Uma história de Fiori e Paulo Freire

É de fato um enorme prazer acompanhar esse debate suscitado pelo artigo de Fiori.

Talvez vcs não saibam, (afinal  essa é uma informação de quem é do campo da educação),  Fiori foi o prefaciador da primeira edição do livro mais importante da obra de Paulo Freire: Pedagogia do Oprimido, lançado em espanhol pela Siglo  XXI, em 1970. Devido a ditadura (ditabrana para a FSP) esse livro só foi editado no Brasil em 1975.

Porém, em 70 mesmo teve sua primeira edição em inglês, lançada nos Estados Unidos, onde foi muito bem recebido pelo pensamento radical americano das universidades mais importantes, como Harvard, entre outras. Em 1973, seu livro já estava na nona edição (cf Palma Fº,1992)  e foi se constituir na obra catalisadora do movimento que produz a ruptura com o paradigma técnico-linear, concebido como uma “peça” técnica e neutra, na  Primeira Conferência sobre Teoria de Currículo, em Nova York , ocorrida nesse ano (cf Jose Luiz Domingues, 1988).

O curioso de tudo isso é que a reforma educacional da ditadura militar aqui no Brasil, foi buscar inspiração nesse paradigma técnico-linear, que estava sendo duramente criticado na matriz, com base nas reflexões de “nosso intelectual orgânico”  Paulo Freire. Diz Palma:

Curiosa e triste ironia essa que a História nos pregou. Exatamente no momento em que, no Brasil, o pensamento educacional oficial se esforçava em adotar nos currículos oficiais o paradigma técnico-linear, através da elaboração pelas Unidades da Federação, dos Guias Curriculares, o citado paradigma começava a ser criticado nos seus fundamentos, e a partir das propostas educacionais de um emérito educador brasileiro, que naquele momento estava impedido de aqui expor suas idéias.(Palma Filho,1992, p.33).

Pois é… como disse meu querido amigo Tomaz Tadeu S (1992), durante muitos anos absorvemos e consumimos, de forma constrangedoramente acrítica, as formulações americanas sobre currículo, mas presunçosamente ignoramos seus desenvolvimentos posteriores.

Retorno ao tema pra dizer que tem, sim, uma certa intectualidade brasileira, mesmo pós-ditadura, que nunca deu ao Paulo Freire o valor e o significado que suas idéias tiveram no mundo todo. Só pra completar, qdo Paulo Freire morreu, em 1997, esse livro já tinha atingido a cifra de um milhão de exemplares em língua inglesa.

Sempre ligado nos movimentos sociais das periferias (do primeiro mundo, America latina e África), ele atualizou sua obra a partir de reflexões sobre/com as revoluções africanas e com a influência das discussões de gênero e ecológicas.

Paulo Freire foi um intelectual original que irritou profundamente um certo pensamento de “alunos forever” não de americanos, mas dos conhecimentos produzidos no primeiro mundo, ou eurocentristas.

Sobre os intelectuais latino-americanos emergentes, Paulo Freire é um exemplo pela coragem de ser sábio (Benjamin diz que a sabedoria é o lado épico da verdade), criativo e envolvido com seu complexo entorno.

Concluindo…

Não sei dizer se há uma revolução em curso ou se o conceito de Kuhn é pertinente ao caso, mas chamaria um outro intelectual tb original e por isso criticado nos meios acadêmicos, Boaventura de Souza Santos, entusiasta dos Fóruns Sociais Mundiais, para evocar a “sociologia das ausências e emergências” para talvez nos ajudar a compreender (e para mim esta é a questão) o que está ocorrendo na America Latina com suas mudanças de ordem econômica, social, cultural, ecológica e políticas e para onde apontam. As teorias estabelecidas de que dispomos dão conta?

Acho que não. E tem uma coisa curiosa q diz o Kuhn. Aquele pensador que pesquisa num paradigma já assentado e reconhecido,  não consegue “ver o real” de fora desse paradigma e está fadado a defendê-lo até o fim.

Luis Nassif

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