Ser Professor e a Indisciplina, por Luiz Tonchis

E precisamos prestar mais atenção nos nossos mestres. Eles são quem ainda podem, por delicado e precioso ofício, trilhar pelos caminhos das pedras para salvar a humanidade

Ser Professor e a Indisciplina, por Luiz Tonchis

A instituição escolar, espaço essencialmente educativo e de socialização, enfrenta o desafio de manter uma postura reflexiva e de ações efetivas frente à enxurrada permanente de relações interpessoais negativas, minando o cotidiano escolar.

Os educadores encontram-se perplexos e, dependendo do contexto da escola, a maior parte do tempo dos profissionais da educação são utilizadas para “apagar incêndios”, prejudicando o desenvolvimento do trabalho e da aprendizagem.

Para os professores, a indisciplina é a maior dificuldade a ser enfrentada no dia-a-dia da sala de aula, é a principal responsável pela angústia e cansaço emocional dos docentes. É muito comum os professores se queixarem a respeito de alunos indisciplinados, sem limites, agressivos ou aqueles que simplesmente recusam-se a realizar as atividades propostas em sala de aula.

Por outro lado, ser professor não é somente navegar na lama escura e enfrentar os monstros nas instituições. Para quem é professor, as somas das sensações positivas no ato de professar sobrepõe as negativas. Ser professor representa o ato de professar – ser professor como quem professa, é aquele que faz aflorar todas as virtudes daquele outro ser, levando-o a aprender.

Os alunos nascem diante dos bons professores, se tornam seres humanos melhores e, cada dia que o aluno sai pelo portão da escola para ir embora – ele sai um pouco melhor. Através do diálogo e das aulas, os transformam em melhores versões. Quantos alunos sente-se mais humanos, mais gente, depois de uma aula brilhante? Ele sai entusiasmado, acreditando no seu potencial, como se tivesse crescido verticalmente durante uma sequência de cinquenta minutos.

Diante do caos social que nos atinge, a crise de valores sem precedentes, o individualismo, a violência e tantas outras mazelas, e muitas delas potencializadas pelas redes sociais, não devem contaminar a Escola. Na Escola, reside a esperança para que um dia tenhamos gente bem formada, mais humanizada e com melhores condições de vida – de vida social.

A felicidade, já nos dizia Aristóteles, é coletiva. O núcleo da sociedade deve ser construído sobre a vida, o bem comum, pela participação de todos e a solidariedade entre os humanos. Fora disso, não há salvação e o mundo aproximar-se-á cada vez mais das trevas.
Porém, a questão é saber se as teorias e o modo arcaico em que as escolas ainda funcionam podem trazer contribuições face às perplexidades do mundo de hoje. Quanto elas nos ajudariam a compreender o anseio pelo poder e controle como parte do desenvolvimento humano? Quão tênue seria o divisor de águas entre a ordenação dos desejos e os limites externos impostos, o velho e novo, para traçar os contornos do que é ou não possível e aceitável para uma escola melhor, mais viva e alegre.

As orientações pedagógicas em voga contemplam timidamente as condições adversas das salas de aulas e das escolas, como por exemplo, a questão da indisciplina. Tecem posicionamentos compreensivos sobre como a aprendizagem se desenvolve, considerando apenas as condições típicas e pincela algumas anormalidades decorrentes de fatores específicos. Geralmente, os teóricos imaginam e propõem práticas pedagógicas como se os alunos fossem interessados, disciplinados e as deficiências das aprendizagens fossem resultados de problemas neurológicos, psicológicos ou sociológicos.

Para a saúde da educação, a indisciplina e como lidar com ela, não devem estar desconectadas do currículo, do projeto político pedagógico da escola, dos planos de cursos e dos planos de aulas. É preciso entender que a indisciplina escolar faz parte do processo de desenvolvimento de nossas crianças e adolescentes e enfrentar esse complexo fenômeno com racionalidade e humanidade, é sempre um grande desafio.

Diante do contexto e da falta de políticas públicas para tratar do assunto, formar e orientar os docentes para um enfrentamento mais humanizado, faz-se boa pedida já que alguns educadores assumem procedimentos de forma unilateral. Cada professor, ou mesmo as instituições de ensino, criam as suas próprias fórmulas e como falta orientação consistente por parte dos sistemas de ensino, cada um tem agido ao seu modo e, muitas vezes, ziguezagueiam perdidos sem saberem o rumo a que se pretende trilhar.

Diante dos desafios impostos à sociedade contemporânea, qualquer solução recorrente passa pela escola. Mas, para isso, é necessário políticas públicas. Se o grande problema para o professor é a indisciplina, eles não podem ser abandonados neste quesito. É preciso preparo, formação adequada, muita disposição e paciência.

A escola é muito mais que um espaço físico e plural, como também são os educadores, com conflitos pessoais e humanos, que lidam, mesmo assim, diariamente com crianças e adolescentes que trazem de casa e da sociedade todas as mazelas refletidas em suas individualidades ainda em formação. A Escola é uma espaço de significados que transcendem o espaço e o tempo. Ela também não é desconectada da sociedade e nem o professor é. Mas o professor, é o grande personagem, o herói. Matar o professor é matar o nosso próprio futuro.

É imperativo que o Estado e as pessoas cuidem e respeitem os professores. Se temos professores deprimidos, angustiados e os principais motivos são as condições adversas e, muitas delas, poderiam ser amenizadas pelos sistemas, como por exemplo, na revisão das condições de trabalho, da desvalorização social, dos baixos salários, dos acúmulos de cargos, da excessiva quantidade de horas trabalhadas para poder manter a sua família. O grande vilão ainda é a indisciplina, segundo eles próprios. Se os responsáveis por políticas públicas em educação, tiverem consciência dessas fragilidades e agissem em favor das escolas e dos professores, com certeza, começariam a caminhar.

Falta formação para o professor enfrentar esse vilão e essa responsabilidade cabe aos sistemas de ensino. A indisciplina deve ser um projeto da escola, de todos. Todos têm de falar a mesma língua. Se o professor transfere toda a responsabilidade dos problemas da sala de aula para os gestores, ele está atestando a sua incapacidade de resolver os mesmos. O aluno percebe isso. Esse professor sempre terá problemas nas relações interpessoais na sala de aula e os alunos sempre irão fazer provocações para desestabilizá-lo. O ideal é que os problemas sejam resolvidos pelo próprio professor e esse comportamento confere ao mestre a autoridade necessária. Sempre fez parte do ofício saber gerenciar a sala, lidar com os conflitos e entender o comportamento do jovem.

É evidente que sempre existem as exceções, há estudantes que não se enquadram minimamente nas normas de convivência da Escola. Neste caso, os gestores devem procurar a família, e verificar se tem condições de resolver o problema, caso não haja essa condição há necessidade de encaminhar o aluno a órgãos que atuam em esfera civil mais ampla: Conselho Tutelar e a Promotoria Pública.

No entanto, o melhor remédio para a indisciplina é uma boa aula, uma aula bem preparada, que considere o contexto da sala, evidentemente. Autoridade com serenidade são ingredientes indissociáveis para o ofício de professor como quem professa. Ser professor é aquele que interiorizou uma prática e se fez a partir dela, aquele que se ocupa em ser materno e paterno, irmão e amigo de pessoas desamparadas nas escolas públicas, aquele que, apesar das adversidades age com sabedoria para salvar os menos favorecidos na porcaria de mundo em que o mundo veio a tornar-se. E precisamos prestar mais atenção nos nossos mestres. Eles são quem ainda podem, por delicado e precioso ofício, trilhar pelos caminhos das pedras para salvar a humanidade.

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador