SUPER PONOR ! UMA GRANDE GINASTA !

Catalina aos 5 anos em Constanta

 

Há umas semanas atrás, escrevi um comentário em um dos textos do João Sucata sobre a repetição permanente de temas e notícias (quase sempre relacionados ao futebol) na página esportiva do blog e consequentemente a carência de discussão sobre outros temas esportivos. Sei que o esporte não é a principal temática do GGN, mas acho que há espaço para explorarmos um pouco mais outras modalidades.

Assim, resolvi escrever sobre outra temática e trazê-la como sugestão para oxigenar um pouco as postagens esportivas do Blog, saindo da monocultura futebolística.

Esse texto, que vem com alguns meses de atraso, tratará sobre Ginasta Romena Catalina Ponor, uma personalidade da Ginástica Artística, e sobre o título europeu conquistado na trave pela atleta no dia 23/04/2017.

Para quem, de modo geral, não acompanha a ginástica artística, este foi apenas mais um resultado qualquer em uma competição regional, no caso o Campeonato Europeu. Entretanto essa vitória não foi nada de corriqueira, mas sim muito especial.

O campeonato europeu é uma competição muito importante e tradicional na ginástica, pois estão participando os países com maior tradição no esporte, exceto EUA e China, conta com um nível técnico altíssimo e dá um indicativo dos atletas que potencialmente tem condições de disputar medalhas no campeonato mundial ou jogos olímpicos do ano corrente. 

Para dizer sobre essa vitória é necessário contar uma breve história sobre a ginasta Catalina Ponor e sobre a ginastica romena (lá vem textão, mas texto legal).

Todos sabem que a Romênia é o país que revolucionou a ginástica artística a partir da lendária Nádia Comaneci, revelou de forma frequente grandes talentos além de ter ganhado medalhas por equipes em todas as edições dos Jogos Olímpicos desde 1976.

Porém, neste ultimo ciclo olímpico a história foi diferente, tendo a ginástica Romena entrado em grave crise que culminou com a não classificação da equipe para os jogos olímpicos na Rio 2016, conquistando apenas uma vaga individual.

A ginasta Catalina Ponor é conhecida pela constância nas apresentações, pela boa utilização do código de pontuação com séries e ligações inteligentes, pela boa técnica, rapidez e alta complexidade na execução dos elementos na trave, aliada a uma presença de espírito e personalidade fortes, que cativa tanto o público quanto os árbitros. Toda a história de superação em sua carreira é um ponto a mais que cativa ambos.

Nascida em 1987 na cidade costeira de Constanta, ainda no auge da ginástica romena, Catalina iniciou as atividades na ginástica aos 4 anos “Sempre que eu passava na porta do ginásio com minha avó eu apontava para ele. Quando eu entrei no ginásio não consegui mais sair”. (Fonte: http://adevarul.ro/news/sport/catalina-ponor-gimnasta-o-plec-tara-1_50ba01217c42d5a663af3f41/index.html; 2011).

Catalina Ponor – Arquivo Pessoal – 5 anos na cidade de Constanta

Em 2002 aos 15 anos, de forma tardia, ela foi selecionada pelos grandes técnicos da seleção romena Octavian Belu e Mariana Bitang, para integrar os treinamentos da equipe nacional. Em sua primeira grande competição internacional, o campeonato mundial pré-olímpico de 2003, a ginasta foi medalhista de prata por equipes, prata na final de trave e prata na final de solo (o ouro ficou com a apresentação memorável de Daiane dos Santos, que pode ser assistida no link ao lado – https://www.youtube.com/watch?v=XyQ5XBg7xaU).

A consagração veio em 2004 quando ela se tornou tricampeã europeia (equipes, trave e solo) e tricampeã olímpica (equipes, trave e solo), feito este que havia sido alcançado pela ultima vez apenas pela também ginasta Romena Daniela Silivas nos jogos de 1988 (Série Final de Trave Ponor 2004: https://www.youtube.com/watch?v=Sg2RIe0cI3w). 

Catalina Ponor – Cerimênia de Premiação Solo – Olimpiadas de Atenas 2004

Catalina estava no auge, mas a partir de 2005 se envolveu em escândalos pessoais e algumas peripécias (como saídas noturnas da concentração para ir a festas e baladas) que levaram à dissolução da seleção permanente da Romênia, além de ter descoberto, após a fama, que tinha um irmão biológico que desconhecia até então.

