Rússia reabre seu caso mais misterioso: conheça o “Arquivo X” soviético

No final de janeiro de 1959, oito rapazes e duas moças partiram em uma expedição de esqui rumo à montanha Otorten, ao norte dos montes Urais, na então União Soviética. Nove deles jamais regressaram.

O único sobrevivente do grupo foi Yuri Yefimovich Yudin (à época com 21 anos), que regressou sozinho da viagem ao se sentir mal, apenas três dias depois da partida para as montanhas. Todo o restante da expedição morreu de forma misteriosa e violenta.

O caso é um dos mais complexos da história moderna da Rússia, permeado por incógnitas e teorias incomuns que se desenvolveram ao longo dos anos. Até mesmo um documentário denominado Russian Yeti: The Killer Lives foi produzido em 2014 pelo canal de televisão Discovery Channel, em que as circunstâncias dos acontecimentos são analisadas sob a hipótese do mitológico Pé Grande ter sido o autor da tragédia.

Tantas especulações absurdas e perguntas simples sem respostas levaram o Ministério Público de Sverdlovsk a reabrir, em fevereiro de 2019, as investigações do caso que ficou conhecido como o Incidente da Passagem de Dyatlov.

Apesar de excluir uma investigação criminal por falta de pistas, segundo a declaração do porta-voz do órgão feita à agência de notícias russa Tass, as autoridades ainda buscam concluir o que realmente aconteceu com estudantes do Instituto Técnico do Estado de Ural naquela fatídica noite de 2 de fevereiro de 1959.

O túmulo onde repousam juntas as nove vítimas da tragédia está constantemente coberto por coroa de flores e homenagens daqueles que ainda não obtiveram uma resposta concludente sobre o que causou morte do grupo. As investigações do Incidente da Passagem de Dyatlov concluíram na época que as mortes foram causadas por “uma força natural insuperável”, conforme os arquivos oficiais recentemente trazidos à tona.

A expectativa é que novas tecnologias investigativas possam, enfim, elucidar este caso peculiar. Entenda os enigmas e variadas teorias conspiratórias que rodeiam um dos casos mais misteriosos e perturbadores da antiga União Soviética.

 

Jornalistas acompanham a coletiva de imprensa sobre a reabertura do caso. Imagem/Reprodução: CNN.

O que se sabe até agora, mais de meio século depois?

Em 23 de janeiro de 1959, o grupo inicialmente formado por oito homens e duas mulheres, com idades entre 21 e 38 anos, se reuniu em Yekaterinburg, cidade no centro-oeste da antiga União Soviética. De lá, tomaram o trem em direção à Vizhai, último ponto com comunicação disponível antes do destino final, a montanha Gora Otorten, com cerca de 1.200 metros de altitude.

Vale ressaltar que todos os integrantes da expedição eram esquiadores experientes e habituados aos ambientes gelados e montanhosos, principalmente o líder da incursão, Igor Dyatlov. A trágica viagem teve início no dia 27 de janeiro, com previsão de retorno em 12 de fevereiro de 1959.

Um dia após a partida, o jovem Yuri Yudin começou a sentir fortes dores no nervo ciático e decidiu voltar à Vizhai, assentamento que havia ficado para trás. Ele foi o único sobrevivente do estranho episódio, falecendo somente em 2013. De acordo com as suas declarações à imprensa local, ele ainda sofria com o trauma do ocorrido com seus amigos.

Em 1º de fevereiro, o grupo decidiu montar seu acampamento na encosta de uma montanha a 10 quilômetros da montanha Gora Otorten. Estranhamente, essa não parecia a escolha mais adequada para um grupo com experiência nesse tipo de incursão: as temperaturas ali chegam aos -30ºC durante essa época do ano.

Aqui começa uma série de fatos ainda desconhecidos, mas as investigações apontam que, a partir desse ponto, tudo indica que os estudantes não queriam mais voltar atrás.

