Vidas paralelas degradadas e degradantes: Dias Toffoli e Jair Bolsonaro, por Fábio de Oliveira Ribeiro

A ciência deveria ser uma ferramenta governamental e não é. Os princípios constitucionais do Direito Penal não poderiam ser e foram degradados por razões políticas

O presidente Jair Bolsonaro recebe o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Dias Toffoli, no Palácio da Alvorada. Foto: Agência Brasil

Jair Bolsonaro disse que é preciso fazer cocô uma vez a cada dois dias para preservar o meio-ambiente. Dias Toffoli confirmou que manteve Lula preso para garantir o mandato de Bolsonaro. Essas duas notícias resumem de maneira perfeita a tragédia brasileira.

O presidente da República ignora que cocô é biodegradável. O presidente do STF deveria saber que nenhum juiz pode negociar os direitos indisponíveis de qualquer réu.

A ciência deveria ser uma ferramenta governamental e não é. Os princípios constitucionais do Direito Penal não poderiam ser e foram degradados por razões políticas.

Não há diferença qualitativa entre a frase de Bolsonaro e a decisão de Dias Toffoli. Ambas são absolutamente grotescas. Todavia, se fossemos obrigados a hierarquiza-las, a decisão do presidente do STF deveria causar mais horror que a frase do presidente da república.

A ciência não deixa de ser ciência porque é ignorada. Mas o Direito perde totalmente sua substância quando se transforma num simulacro por razões políticas.

Imediatamente após Bolsonaro enunciar sua frase, Lourdes Nassif publicou o seguinte no Facebook:

Desobediência civil: vou cagar todo dia!

A frase grotesca de Bolsonaro revela a impotência política transitória da ciência. A brincadeira da blogueira exemplifica o poder do humor num ambiente político poluído pela ignorância. Todavia, Lourdes Nassif disse algo muito mais profundo: nenhum ditador é capaz de controlar a consciência e a natureza humana. O que nos leva à uma pergunta inevitável:

Como devemos julgar um juiz que foi capaz de trocar aquilo que não é dele (o direito à liberdade de Lula) para salvar o que foi outorgado a outro (o mandato presidencial de Bolsonaro) exercendo uma competência que não lhe foi atribuída pelo sistema constitucional?

A violência cometida por Dias Toffoli contra o Direito (e provavelmente contra sua própria consciência) foi inenarrável. O presidente do STF conseguiu desobedecer três princípios fundamentais da CF/88: o que separa o Judiciário do Legislativo; o que define a competência privativa do Legislativo e limita a do Judiciário; o que impede o agente público de utilizar seu cargo para deliberadamente prejudicar o exercício de direitos que foram outorgados aos cidadãos pela constituição federal.

É possível desobedecer civilmente uma tirania que nos manda evacuar uma vez a cada dois dias. Como a vítima poderia se insurgir contra uma decisão ilegal e imoral tomada por um juiz que fez o que não deveria com ela para salvar o mandato do tirano? Essa é uma pergunta que deveria ser feita ao presidente do STF.

As palavras de Bolsonaro não significam nada. As de Dias Toffoli significam tudo aquilo que nós deveríamos temer. Entretanto, uma parcela considerável da imprensa deu mais importância à grosseria presidencial do que à escatologia judiciária.

O estrago que o presidente do STF fez ao Direito será profundo, permanente e duradouro. Amanhã mesmo Bolsonaro falará outra besteira que nos fará esquecer a bobagem que ele falou ontem.

Fábio de Oliveira Ribeiro

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