Aliança com Maia, ok, mas para quê?, por Álvaro Nascimento

Aliança com Maia, ok, mas para quê?

por Álvaro Nascimento

Quem me acompanha aqui e fora daqui sabe que, desde a subida do Verme ao poder, sou ferrenho defensor de uma aliança antifascista. Não sou daqueles que defendam disputar para marcar uma posição apenas superficialmente mais combativa, perder, colocar a cabeça no travesseiro tendo orgasmos à esquerda e achar normal o País seguir ladeira abaixo.

Mas não é concebível aceitar – sem a fixação de compromissos mínimos na direção da defesa dos interesses do País e de nosso povo – a anunciada adesão, ontem, entre quatro partidos de oposição (PT, PCdoB, PSB e PDT, enquanto PSOL ainda avalia o que fazer) ao candidato (que ainda não existe) a ser indicado pelo bloco de Rodrigo Maia (DEM-RJ) à Presidência da Câmara dos Deputados.

Se há algo que deveria ainda restar ao pensamento progressista (nem digo pensamento socialista), aqui e alhures, é ter nas reais transformações sociais, políticas, econômicas e culturais o objetivo central de qualquer passo dado na seara política. E quais são os compromissos desta aliança? Aparentemente nenhum além de derrotar o candidato de Bolsonaro à Presidência da Câmara dos Deputados, mantendo o poder nas mãos de quem o tem, hoje. E antes que digam que isso “não é pouca coisa”, vamos às contas?

O grupo de Maia tem 6 partidos (PSL, PSDB, MDB, DEM, Cidadania e PV). Somados, têm 146 votos na Câmara. Teoricamente (pois o voto é secreto e sempre poderá haver defecções) faltaria a Maia 111 votos para chegar aos 257 necessários (metade mais um dos 513 deputados) para eleger o futuro Presidente da Câmara. Ora, se a oposição somada (incluindo os 10 deputados e deputadas do PSOL) têm 132 votos (quase o mesmo número de Rodrigo Maia, portanto, que teria, sem defecções, 146) porque não exigir, na eventual aliança, compromissos mínimos em relação, por exemplo, a votações que garantam vacina para todos os brasileiros, fim da permanente retirada de direitos sociais e até mesmo abertura de processo de impeachment caso o Governo Bolsonaro siga promovendo o verdadeiro holocausto da população com seu negacionismo no enfrentamento da pandemia? Vejam bem, são pontos mínimos a que qualquer verdadeiro democrata teria obrigação de abraçar.

Ao contrário disso, o documento do novo bloco de apoio a Maia sustenta afirmações, se referindo à última gestão da Presidência da Câmara, como tendo sido “uma fortaleza da democracia no Brasil; o território da liberdade; exemplo de respeito e empatia com milhões de cidadãos brasileiros”. Mais, que na Câmara “celebramos a luz” enquanto “uns se encontravam nas trevas”. Afirma, ainda, que “nos fortalecemos na diferença, no respeito às instituições e na liberdade”. O máximo de compromisso existente na carta se consegue identificar na promessa de que a Câmara “será livre para defender e aprofundar a nossa democracia, preservando nosso compromisso com o desenvolvimento do País”.

Comparada às dezenas de medidas ali votadas nos últimos anos, em particular desde o impeachment de 2016, contra os interesses do país e que afrontavam direitos sociais, convenhamos que a afirmação de que a Câmara dos Deputados tem sido “uma fortaleza da democracia no Brasil; o território da liberdade” parece piada (sem nenhuma graça, aliás).

Derrotar Bolsonaro, seus seguidores e sua base (esteja aonde estiverem) deve ser – sem nenhuma sombra de dúvida – compromisso de todos os democratas. Mas se não é hora de esquerdismos infantis via “candidatura pura” que viabilizem maior domínio do Verme sobre o parlamento, por outro lado já passou da hora de uma oposição (repito, que contabiliza cerca de metade dos votos necessários à disputa) arrancar compromissos mínimos que efetivamente tragam benefícios reais ao País e à população.

Sem estes compromissos CONCRETOS, PÚBLICOS E TRANSPARENTES, plenamente possíveis para quem se diz “exemplo de respeito e empatia com milhões de cidadãos brasileiros”, seguiremos tendo um arremedo de parlamento que apenas se autoproclama “fortaleza da democracia” e “território da liberdade”, termos que se chocam com a triste realidade hoje vivida por nossa gente e nosso País.

Álvaro Nascimento – jornalista.

Redação

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  • Ora, tá na nossas fuças, o principal partido de "oposição", por tudo que temos visto, se tornou liberal, depois eu que tenho que ficar marcando passo numa agenda única, lula livre, que é justa, mas não é única, vá vá vá, centro por centro, já estou com Ciro, desde a última eleição, já que, no meu entender, teríamos alguma chame, porque que só o pt pode ser pragmático?!

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