Sem notícias, começam as buscas

 

Tenda encontrada pelo grupo de resgate. Imagem/Reprodução: BBC

Igor Dyatlov ficou responsável por enviar um telegrama quando a expedição retornasse à Vizhai, mais ou menos em 12 de fevereiro (o que nunca aconteceu). Mesmo com alguns dias de atraso da data prevista, não houve alarme ou espanto dos que aguardavam o retorno dos esquiadores porque o mau tempo era comum durante a estação, o que poderia causar eventuais atrasos do grupo.

Após três semanas sem notícias, em 20 de fevereiro o Instituto de Ural decidiu enviar um grupo voluntário de buscas na esperança de localizar seus estudantes. O que eles encontraram continua chocando e intrigando o mundo até agora.

Foram achados primeiro a tenda do grupo e artefatos como botas de neve e pedaços de carne nos pratos, como se os jovens estivessem prestes a fazer uma refeição. Mas logo o grupo de buscas percebeu que a tenda havia sido rasgada pelo lado de dentro, como se alguém estivesse desesperado para sair dela.

Um desses voluntários chegou a relatar à jornalista Lucy Ash, da BBC, que viu pegadas congeladas em torno da barraca, como se feitas por pessoas descalças ou usando apenas meias. As pistas inicialmente acabavam ali e o grupo de resgate voltou para reportar o que havia encontrado. A segunda incursão de resgate começou a encontrar o que mais temiam: uma trilha de corpos que levou três meses para ser concluída.

Entre os fatos mais estranhos, foi reportado que alguns deles estavam descalços, outros apenas vestindo roupas íntimas. Além disso, três dos corpos apresentavam ferimentos muito graves, como contusões e fraturas pelo tronco e crânio. Além disso, duas das vítimas estavam sem olhos e outra sem a língua. A irmã de Dyatlov chegou a mencionar também à BBC que, quando viu a foto de Igor em seu caixão, achou estranho que seu cabelo estivesse cinza.

De acordo com os arquivos, a causa oficial da morte foi registrada como hipotermia.

As teorias

Como mortes tão brutais e em circunstâncias tão incomuns podem ter acontecido em um local tão isolado?

As possíveis (e impossíveis) explicações alimentam inúmeras teorias, livros, filmes e documentários sobre o caso. Conheça alguma delas:

– Assassinato: os jovens teriam sido mortos por uma tribo indígena local, os mansis, por invadir um local sagrado. Essa hipótese foi descartada pelas autoridades após interrogatórios.

– Testes nucleares: a análise das roupas foi positiva para radiação nuclear. No ápice da Guerra Fria, os jovens poderiam ter sido acidentalmente vitimados por testes de armas secretas do governo e a cena montada para encobrir o caso. Por mais que seis dos nove alpinistas realmente tenham morrido de hipotermia, três corpos apresentavam sinais de que haviam sofrido uma grande pressão, como em um acidente de trânsito ou esmagamento.

– Avalanche: o grupo teria sido surpreendido no meio da noite por toneladas de neve e, tentando escapar do local, fugiram às pressas. Eles teriam morrido de hipotermia e quedas tentando voltar à tenda. Essa teoria é pouco provável, já que todo o grupo era extremamente experiente e não seria provável que fizessem seu acampamento em uma área de risco.

– Infrassom: retratada no livro Dead Mountain (2013), o autor Donnie Eichar trata da possibilidade que os alpinistas sucumbiram a um vórtice causado pelos ventos vindos da montanha. Isso poderia gerar um infrassom capaz de causar ataques de pânico em seres humanos. O grupo teria fugido às pressas no meio da noite, sem chances de voltar ao acampamento, e congelaram até a morte. Alguns deles podem ter caído e se acidentado nas rochas de uma ravina.

Estima-se que existam mais de 70 teorias sobre o trágico fim da expedição. Passadas seis décadas os russos e mundo ainda esperam por respostas.

Redação

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