SOBRE PACTOS E RETROCESSO

1. O vento começou a virar quando Moro forçou a mão, levando “debaixo de vara” Lula a depor e, em seguida, Lula deu a famosa entrevista da jararaca. A mobilização imediata em Congonhas e a reação combativa de Lula foram o ponto de inflexão. Ali delineou-se o NÃO VAI TER GOLPE, VAI TER LUTA. Naquele momento, os movimentos sociais e a sociedade civil progressista entenderam que a coerção do ex-presidente era a coerção de direitos conquistados às duras penas nos últimos 30 anos. Defender o mandato presidencial e a incolumidade de Lula passaram a ser a linha marginot que não pode ser ultrapassada. O golpe seria a conquista da cidade luz pelos nazistas. A prisão de Lula o Waterloo da democracia brasileira.

2. Por temerem a volta imediata de Lula ao centro da cena política, Moro e Janot erraram clamorosamente com a divulgação dos aúdios. O que em um primeiro momento significou embaraço à presidenta e ao ex-presidente, depois revelou, de maneira cabal, que a investigação estava usando qualquer instrumento, até mesmo ilegal, para atingir seus fins. A consciência jurídica e democrática do país indignou-se e ambos tiveram que retratar por escrito o ato. O ministro Teori teve a oportunidade de enquadrar Moro e trazer o processo outra vez ao STF. A brilhante defesa de Cardoso na comissão do impechament, contemporaneamente à performance da musa do golpe no Largo São Francisco, mostrou também a debilidade jurídica dos golpistas frente aos avanços que o país adquiriu nas últimas décadas.

3. A ida de Lula a Brasília, negociando diretamente com os políticos de centro e com os partidos menores, colocou em xeque as manobras de Temer, Cunha, Jucá e Moreira Franco, que tentaram forçar a saída do PMDB do governo. O tiro saiu pela culatra. A aprovação dessa saída por aclamação e a famosa pose dos investigados de mãos dadas expressou bem o mico político, o mal estar causado pela constatação da funesta companhia reunida flagrado pelo ministro Barroso. Os ministros continuam em sela e, como registrou Renan, a caneta de Dilma encheu-se de tinta. As negociações de Lula foram fortalecidas.

4. Ao mesmo tempo, cada aparição de Lula nas manifestações, nas reuniões públicas, na internet, produz um movimento catalizador de energia, de continuidade de operaçães de renovação, uma potência que se realiza no tempo (imediato e futuro), e apesar de tudo, contínuo que se pode chamar de poder constituinte (Antonio Negri). Este poder, que nunca deixou de manifestar, tenta se reaglutinar (vide a Frente Popular e o manifesto das periferias) e revigora-se com a presença de Lula, porém vai além da pessoa do ex-presidente. Isso é o que mais incomoda os golpistas. Lula não só cataliza esse processo mas pode potenciá-lo além dos seus próprios interesses imediatos. 

5. Por essas e mais outras razões não existe pacto, do ponto de vista dos direitos sociais e das liberdades democráticas, que não preserve a presença de Lula no cenário político nacional. O poder constituinte, os milhares e milhares que estão manifestando nas praças que não haverá golpe, tem Lula, ainda, como seu porta-voz. Descartar o seu protagonismo é jogar uma partida de xadrez dando a Dama, uma torre e um peão ao adversário.  E limitar a saída democrática da crise política às negociações com parte do Congresso. Em outras palavras, pactuar o retrocesso.

Redação

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