Treta é a palavra do ano no Brasil, por Xico Sá

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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Foto: Folhapress
 
 
Por Xico Sá
 
No El País
 
Treta é a palavra do ano no Brasil
 
Entro nessa modinha de eleger a palavra do ano. Em um 2017 carregado de denúncias de abuso sexual, justíssima a escolha do pessoal do Merriam-Webster: feminismo. Se ficássemos apenas no episódio Harvey Weinstein já teríamos motivos de sobra. Feminismo neles, digo, em todos nós, se for o caso. E é sempre o caso.
 
O pessoal do Oxford jogou no atrevimento, na “osadia”, como registra o dicionário de baianês, e elegeu “youthquake” –uma junção doidona de juventude com terremoto. A intenção é linda: celebrar o poder da rapaziada guerreira nas mudanças culturais e políticas do planeta.
 
“Youthquake”, cá entre nós na baixaria do boteco, bem poderia ser traduzido como “fogo no rabo” ou “calor na bacurinha” – o Dicionário do Nordeste (Cepe Editora), obra fenomenal de Fred Navarro, que o diga. Na dúvida, escutem o Pastoril do Velho Faceta ou a cantora Maria Alcina sobre o requintado tema.
 
O escritor e jornalista Sérgio Rodrigues, autor de Viva a língua brasileira (Companhia das Letras), apontou retrocesso, em coluna na Folha de S.Paulo, como o vocábulo que define a safra. Ótima escolha, com milhares de fatos e personagens que dispensariam maiores explicações: Donald Trump, Crivella, Dória, MBL, Michel Temer, Bolsominions, Jucá, censura a obras de arte, homofobia, racismo explícito, corrupção à esquerda e à direita, invasão da polícia em universidades, decisões inconstitucionais do STF etc. Tome marcha à ré na história.
 
Este enxerido cronista de costumes mete a mão na cumbuca lexical e escolhe treta como a palavra de 2017 no Brasil. Não a treta dos dicionários oficiais, que significa a destreza e o jogo de cintura na esgrima. A treta na sua concepção mais popular, a treta das letras do rap nacional, a tetra do cabaré da polarização política ou a tretra do cu-de-boi – aqui voltamos ao nordestinês de raiz -, a treta do pega-pra-capar, da fuleragem de Brasília e da muvuca das redes sociais.
 
Treta que o Dicionário informal ainda associa a rolo, desentendimento, mentira, complô, chicana, cilada, emboscada, conspiração, sujeira, malandragem, trama, marmelada, empulhação, velhacaria etc etc. “Rebuceteio”, data vênia, termo da fase de ouro da pornochanchada brasileira, também cairia muito bem nas definições agregadas.
 
Nem sei como coube tanta treta em um só ano. Treta da letra A de assédio a Z de zica. E ainda temos o Natal em família pela frente. Passa o peru, e muito cuidado na noite cristã e no almoço do dia seguinte. Se você acha que o tio reaça já gastou todo o repertório de antipetismo a essa altura, esqueça. Está mais afiado do que nunca. A turma da conspiração esquerdopata, opa, não deixará barato. Treta com a boca cheia de farofa é muito mais instigante.
 
Paz na terra aos homens de boa vontade. Boas festas e até a próxima crônica.
Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

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