A mídia e o Quarto Poder, por Rogério Mattos

A mídia e o Quarto Poder, por Rogério Mattos

Teria Paulo Henrique Amorim traduzido em livro um antigo thriller hollywoodiano?

Falam que a mídia é o Quarto Poder, mas o que deveria ser esse “quarto poder” no país seria a Constituição, por cima dos outros três poderes. Como a Constituição não foi regulamentada na maioria de seus dispositivos, a mídia toma seu lugar e, se não cria a regulamentação, gera a jurisprudência, o entendimento. Atualmente há um encontro, talvez inesperado, entre a chamada “mídia progressista” e a “mídia conservadora”, ambas a favor do Golpe. O que muda é o grau de cinismo e a multiplicação da desinformação.

Por causa da minha última publicação, um tanto extensa, tive que resumi-la em algumas poucas palavras para poder fazer com que a mensagem consiga chegar de maneira mais adequada às pessoas. Realmente é um dilema o fato de ou se fazer uma análise mais sumária, mais própria para a internet, e publicar de maneira fragmentada minhas ideias, ou fazer um estudo compreensivo, um pouco maior, que de texto chega de 5 a 10 páginas. Mas isso é incontornável: 5 páginas é um sacrilégio para um número muito grande de pessoas. Se o texto ainda propõe um trabalho detetivesco, de ligar as diversas evidências que vão sendo acumuladas, o trabalho parece em vão.

O que quis dizer com a Teoria do Domínio da Mídia, pode ser resumido assim: falam que a mídia é o Quarto Poder, mas o que deveria ser esse quarto poder no país seria a Constituição, por cima dos outros três poderes. Como a Constituição não foi regulamentada na maioria de seus dispositivos, a mídia toma seu lugar e, se não cria a regulamentação, gera a jurisprudência, o entendimento.

Um ponto tem que ser destacado: o primeiro golpe parlamentar que sofremos foi durante o primeiro mandato de FHC. Por causa da maioria de deputados e senadores que conseguiu (fora o episódio posterior, o da compra de votos, nunca investigado) e com o apoio da mídia, estuprou a Constituição e vendeu todas as riquezas do subsolo do país, cláusula pétrea da nossa lei maior. Igualzinho em 2016 e para atender os mesmos interesses.

FIM

Se eu puder dizer um pouco mais: Essa mídia que cria os dispositivos legais – é um poder fático – ela opera atualmente, para retirar de Lula seu direito de concorrer livremente nas eleições. Há um encontro, talvez inesperado, entre a chamada “mídia progressista” e a “mídia conservadora”. A quantidade de formadores de opinião que descartam a luta política de Lula é gigantesca. Inclusive Merval Pereira ratificou recentemente a opinião dos outrora “blogs sujos”. Falta só proporem ao Lula o acordão do STF, patrocinado pelo Gilmar, para que Lula retire sua candidatura e assim tenha sua vida facilitada nas instâncias superiores. Seria o mínimo gesto de piedade daqueles que já o descartaram, e de hombridade, por levarem sua postura até as últimas consequências morais. Mas o cinismo ainda fala mais alto.

Só para fechar: no post em questão, fiz uma longa análise sobre o perspectivismo, até para caracterizar o objetivo do que estava escrevendo, ou seja, relatar o que era a “teoria do domínio da mídia”. Hoje, uma reedição à esquerda da antiga teoria do domínio do fato. Terei que fazer um post em separado para que isso seja devidamente esclarecido. No mais, acredito que essa breve explicação, acrescido do abundante material factual que existe no texto original, é o suficiente para sanar as dúvidas mais urgentes. Em suma, foi uma crítica à série do Xadrez, escrita pelo Luís Nassif, e que em seu ponto mais básico demonstrava como essa “paixão cirista” é muito anterior à prisão do Lula, e como, em última análise (como no “xadrez do fim do mundo”), a descrença na luta real, na luta contra o golpe continuado, é força de negação da vida, um dos modos do niilismo.

O PSDB patrocinou o primeiro golpe em nossa Constituição e foi o avalista e o maior beneficiário do segundo golpe. Agora, são eles e seus aliados (por exemplo, veja que Moro e ministros supremos gostam de tucanos e não de políticos “regionais”) dão continuidade ao golpe. Existe um candidato agora que critica a oposição ferrenha do PT ao PSDB, e quer ser o serviçal de ambos. Critica o PMDB e põe panos quentes nos candidatos tucanos, inclusive com elogios a Alckmin. O que são os tucanos? A ala de desnacionalização de nossa economia, de produção da miséria, do caos social e da recessão. O PMDB (desculpe se escrevo do modo antigo) está interessado em seus interesses mais imediatos, pessoais, e não se importa tanto com um governo entreguista ou não. O importante é fazer da política uma extensão de seus empreendimentos individuais. Criticar o PMDB pelo golpe, ou só esse partido, sem considerar que são tucanos quem mandam no país, gerindo toda área econômica, é rebaixar o debate político. Sem uma oposição forte e persistente contra todo e qualquer político ou política tucana nunca se fará política honesta em nosso país.

