Um governo no viaduto e a educação trajando luto, por Felipe Pena

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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Foto: Divulgação
 
Jornal GGN – Por trás do espetáculo da prisão do reitor da UFMG, a Operação da Polícia Federal batizada de “Esperança Equilibrista” não remeteu à Carlitos, mas à ditadura. Uma estratégia de humilhação que “tem como pano de fundo um objetivo maior: o desmonte da universidade pública no país”, descreveu o jornalista Felipe Pena.
 
O artigo faz parte do manifesto publicado pela Diretoria Executiva da Irtecom (Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação), que debateu em reuniões entre os dias 9 e 10 de dezembro os últimos episódios relacionados ao ensino superior brasileiro. Abaixo, reproduzimos o artigo na íntegra:
 
Do Jornal Intercom
 
Um governo no viaduto e a educação trajando luto
 
Por Felipe Pena*
Jornalista, escritor e professor universitário, com doutorado em letras pela PUC e pós-doutorado em semiologia pela Sorbonne III
 

A violência não lembrou Carlitos, lembrou a ditadura. Agentes da policia federal invadiram o campus da UFMG e levaram o reitor. O instrumento utilizado foi o da condução coercitiva, que só pode ser acionado em casos excepcionais de recusa. Mas os agentes não estavam preocupados com a legalidade, apenas com o espetáculo. Um espetáculo semelhante ao que prendeu o reitor da UFSC há três meses, levando-o ao “suicídio” por causa da humilhação.

O título da operação também foi uma violência. Ao batizá-la de esperança equilibrista, a polícia federal sequestrou um dos símbolos da anistia e da própria luta contra a ditadura para reforçar sua estratégia de humilhação. Estratégia que tem como pano de fundo um objetivo maior: o desmonte da universidade pública no país.

Os eventos não são isolados. Juntam-se a eles os cortes de verbas das instituições, a nota oficial do Banco Mundial a favor da privatização das universidades públicas e a demissão de 1.200 professores da Estácio, concebido a partir de uma reforma trabalhista que (agora comprovadamente) destruiu direitos e de uma internacionalização do ensino superior privado que visa a construção de um oligopólio na área.

As ações violentas da polícia federal e o desmonte do ensino universitário gratuito foram promovidos por grupos políticos que se apropriaram do governo brasileiro. O mesmo governo que comanda a polícia, congela gastos sociais e favorece os oligopólios internacionais cuja preocupação com o lucro exclui investimentos na pesquisa e na extensão.

Precisamos reagir ao sequestro semântico de um símbolo político de tantos brasileiros que lutaram pela anistia e deram a vida pela democracia. Brasileiros que partiram no rabo de foguete da ditadura e voltaram com o irmão do Henfil. Brasileiros que não merecem a violência de um governo que se equilibra em um viaduto cujas pilastras já foram corroídas pelo descaso com a educação e por malas de propina que irrigam a quadrilha do Palácio do Planalto.

Se este viaduto não cair, o país está condenado ao luto de sua própria embriaguez.

 

Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

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