A turbulência desse ano aliada à juventude (e ao status de celebridade na Romênia) transformaram Catalina. Apesar de ter sido novamente campeã europeia na trave em 2005, estava visivelmente fora de forma e não teve um bom desempenho na ginástica terminando “apenas” com a medalha de bronze no campeonato mundial de 2005, fechando a competição com polêmicas declarações quanto ao seu desempenho, às adversárias, aos árbitros e à estrutura da ginástica romena. (Fonte: https://esporte.uol.com.br/ginastica/ultimas/2005/11/24/ult803u495.jhtm

Em 2006 apesar de não ter conseguido recuperar sua forma física de 2004 ela foi novamente campeã europeia de trave, com umas das séries mais difíceis já realizadas até então (Série Trave Ponor 2006: https://www.youtube.com/watch?v=MB3dt3zCDGQ ).

No final de 2006, Catalina anunciou sua aposentadoria. Retornou em 2007 na tentativa de obter uma medalha de ouro no mundial (único título que falta até então em sua carreira), ajudar a Romênia a se classificar para as olimpíadas de Pequim e consequentemente participar de uma segunda edição dos jogos.

Apesar da medalha de bronze por equipes no mundial, Ponor não conquistou medalhas individuais e, ainda no mesmo ano, anunciou sua aposentadoria final da ginástica alegando problemas de saúde, que salvo engano, incluíam 2 hérnias de disco. Tudo indicava que Catalina sairia da ginastica “à francesa”, sem um “grand finale” após a explosão inicial quase meteórica da sua carreira.

Aposentada, passou uma temporada tentando a carreira de treinadora nos Estados Unidos, mas ainda sentia falta das competições. Em encontros com Nádia Comaneci (que mora nos EUA e é amiga de Ponor), a própria apoiou Catalina a retornar às competições já que este era um desejo muito forte, ela não estava totalmente fora de forma, não teve lesões graves e a ginástica romena não estava mais produzindo tantos talentos como antigamente. (Fonte: http://espn.uol.com.br/noticia/265493_com-apoio-de-comaneci-tricampea-olimpica-catalina-ponor-retorna-aos-jogos-apos-oito-anos)

“Eu senti muita falta do ginásio, dos treinamentos, principalmente das competições e eu realmente queria retornar. O momento decisivo foi quando eu olhei ao redor e pensei, se outras ginastas de outros países podem fazer ginástica até uma idade relativamente avançada, porque eu não posso?!”

Desta forma, em 2011, parada há 4 anos e a menos de 2 da olimpíada de Londres, Ponor anunciou o retorno aos treinamentos, já com 25 anos.

Para quem não acompanha a ginástica de alto nível, é raro encontrar uma ginasta de 25 anos, dado que o ponto alto da carreira feminina é alcançado entre os 15 e 20 anos. Isto ocorre devido à série de lesões que o esporte de alto rendimento proporciona, à rigidez dos treinamentos que poucas atletas conseguem manter por muitos anos na fase adulta, à necessidade de controle permanente de peso e também devido às alterações corporais/hormonais que afetam a performance em alto rendimento. Ou seja, uma ginasta retornar ao alto rendimento aos 25 anos tendo ficado parada por quase 4 anos é no mínimo ousado!

Apesar dos problemas naturais do retorno:

“Após o primeiro treinamento eu mal podia ficar em pé e os primeiros meses de retorno foram complicados porque eu exigi muito do meu corpo para conseguir voltar. Eu tinha dores musculares constantes e tomei aspirina por um bom tempo”. (Fonte: http://adevarul.ro/news/sport/catalina-ponor-gimnasta-o-plec-tara-1_50ba01217c42d5a663af3f41/index.html)

De uma cirurgia cardíaca, devido à má formação congênita descoberta em 2011 que causava taquicardia, e do ceticismo sobre seu retorno, a ginasta conseguiu se preparar e competir em alto nível no mundial de 2011.

Apesar de não ter conquistado medalhas, ficou claro que ela estava de volta e feito um milagre conseguindo retornar ao alto nível em aproximadamente 9 meses de treinamento e com uma excelente forma física.

Em 2012 veio a redenção, o “grand finale” de Ponor.

Com a melhor forma física da carreira até então (melhor ainda que em 2004) e com séries muito difíceis tanto na trave quanto no solo ela conquistou a medalha de bronze por equipes, uma medalha de prata honrosa no solo e um 4º lugar polêmico na trave que ocorreu após um requerimento de revisão de nota solicitado pela ginasta americana Aly Raisman que empatou com Catalina e no critério de desempate deu a medalha de bronze à americana. (Série de Solo medalha de prata de ponor em 2012: https://www.youtube.com/watch?v=1GejPfq3W1E).

Catalina Ponor – Cerimônia de Premiação Solo – Olimpiadas de Londres 2012

 

Catalina Ponor – Final de Solo – Olimpiadas de Londres 2012

Após os jogos de 2012 veio uma nova aposentadoria e 3 anos depois adivinha?!

