Usuários de crack relatam experiência com o programa De Braços Abertos

Jornal GGN – O minidocumentário Noia, realizado pela Agência Pública, traz relatos de usuários de crack que são atendidos pelo programa De Braços Abertos, uma das principais iniciativas da gestão Fernando Haddad (PT) na prefeitura de São Paulo.

Os usuários da droga se concentram no centro da cidade, no trecho da alameda Dino Bueno entre a rua Helvétia e o largo Coração de Jesus. O programa da prefeitura adotou uma abordagem diferente de outras gestões, cadastrando os usuários, levando-os para hotéis da região e oferecendo três refeições ao dia e alocando os beneficiários em frentes de trabalho, com remuneração diária de R$ 15 por um turno de quatro horas.

Leia mais abaixo:

Da Agência Pública

Minidoc: O que pensam os usuários de crack atendidos pelo programa De Braços Abertos

Fomos ouvir o que têm a dizer sobre o programa da prefeitura de São Paulo aqueles que mais entendem dele

Centro de São Paulo, região da Luz. O alvo de uma das maiores polêmicas da cidade, que já permeia várias administrações e campanhas eleitorais, se concentra em apenas um quarteirão de cerca de 100 metros de extensão, no trecho da alameda Dino Bueno entre a rua Helvétia e o largo Coração de Jesus. É ali que se localiza o “fluxo” – um aglomerado de usuários e vendedores de crack que chega a reunir cerca de 500 pessoas.

Nossa reportagem passou cerca de um mês no local para produzir o minidoc Noia, agraciado no 8o Chamado Público do Núcleo de Jornalismo do Canal Futura.

Contrariando a ideia geral que classifica os usuários como “zumbis”, a reportagem compreendeu que o fluxo está em constante movimento. No meio da rua ficam as barracas de venda da droga – carros não passam. Nas calçadas os usuários consomem o que acabaram de comprar. O movimento é contínuo: usuários vão até a rua, compram a pedra, voltam para a calçada, consomem, entram de novo, compram mais, voltam para a calçada. Tudo é trocado, oferecido, pedido, num escambo contínuo: “Quem troca um maço de cigarro numa bermuda?”, “Quem tem um isqueiro pra trocar num cachimbo novo?” – as pessoas gritam.

Música constante, de vários radinhos e mp3 players, e às vezes dos alto-falantes levados pelas igrejas que visitam a região. Roupas malucas, estilosas, esfarrapadas. As roupas também são trocadas, o gorro colorido que estava na cabeça do cara com quem você conversou hoje de manhã estará na cabeça de uma mocinha à tarde. Pertences espalhados, roupas, esmaltes, livros, todo tipo de objeto pessoal. Cheiro de fritura vindo dos pequenos bares, cheiro de crack; muita poeira, o ar seco, cheiro de mijo velho e de todas as sujeiras possíveis. Cerveja, pinga, maconha, cigarros, tosses carregadas, risadas, gritaria, algumas brigas; eventualmente um choro. É uma balada – não esqueça isso: em algum canto daquilo tudo, é uma espécie de festa. Afinal as pessoas estão se drogando. Como definiu o amigo Clerouak, da turma da Casa Rodante, que realiza ações culturais dentro da ótica de redução de danos, “a cracolândia é o Woodstock do fim do mundo”.

Numa esquina do fluxo, fica uma base da Polícia Militar; na outra esquina, uma grande tenda da Guarda Civil. Na rua adjacente, o imponente prédio do Recomeço, programa de assistência do governo do estado que oferece tratamento médico para a dependência química; à frente dele, a tenda do programa De Braços Abertos, da prefeitura de São Paulo. E o fluxo segue.

O programa

O programa De Braços Abertos foi implantado em 2014 pela prefeitura de Fernando Haddad, após o desmonte da chamada “favelinha da cracolândia”. Na época, usuários moravam em 150 barracos que ocupavam a Helvétia e a Dino Bueno. Segundo a prefeitura, foi feito um acordo com esses moradores, que foram cadastrados e encaminhados para moradia em sete hotéis da região. Hoje são cerca de 450 beneficiários que, além da moradia nos hotéis, recebem três refeições diárias, oferecidas por meio de convênio com a rede de restaurantes do governo do estado Bom Prato. Além disso, os beneficiários são alocados em frentes de trabalho, nas quais recebem remuneração diária de R$ 15 por um turno de quatro horas (em funções de jardinagem ou varrição) ou frequência nas oficinas de capacitação (cabeleireiro, artesanato, artes, mecânica, entre outras). O pagamento é semanal, às sextas-feiras.

Críticos do programa – como a vereadora Soninha Francine, que, nomeada secretária de Assistência e Desenvolvimento Social da próxima gestão municipal, deverá lidar diretamente com a questão a partir de janeiro – argumentam que oferecer dinheiro vivo para dependentes químicos é incentivar o consumo da droga. Os idealizadores defendem que a remuneração faz parte do “pacote de direitos” (moradia, alimentação, trabalho e renda) que permite a pessoas em situação de “vulnerabilidade extrema” resgatar sua cidadania, o que seria o primeiro passo para sair da dependência química. Opositores mais ferrenhos consideram que o programa utiliza dinheiro público para “sustentar viciados”. O orçamento anual do programa é de aproximadamente R$ 12 milhões, contra R$ 80 milhões do estadual Recomeço. Especialistas em políticas públicas, dependência química, psiquiatras, médicos, gestores – todos se digladiam na polêmica. Mas, afinal, o que pensam os usuários?

Desta pergunta nasceu o documentário Noia. Assista:

Redação

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