Uma nota: aí você imagina uma empresa do tamanho da Petrobras, na década de 1990, restrita à bacia de Campos. Um dos motivos era para não investir em novas tecnologias – caras e arriscadas. O outro era abrir espaço para as empresas estrangeiras. Um Estado corruptor, associado a agentes estrangeiros, que fez uma empresa do tamanho da Petrobras ser administrada como um pequeno negócio.

Diante desse quadro, dá para se imaginar o cenário onde foi criado alguns dos sistemas de corrupção internos da empresa, como alertaram vários delatores, sempre apontando que tudo começou na década de 90 e não em 2003. Essa mesma empresa, depois da descoberta do pré-sal, e dos preparativos que a levaram a isso, muda de figura. Você tem um senso de missão nacional muito maior, com a empresa trabalhando em favor do desenvolvimento do país, assim como, por causa da multiplicação de riquezas e de sua projeção internacional, estará sob os olhos do mundo. Caso a Petrobras continuasse seu processo de desenvolvimento autônomo, os arcaicos esquemas de corrupção tenderiam a sumir. Qualquer lugar, é claro, está sujeito aos desvios humanos. A isso se chama risco operacional. O que não se pode é agir na agenda utópica de eliminar completamente esse risco. Não falo de eliminar a corrupção como um todo, mas o próprio risco, que de uma maneira ou outra, sempre existirá. Você tem que aprimorar os mecanismos de detecção dos desvios, ainda mais numa economia crescente. E os mecanismos de corrupção tem que valer tanto para o setor público quanto para o privado. Caso contrário, não valerá nem para um nem para outro. No caso atual, a Petrobras continua mais corrupta do que nunca, dando de bandeja a estrangeiros mais de 1 trilhão de reais em isenção de impostos, ou os meros 10 bilhões para os gulosos acionistas de Wall Street. E isso tudo por meros atos administrativos!

A corrupção que houve na Petrobras, montada nos governos tucanos, é mais um indicativo de como esse modo de governar deles faz proliferar as más práticas. Não há acordo com um possível governo de origem tucana, que virou a ficha, e agora acaricia com mais liberdade, na verdade com certa “liberalidade”, aqueles que lhe deram vida política.

O fator Estrella: minutos depois de noticiado entre o governo (não ainda na mídia) a perda de uma bloco de exploração de petróleo para a empresa Devon, a então ministra Dilma Rousseff liga para Gabriel Estrella e diz: “Dr. Estrella, estou sabendo que o senhor perdeu um bloco. Tudo bem, você tem suas explicações, mas deixa para depois. O que eu quero dizer é o seguinte: ESSE FATO NÃO SE REPETIRÁ”. A proposta da Petrobras não era tão interessante, porque a política de conteúdo nacional já estava em andamento e a empresa estrangeira ofereceu 100% de conteúdo nacional, ao contrário dos 65% oferecidos pela Petrobras. Depois isso seria negociado, etc., a empresa provavelmente rebaixaria ao máximo a exigência acertada em contrato, etc. Isso foi em 2003. O que existe aí: um quadro técnico da empresa ainda não ciente das possibilidades políticas de uso da empresa em favor de seu crescimento. A palavra do Executivo, na atuação ostensiva da ministra, foi fundamental para mudar a mentalidade de alguém que, com toda a dedicação ao país e a empresa, ainda se via limitado em tomar uma atitude mais drástica em favor de seus próprios interesses patrióticos. Isso é um exemplo de uma pessoal notável, chamado de “o pai do pré-sal” e que mesmo assim, diante das políticas de descalabro nos 90 por sobre a empresa, mantinha seus melhores quadros acuados. Não existe ambiente melhor para se proliferar a pequena corrupção, como as de Cerveró, Paulo Roberto Costa, Renato Duque e todos os outros. Sem contar a corrupção grossa vinda do executivo, do crime de lesa pátria, da venda de ativos que são protegidos pelas cláusulas pétreas da Constituição, e que é a geradora de toda esses pequenos atos egoístas que foram caracterizados, cinicamente, como o maior escândalo da história do país – a partir de 2003.

Recomendo o vídeo do site Tutaméia. Ele é excelente não apenas pela qualidade do entrevistado e dos entrevistadores, mas por permitir, em duas longas horas, Estrella discorrer livremente sobre inúmeros aspectos da história da empresa que com muita dificuldade encontraríamos em outro lugar.

Rogério Mattos: Professor e tradutor da revista Executive Intelligence Review. Formado em História (UERJ) e doutorando em Literatura Comparada (UFF). Mantém o site http://www.oabertinho.com.br, onde publica alguns de seus escritos.

Redação

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