As liminares e o happy end
por Fabianna Pepeu
Sobrou uma ressaca danada porque estamos sendo ingênuos em acreditar que essa estrutura tem brecha para um processo de redemocratização.
Lembrei de um trechinho de uma canção dos anos 1980 que insinuava posições mais drásticas porque, às vezes, sinto-me meio ‘tripolar’ entre a promoção do embate violento, a perspectiva espiritual mais profunda e a ausência silenciosa.
É dolorida essa sensação de mãos atadas e da exposição às cenas bizarras. Há essa avalanche de notas diárias que nos remetem sempre ao teatro do absurdo, mas com uma dose cavalar de perversão.
Não tenho medo. Tive um pouco, mas ele meio passou com a solidariedade que surgiu ali um pouco antes do segundo turno. Mas sinto uma grande exaustão, porque o processo exige muito da cabeça, do corpo e há muita energia psíquica envolvida. Sem falar que tem também os nossos dramas individuais cotidianos que nem sempre damos conta tão bem.
Acho pouco provável que exista no Brasil, hoje, uma única pessoa minimamente atenta que não sinta essa mesma sensação de cansaço profundo.
Esses momentos de possível felicidade que surgem, com violência interrompidos, desorganizam o que já andava aos sobressaltos dentro da gente.
Nós somos nós e a vida do território que habitamos. Não há muitas maneiras de nosso corpo e nossa alma também não estarem ansiosos com a iminência de uma liberdade que se insinua apenas para nos deixar com esse desejo na ponta da língua – como quando alguém nos nega um beijo em jogos de amor.
Esse afastamento da liberdade e do rascunho do amor, mesmo que precário e ainda muito distante do que sonhamos, causa uma imensa tristeza no meu coração.
Desde cedo, flertando e alterando Manoel de Barros (quanta pretensão com um poeta inigualável!), nasci fraca para essas coisinhas dos sentimentos.
Por mais demodê que seja, e a própria expressão demodê ninguém usa mais, sou dessas românticas inveteradas com fixação na possibilidade de uma reviravolta mirabolante que desaguasse em um supimpa happy end como naqueles filmes americanos natalinos.
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…ou, a espera com a tristeza nas mãos…
Tão humano o seu texto, Fabianna. Tem a coragem e a originalidade de abordar sensações que são epidêmicas – têm que ser, ou não seríamos normais… – mas que quase todos os articulistas evitam falar sobre, porque soa “piegas”, talvez? Ou por não caber assumirmos as nossas fraquezas em tempos tão absurdos?
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Esse trecho do seu texto sintetiza, acredito eu, o sentir de muita gente:
“Lembrei de um trechinho de uma canção dos anos 1980 que insinuava posições mais drásticas porque, às vezes, sinto-me meio ‘tripolar’ entre a promoção do embate violento, a perspectiva espiritual mais profunda e a ausência silenciosa.”
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Porque nos lembraríamos dessa canção se enxergássemos com a razão indícios de uma solução normal, civilizada, para todo o horror que hoje vivenciamos? É a lucidez, a consciência e/ou a intuição de que não há saída aparente, que eles e sua selvageria abrangente vieram para ficar, que nos desespera! “O que fazer?”, geme um coração aflito, inconformado, grita uma mente perplexa e indignada….. E não encontramos “a” resposta, apenas esses fragmentos de ideias e sentimentos que dançam um balé doido em nossas cabeças….. “O embate violento, a perspectiva espiritual profunda, ou a ausência silenciosa…?” – o que será mais “legítimo”, e/ou humano, ou, o que “a nossa perna alcança fazer/caminhar…?”
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No seu texto, tradução perfeita para esse tempo de exceção, essa frase é uma síntese “de pedra”, realidade pura….
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“É dolorida essa sensação de mãos atadas e da exposição às cenas bizarras. Há essa avalanche de notas diárias que nos remetem sempre ao teatro do absurdo, mas com uma dose cavalar de perversão.”
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E lembro essa sensação de mãos atadas quando em nome da família e de “Deus”, canalhas proclamavam sua decência ao votarem no impeachment de nossa presidente, só para citar um exemplo, é como você disse, uma avalanche de eventos tão sórdidos e surreais que a mente quase que se recusa a aceitar tanta coisa nonsense como realidade.
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Resta então essa exaustão que você assume, reconhece, e diz a todos nós que talvez seja a única “coisa normal” no tal teatro de absurdos, ou o “mundo-matrix à brasileira”, que gosto de citar como sendo o nosso atual tempo/espaço de viver.
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Restam os afetos, as coisas que nos humanizam, a solidariedade, a busca – por penosa que seja e aparentemente inútil que pareça… – por algum meio de luta concreto contra um Estado que foi tomado por poderes absolutistas, perversos, onde cada brecha para a esperança é eliminada de modo cortante.
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Talvez, e nem sei se isso é “válido”, o heroísmo nosso de cada dia se resuma a isso: sobrevivermos com nossas humanidades todas intactas, talvez seja um tempo de espera com as mãos cheias de tristeza.
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Um abraço!!!!
O país foi assacar por
O país foi assacar por lojistas…..
Ou acreditam que os verdes, empresários, essa maldita casta encastelada na administração, políticos notoriamente podres e blindados, se reuniram num boteco e combinaram esse golpe?
A malta reuniu-se contra o povo…o único ponto que concordo com certos professores que atacam o PT é o da organização popular….