Ponor anunciou, contra todas as previsões, que retornaria novamente à ginástica!

Entre as razões do retorno estava a já grave deficiência da Ginástica Romena na formação de novas e talentosas atletas e a necessidade de ajudar a equipe a se classificar para os jogos do Rio.

Com um novo esforço heroico de retorno ao alto rendimento após o período de pausa, e já com 28 anos, a trajetória de Catalina foi mais complicada dessa vez, dado que na véspera do campeonato mundial pre-olímpico classificatório ela teve uma fratura no pé e ficou fora da competição.

Com o desfalque a Romênia fez uma competição desastrosa, terminou em 13º lugar e teria que disputar uma repescagem para participar dos jogos. Na repescagem, a equipe romena não conseguiu a vaga e estava fora da Rio 2016! Uma bomba no mundo da ginástica já que a equipe romena conquistou medalhas por equipes em todos os Jogos Olimpicos desde 1976 e se tornou uma das principais referências no mundo da ginástica!

Neste terceiro retorno, Ponor foi muito criticada por estar ocupando o lugar que poderia ser de uma outra jovem ginasta e por não ter conseguido classificar a equipe romena na repescagem. Outro ponto é que agora a Romênia teria apenas uma vaga individual a ser preenchida na ginastica artística feminina e após uma competição interna, Catalina venceu a disputa e carimbou o passaporte para a Rio 2016.

Na olimpíada, Ponor foi a porta bandeira da Romênia, mas não fez uma boa competição. Além de não ter conseguido se classificar para a final de solo, a ginasta cometeu um erro grave na final de trave, conquistando a sétima colocação. Ficou sem medalhas e terminou os jogos com uma participação discreta, fora holofotes. 

Dessa vez a ginasta não se aposentou.

Em abril de 2017 a Romênia sediaria o campeonato europeu de ginástica que não era realizado no país desde 1957.

Agora, a conjuntura da ginástica Romena era outra e inclusive dramática.

Sem novos talentos e com o fracasso na olimpíada do Rio, havia a dúvida se a Romênia terminaria sem medalhas sediando uma das competições mais importantes do mundo na modalidade em que tem seus melhores resultados esportivos.

Ponor decidiu encarar o desafio e competir mesmo com a chance de um fiasco dentro de casa, mais um 7×1 contra a Romênia.

Com toda a pressão envolvida, assistida pessoalmente na arquibancada por suas ex-companheiras de 2004, pela mito Nádia Comaneci, por seus compatriotas e por diversos fans online ao redor do mundo, Catalina conseguiu se superar novamente e se tornou mais uma vez campeã europeia na trave, seu melhor aparelho, e alcançando um recorde histórico de 5 títulos europeus na trave (2004, 2005, 2006, 2012 e 2017).

Segurou toda a pressão de um país e de uma história vitoriosíssima nas costas e mostrou – em um pedaço de madeira de 10cm de largura, 5 metros de comprimento e 1,35 metros de altura – porque é uma das melhores ginastas da história na trave de equilíbrio. Manteve a Romênia no jogo e mostrou que elas não sairão da história tão fácil. Do fracasso no Rio foi a salvadora nacional em 8 meses e hoje participa de diversas entrevistas e programas de Tv romenos. 

Catalina Ponor – Final da Trave de Equilíbrio Campeonato Europeu – 2017

Catalina se prepara agora para o campeonato mundial em Montreal no Canadá em outubro de 2017 e espera conquistar, na terra em que Nádia se consagrou para o mundo em 1976, o único título que ainda não possui, podendo assim encerrar sua carreira, literalmente, com chave de ouro.

Com a vitória ou não, Catalina certamente nos presenteará com mais um grande exemplo de garra, raça, força de vontade, controle emocional e acima de tudo, superação de grandes desafios para seguir com seu sonho, exercendo a profissão que ama e inspirando milhares de pessoas ao redor do mundo, inclusive a mim.

“HAI CATA !!”

 

FONTES:

http://www.ueg.org/en/welcome.html

http://adevarul.ro/news/sport/catalina-ponor-gimnasta-o-plec-tara-1_50ba01217c42d5a663af3f41/index.html

http://www.fig-gymnastics.com/site/competition/view?id=13465

http://espn.uol.com.br/noticia/265493_com-apoio-de-comaneci-tricampea-olimpica-catalina-ponor-retorna-aos-jogos-apos-oito-anos

http://www.gymblogbrazil.com.br/2017/04/o-peso-da-bandeira-romena.html

https://www.theguardian.com/sport/2016/apr/19/romanian-gymnastics-olympics-failure

https://www.romania-insider.com/romanias-gymnastics-teams-fail-to-qualify-for-the-2016-rio-olympics/

 

 

Redação

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