1).

Tabela 1: Endividamento dos Estados e potencial de renegociação

Fonte: Tesouro Nacional e BNDES

Até dezembro de 2017 o BNDES alongou dívidas de Estados elegíveis aos benefícios da Lei Complementar nº 156, de 28/12/16 – que estabeleceu o Plano de Auxílio aos Estados e ao Distrito Federal. A LC 156/16 permitiu alongamento por dez anos no prazo de amortização, incluindo-se quatro anos de carência, nos quais o BNDES postergará o recebimento da primeira parcela de repagamento. Na prática, será possível aos governadores eleitos em 2018 um mandato com quatro anos de fluxo de caixa livre para investimentos e modernização da administração pública.

Entre os cinco Estados com maior endividamento, o Rio de Janeiro foi o único que ainda não obteve condições para refinanciar dívida junto ao BNDES. Dos cerca de R$ 112 bilhões devidos pelo ERJ ao termo de 2016, quase R$ 20 bilhões correspondiam a bancos federais. Destes, aproximadamente R$ 7,5 bilhões (40%) com o BNDES.

Exercício para investimentos a serem alavancados nos Estados com renegociação com bancos públicos

O potencial de alívio nas contas estaduais, decorrente de renegociação de dívidas entre bancos federais e Estados, é bastante variável entre as UFs. Os maiores, como ERJ, Minas Gerais e São Paulo, possuem fração considerável da dívida contraída fora dos bancos federais. Com isso, a eficácia da renegociação como impulsionador de investimentos não parece muito grande, a menos que o Tesouro/Fazenda passem a ser cooptados por projeto de planejamento coordenado entre as três esferas de Governo.

Não obstante, é possível se estimar volume de investimentos alavancado com participação de 20% dos Estados e 80% dos bancos públicos para o período 2019-2022. Considera-se que a contrapartida dos Estados vem do montante não pago em amortizações por período de quatro anos (período de graça concedido pelo BNDES). Na Tabela 3 apresenta-se percentual da Receita Corrente Líquida (2016) que pode ser alavancado como novos investimentos, em cada Unidade Federativa.

Se apenas o BNDES renegociar dívidas, o investimento total que pode ser alavancado soma cerca de R$ 16,5 bilhões, quantia compatível com os recursos hoje em caixa na instituição. Se incluídos demais bancos federais, a renegociação pode alcançar até R$ 26,2 bilhões em investimentos. Finalmente, se o Ministério da Fazenda/Tesouro vierem a ser cooptados, a renegociação pode alavancar até R$ 94 bilhões em investimentos no quadriênio 2019-2022.

Admite-se como estratégia adequada e viável para cooptação do Ministério da Fazenda/Tesouro Nacional a articulação, por parte dos governadores eleitos em 2018, de pacto para retomada dos investimentos, emprego e renda no país.

Este pacto federativo deve se fundamentar em proposta de planejamento coordenado entre as três esferas de Governo, de maneira transparente e participativa. Os bancos federais podem e devem desempenhar papel de liderança neste planejamento, com disponibilização de quadros junto às UFs, de maneira a garantir a conformidade dos projetos a políticas operacionais e redução de custos e prazos para análise. Sob estas circunstâncias parece razoável supor que existam medidas jurídico-institucionais-legais capazes de excepcionalizar a renegociação da dívida consolidada de cada UF com o Tesouro frente ao arcabouço de Responsabilidade Fiscal.

Crédito da foto da página inicial: Intersindical/Blog Controvérsia

Marco Aurélio Cabral Pinto – É professor da Escola de Engenharia da Universidade Federal Fluminense, mestre em administração de empresas pelo COPPEAD/UFRJ, doutor em economia pelo IE/UFRJ. Engenheiro no BNDES e Conselheiro na central sindical CNTU. É colunista do Brasil Debate

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