Se o povo não se organizar contra essa associação que lhe rouba direitos, surrupia garantias e pilha o país, esqueçam…….
Iremos claudicando, de retrocesso em retrocesso, até a situação ficar incontrolável……………….
E sim, já estão armando para taxar qualquer ajuntamento popular de terrorismo, porque estamos num estado de exceção, e é com repressão violenta que isso se mantém….
Tempos estranhos……..mas já vividos…..
Lindo texto. Muito sensível
Lindo texto. Muito sensível também, extremamente; sobretudo nestes tempos em que, parece, sensibilidade é coisa demodê. Mas o bom da moda é que as modas sempre voltam; renovadas e com mais força.
No mais, acredito que há sabedoria em abrir o coração e expor suas dores; mas também há sabedoria na entrega, na renúncia, no silêncio; acredito que a inação não é desistência, é inverno. Como prega o Budismo, a renúncia (nges-‘byung), a determinação de ser livre não apenas de algumas formas de sofrimento, mas também das suas causas, envolve muita vontade e requer grande coragem. Exige uma atitude realista sobre como o progresso ocorre, pois este nunca é um processo linear, em que as coisas estão sempre a melhorar. Com uma perspectiva a longo prazo – às vezes parece longuíssimo! – podemos ver o progresso, mas no dia a dia os fatos e nossos humores vão continuar aos altos e baixos.
É preciso, então, disciplina e paciência para tolerar as dificuldades do caminho. Criarmos fortaleza, perseverança, encontrarmos alguns simples prazeres e contentamentos são fundamentais para continuarmos apesar dos altos e baixos.
Força para todo mundo. Ótimas festas!
‘Cadê o Queiroz?’
Perfeito retrato do momento, porém à passagem lenta e natural do sentimento, curando as feridas abertas que dilaceram, não podemos deixar de perceber que na dita tripolaridade restante, duas são fugas individuais, tudo o que mais desejam com essas ações para apressar o retorno do Brasil à colônia, pois temem a força idealista coletiva e o simbolo que a representa e une: Lula.
Resta, recolher os ‘cacos’, reativar à inteligência o ideal democrático e do bem comum e perseverar na luta, não na burra do confronto fisico de forças, mas no confronto do esgarçar e da fadiga do inimigo, assimétrica e letal, com muita paciência, sagacidade política e persistência estratégica.
Ontem, apesar do sentimento final de derrota, à realidade da luta que travamos, foi uma tremenda vitória, graças a inesperada e corajosa manobra feita por Marco Antonio de Mello, que obrigou-os revelarem a estratégia da ‘aparência legal’ do golpe de maneira irreversível e insofismável, a todos, escancarando basear-se em camuflar e confundir, com o funcionamento das instituições, ditas ‘democraticas’ e que ontem foram de vez implodidas, ao vivo e a cores, sem falar a confissão do pavor que tem de ‘Lula Livre’, com direito até a conferência das ‘forças de ocupação’.
Pouco importa, agora não dá para impedir, o gigantesco esforço midiático feito para transformar o tremendo estrago em vitória, dominando a narrativa, pois sabem e sabemos que, por mais que caprichem, ontem mais cidadãos passaram a enxergar o jogo a que se destina e reforçou-se a visão de grande parte da população em relação ao futuro do Brasil, com essa ‘gente de bem’ à força no poder: o atraso.
Na seara institucional jurídica, terminou a batalha, pois provou-se depois de longo confronto jurídico-político-midiático que ela não existe de fato, como de direito e portanto não há Justiça atualmente no Brasil, pelo simples fato que a Constituição não é respeitada, é interpretada seletivamente conforme necessidades pelos que detem o poder à força, inclusive para serem ‘eleitos’, conforme a estratégia da ‘aparência legal’.
Agora é chegado o momento de iniciar-se a próxima batalha, no campo da assimetria, começando por Lula reafirmar-se ‘prisioneiro político’ de um ‘regime de força disfarçado em democracia’ e declarar, a toda mídia internacional e a resistente que resta, a retirada de toda a sua defesa jurídica, por desnecessária a partir de agora por estar mais que comprovada a impossibilidade de haver justiça no Brasil, pela inexistência da mesma, de fato e direito, existindo apenas como aparência para atender a farsa da ‘estratégia’ do golpe.
Aí começa a batalha para ‘libertar o Brasil, libertando Lula’, que deixará o país, que sonham para outros, ‘andando paralisado’ até desmoronarem da torre de poder que construiram e reforçaram por séculos, por falta de democracia, de justiça, de povo, de menos desigualdade, esgarçamento e fadiga do material.
Foi la e é ainda la que eu hei de ouvir cantar. Uma sabia…
“Não vai ser em vão, que fiz tantos planos de me enganar. Como fiz enganos de me encontrar. Como fiz estradas de me perder”.
Estamos perdidos em uma noite escura e com medo de não encontrarmos uma saida rapidamente. Ontem muitos de nos sonhamos com a possibilidade de Lula sair desse carcere, de passar o natal com sua familia. Eh um tal de sobe e desde de adrenalina que, como diz o texto, nos deixa ao final exaustos.
O Ministro Marco Aurélio Mello escancarou o tamanho do embaraço que existe no Supremo e a fissura em todo o judiciario.
Lindo texto . Emocionante .
Lindo texto . Emocionante . Obrigada