Sete + sete maravilhas da literatura, por Walnice Nogueira Galvão

Walnice Nogueira Galvão indica mais sete maravilhas da literatura. Confira

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por Walnice Nogueira Galvão*

Em enquete anterior, sugeri que as sete maravilhas da literatura incluiriam: Gilgamesh, a Bíblia, a Ilíada, o Mahabharata, As mil e uma noites, A demanda do Santo Graal, a obra de Shakespeare, Em busca do tempo perdido – aliás, oito. As sete a seguir, que não substituem aquelas mas as complementam, são:

Popol Vuh – O livro sagrado dos maias, que narra seu mito de origem, chamado “Os Homens de Milho”: nada mais adequado aos povos do continente que inventaram esse alimento.  Herois civilizadores, os gêmeos Hunapuh e Ixbalanque vão aos mundos ínferos, ou Xibalbá, onde enfrentam temíveis deuses destruidores de seres humanos, regressando vitoriosos, trazendo dádivas para os homens e transformados em Sol e Lua. O livro registra também  a origem do Jogo de Pelota. O maior monumento literário das grandes civilizações do continente, dos raros que escaparam â sanha incineradora dos espanhóis.

Odisseia –  Poema épico que é par da Ilíada conta as peregrinações de Ulisses. Um dos protagonistas da Guerra de Tróia, que durou dez anos, levaria mais dez anos para voltar a seu reino em Ítaca. Ulisses atravessaria os milênios como modelo de astúcia (seu epíteto: “o solerte”). Sobrevive a aventuras mirabolantes, enfrentando naufrágios, sereias,  Polifemo o ciclope antropófago, a feiticeira Circe, a passagem entre  Cila e Caribdes, a viagem ao Hades, os comedores de lótus…

A tragédia ática– Um dos pontos mais altos que a literatura já atingiu, no apogeu de Atenas, quando foram criadas a filosofia, a ciência, a democracia etc,  Analisada por Aristóteles na Poética, apresenta os fastos dos povos gregos. Ésquilo, Sófocles e Eurípides discutem questões grandiosas, entre elas destino, glória, honra, dever, fatalidade, crimes contra a natureza, ou então os embates entre duas ordens morais. Pode ser a lei do sangue versus a lei da polis, como em Antígona; ou o tabu do incesto, como em Édipo Rei; ou a lei de talião  que perpetua os assassinatos,  dilemas que só as instituições da democracia, entre elas o tribunal do júri, poderão solucionar, como na trilogia da Orestíada.

D. Quixote – Um pequeno fidalgo do distrito da La Mancha, com seu fiel escudeiro Sancho Pança, sai em demanda cavalheiresca  tardia. O fidalgo enlouqueceu de tanto ler novelas de cavalaria, acabando por convencer-se de que era personagem delas. A prosa burguesa anuncia que outra classe se encaminha para tomar o poder. O fidalgo projeta a seu redor o que lê nas novelas: os moinhos de vento são gigantes ameaçadores, os carneiros. são mouros em pé de guerra, uma tosca camponesa é sua musa, a quem dá o nome de Dulcineia del Toboso.  É o primeiro romance moderno.

Genji Monogatari- A prosa de ficção no Ocidente demoraria muito para tornar-se hegemônica, e só o faria a partir de D. Quixote, tendo vigência até hoje. Mas em outras latitudes as coisas são diferentes, e o romance em prosa surge quase um milênio antes. É o caso desde O conto de Genji, do séc. XI: uma crônica dos amores numerosos e enredados de um nobre da corte japonesa, filho do imperador e de uma concubina. As intrigas palacianas ocupam o dia-a-dia das personagens.  Este clássico tem a honra de ser o primeiro romance em prosa da História. A autora é uma dama da corte, Murasaki Shikibu, que traça um quadro do Japão feudal.

A Divina Comédia – A mais perfeita representação literária do mundo medieval (séc. XIV), com suas hierarquias estáticas, garantidas por Deus, imóveis como imóvel era a Terra no centro do sistema solar. Dividida em Inferno, Purgatório e Paraíso, composta em versos decassílabos na célebre terza rima em que Dante era perito, é referência obrigatória  para estudos de literatura e cultura. Nada nem ninguém disputa o título da mais alta produção da língua italiana.

Poesia latinaJorge Luis Borges, useiro e vezeiro de opiniões esdrúxulas, sustentava que preferia a Eneida à obra homérica:  pela perfeição do verso, dizia ele. Isto quanto à poesia épica. Mas a poesia lírica consta de obras-primas de grandes poetas, como Ovídio, Horácio e mesmo o próprio Virgílio. Brilha entre eles a belíssima poesia erótica de Catulo, até hoje considerada sem par.

*Walnice Nogueira Galvão é Professora Emérita da FFLCH-USP

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