“Velho Keynesianismo” vs. “Novo keynesianismo” sobre o efeito da política monetária, por Tracy Mott

‘O espaço que as taxas de juros têm de afetar o investimento é muito pequeno. Ciclos de gastos com investimentos vêm de interações entre investimentos, lucros, produção nacional, capacidade e dívida’

Foto: AFP

Jornal GGN – Há uma tese defendida por parte dos economistas, entre eles Michał Kalecki, de que o “princípio de aumento de riscos” está na relação entre a demanda esperada e o percentual de investimentos advindos da riqueza própria no projeto.

Em outras palavras, o limite para gastos com investimentos deve ser calculado considerando, percentualmente, quanto de riquezas próprias devem ser colocadas no projeto e a demanda esperada pelo uso da capacidade produtiva.

“Isso reduz o papel do custo financeiro sob a forma de juros em relação ao da quantidade de financiamento disponível na forma de lucros acumulados, afetando os gastos com investimentos em negócios”, escreve Tracy Mott em um artigo onde analisa os argumentos do “velho keynesianismo” e do “novo keynesianismo”.

Outro economista com visão semelhante a de Kalecki é Hyman Minsky. Ele observa que os compromissos com as dívidas pendentes em relação ao fluxo de caixa, afetam a fragilidade financeira e, consequentemente, as despesas de investimento.

Aqui vale explicar um conceito: todo o dinheiro que sai de uma empresa com a expectativa de aumentar lucros é um investimento. Porém, assim como desembolsos classificados como despesas e custos, o investimento também é um gasto que precisa ser avaliado. Essa lógica também é pensada na discussão em torno dos gastos da máquina pública e do papel do Estado para superar o desemprego.

Tracy Mott abre seu artigo falando dos economistas Kalecki e Minsky para responder a um outro artigo, assinado por Lawrence Summers e Anna Stansbury (2019). Esses dois últimos repudiam a ortodoxia econômica especificamente no ponto de que os cortes nas taxas de juros são suficientes para restaurar o pleno emprego, propondo uma análise “original” do keynesianismo, que Mott destaca que já foi realizada por Kalecki e Minsky.

“Summers e Stansbury argumentam que também a quantidade de ativos sensíveis a juros pode não ser suficiente para que uma política de redução de taxas supere o desemprego. As idéias de Kalecki e Minsky reforçam isso tremendamente”, avalia Mott.

“Preocupados com a explicação da extraordinária ineficácia dos instrumentos monetários usuais, Summers e Stansbury falam sobre a mudança de um tipo de keynesianismo que baseia o desemprego em rigidez de preços (“Novo Keynesianismo”) para um keynesianismo baseado em insuficiências agregadas de demanda (“Velho Keynesianismo”). ou as idéias da Teoria Geral de Keynes). É disso que trata a estrutura de Kalecki-Minsky”, prossegue Mott.

“Para o próprio Keynes, na Teoria Geral, o ponto principal é que a tentativa de economizar não resulta automaticamente em gastos de investimento. Mas, se a baixa demanda agregada ou a política monetária facilitarem a queda das taxas de juros, não obteríamos investimento suficiente para ter pleno emprego? Keynes discute o fracasso da política monetária ou a intransigência dos especuladores em permitir que as taxas de juros de longo prazo caiam o suficiente”, continua o articulista.

Mas aí tem a questão da moeda. “Como a manutenção da moeda é cara, descobrimos que os detentores de riqueza permitirão algum grau de negatividade nas taxas de juros. Em algum momento, no entanto, eles certamente descobrirão uma maneira de armazenar moeda a um custo menor do que receber juros severamente negativos sobre essas participações. Kenneth Rogoff (2017) propôs que a eliminação da moeda permitiria que as taxas de juros atingissem qualquer taxa negativa necessária para nos dar pleno emprego. No entanto, algum outro ativo com baixo custo de transporte provavelmente surgiria para evitar taxas de juros extremamente baixas”, completa.

“A idéia de que a rigidez era necessária para o desemprego em uma estrutura keynesiana veio de A.C. Pigou (1943) e seu efeito da deflação no aumento do consumo. Em um artigo publicado no ano seguinte, a Pigeck´s Kalecki (1990 [1944]) mostrou que isso não fazia sentido. Os últimos 30 anos da economia japonesa também revelam a implausibilidade do funcionamento do “efeito Pigou”. No entanto, a “síntese neoclássico-keynesiana”, dizia que permitir o equilíbrio a longo prazo resulta no pleno emprego.”

Mott destaca que a teoria conhecida como “Novo Keynesianismo” difere da “síntese neoclássico-keynesiana”, apoiando-se na ideia de que às austeridades deram resultados “Keynesianos” quando, por exemplo, apelaram que os custos de mudança de preço fossem maiores do que as vantagens de mudar de preço quando a demanda muda.

“Para Keynes, na teoria geral, o investimento mais o consumo não fornece demanda agregada suficiente para dar pleno emprego. A queda dos salários em dinheiro não aumentaria a taxa de emprego, mas simplesmente reduziria os preços proporcionalmente. O único benefício para a demanda agregada seriam os preços mais baixos, diminuindo a demanda por dinheiro para fins transacionais e, portanto, ceteris paribus [todo o resto constante], taxas de juros. Preços mais baixos, no entanto, aumentariam o ônus da dívida, diminuindo a demanda agregada”, explica.

“Em uma estrutura de Kalecki-Minsky, e conforme descrito por Joseph Steindl (1976 [1952]), o investimento por unidade de capacidade produtiva é uma função dos lucros retidos por unidade de capacidade produtiva, da produção nacional por unidade de capacidade produtiva (utilização da capacidade), serviço da dívida por unidade de capacidade produtiva e taxas de juros (Fazzari e Mott, 1996-97)”.

“Os ciclos de gastos com investimentos vêm das interações entre investimento, lucros retidos, produção nacional, capacidade e dívida. Portanto, o espaço que as taxas de juros têm de afetar o investimento das empresas é muito pequeno”, pontua o economista Mott.

“O consumo é amplamente determinado pelo nível da renda real, que deve subir e descer com o investimento. As mudanças nas taxas de juros afetam de maneira semelhante os gastos com imóveis e bens de consumo duráveis. Enquanto esse canal funcionar bem, a política monetária poderá influenciar a economia, interrompendo uma subida ou revirando a marcha depois de um tempo”.

“Como Minsky apontou, ao longo do tempo, a dívida das famílias pode se acumular, pois o aumento das taxas para desacelerar uma economia inflacionária provavelmente não irá restringir o crescimento da dívida o suficiente para compensar seu crescimento quando as taxas forem reduzidas para estimular empréstimos a gastarem em habitação e bens de consumo duráveis ​​(Mott, 2002). Logo mais, chegaremos a um período como 2007, em que a redução das taxas não será suficiente por causa de muitas dívidas pendentes”, conclui.

*Clique aqui para ler seu artigo na íntegra.

Redação

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