Cenários imprevisíveis. Avenidas já antes navegadas à vista…, por Roberto Hugo Bielschowsky

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Cenários imprevisíveis. Avenidas já antes navegadas à vista…

por Roberto Hugo Bielschowsky

Comentário ao artigo “Xadrez da aliança Ciro Gomes-Lula, por Luis Nassif

Começo de onde Nassif terminou: “Ao contrário de outros tempos, as tentativas de desenhar cenários esbarra em fatores de imprevisibilidade inéditos. Ninguém pode ter certeza de nada.”

Para pensar os cenários mais detalhados das eleições, concordo que não haja mesmo como discutir a imprevisibilidade com as quais esbarramos. Contudo, acho que temos sim, algumas indicações fundamentais de natureza bem geral colocadas e sobre as quais podamos ter algumas direções importantes para a caminhada a ser feita.  

A partir dos fracassos, junto à população, seja do quarto governo sucessivamente eleito pelo PT e a partir do momento no qual ele reconheceu a crise fiscal, mas só após eleições, seja do golpe comandado pela dupla Temer-Cunha e tendo à sua frente, na esfera partidária, o comando de PMDB + PSDB, me parece claramente se delinear o fortalecimento de duas grandes vias políticas, nesta conjuntura, quais sejam:

1 – Via fascista – Piora das condições de vida + desemprego crescente+  insegurança + “bagunça generalizada” + esgarçamento do poder judiciário +  juízes ovacionados e impunes ao agir acima e fora da lei, como sherifs no velho oeste +  aprofundamento da crise com desgoverno generalizado + Congresso completamente desmoralizado, abrem uma importante  potencialidade para uma via fascista, hoje eleitoralmente canalizada para a candidatura de Bolsonaro.

2 – Via de Centro-esquerda –  A resiliência do governo Lula no imaginário popular, junto com o fracasso do golpe, abrem uma enorme avenida para uma candidatura de tipo centro-esquerda que se apresente como apta a retomar o que de melhor teve o governo Lula, mas com uma perspectiva de sua superação em algumas dimensões importantes, como na questão tributária e, em especial, de taxação das elites financeiras, manejo das taxas de juros e câmbio, de política industrial e nas questões de natureza (res)publicanas na composição/organização dos governos. Como o candidato Bolsonaro  é truculento e despreparado demais, boa parte da esquerda brasileira não acredita que ele se elegeria, assim como a elite intelectual democrata demonstrava grande convicção que alguém tão truculento e despreparado como Trump não poderia ganhar as eleições nos EUA. Isto, mais o desgaste das forças golpistas,  faz com que,  mais uma vez, a disputa por quem deteria a cabeça desta Via se torne mais importante do que a articulação competitiva de um projeto para o país, nesta Via.

Gostaria de relembrar dois momentos da vida nacional, nas quais os desafios para a Via 2 eram tão grandes ou ainda maiores quanto os de agora e nos quais a prevalência da disputa pela hegemonia para a via 2, acima de qualquer outra variável, pode ser vista como um desastre político para o país.

Me refiro à 1989 e 1992-93.  Em ambos os momentos, os desafios eram de uma transição da ditadura feita por cima, num quadro de grande euforia da onda neoliberal no planeta, num país periférico e com enormes desigualdades sociais, uma inflação resiliente e incontrolável e uma década perdida de crescimento econômico pífio.

Nestes dois momentos, a Via 2 parecia amplamente fortalecida, do ponto de vista popular e, no entanto, saiu derrotada nas eleições de 1989 e 1994.

·        Em 1989, as candidaturas Lula, Brizola e Covas, assim como seus respectivos partidos, poderiam ser considerados como de centro-esquerda no que diz respeito à formulação de um programa de médio prazo para o país, numa conjuntura global de queda do muro de Berlim e de assenso da onda neoliberal. Brizola tentou alertar para o perigo de deixarem um aventureiro de direita como Collor passar, por falta de entendimento nesta via de centro esquerda. Pode-se dar o desconto que o PT era ainda um partido em definição, pela esquerda, e com uma maior pluralidade interna que o conduzia a disputar em faixa própria o governo em 1989, mas o fato é que passou um Collor que, no primeiro turno, tinha muito menos cacife do que as forças que reuniam PT+PDT+PSDB na ocasião.

·        Em 1992-93, a miopia deste campo me parece ter ido bem mais longe. O fracasso do governo Collor devolveu com ainda mais força a bola para este campo de centro-esquerda, em direção oposta à onda neoliberal global. Vimos, em 1993, uma intensa e sistemática conversação entre PT e PSDB, nas pessoas de Lula e Tasso Jereissati pelo PT e PSDB, com Brizola participando também aqui e ali, visando formular linhas para 1994. Com a conjuntura ainda mais agravada que em 1989, a convergência para um programa comum entre PT, PDT e PSDB era moleza. Ainda mais se tivermos em mente o que efetivamente estava em disputa ali, pós queda do muro de Berlim.

A única dificuldade é que cada um dos três partidos concordaria com uma aliança sem nenhum problema, desde que a cabeça fosse a do seu partido. No caso, PT estava convencido que esta era a vez de Lula, o PSDB, na prática, impunha Covas ou nada feito e Brizola achava que esta seria sua última e merecida chance de chegar à presidência. Resultado: FHC armou um plano de estabilização inteligente, se cacifou e armou um governo pelo centro-direita, incorporando teses neoliberais que empurraram o PSDB para uma posição muito mais à direita do que seu ideário/práticas/potencial apontavam.  

FHC levou, armou um governo com todas as características de “farinha do mesmo saco” de sempre e o PT, 8 anos depois fez algo bem parecido, com um viés mais decidido de redução das desigualdades, parcialmente lastreado em condições globais mais favoráveis e parcialmente numa determinação política mais decidida para atacar a questão das desigualdades.  

Moral da História: Passamos os últimos 24 anos assistindo a uma disputa política muito pobre, entre PT e PSDB, que prometiam uma oxigenação partidária importante em 1989, ao mesmo tempo republicana e de avanços sociais na reconstrução democrática no Brasil, mas que foram se esvaindo paulatinamente, pelo menos  na sua dimensão republicana ao longo destas quase três décadas.  

Hoje, PT e PSDB me parecem  se apresentar aparentemente à deriva, na sua capacidade de formular estratégias consistentes na política mais geral, cada um em seu respectivo campo atual e com suas correspondentes mazelas. Digo isto, apesar de pessoalmente manter minha filiação ao PT desde 1981, por ainda acreditar na possibilidade de sua refundação, como queriam Tarso Genro e José Eduardo Cardoso em 2006.

Será que nem na cadeia a esquerda se une? Acho que este seria o momento exato para uma olhada na importância de se evitar a repetição de  erros Históricos.

Com um agravante: o fracasso de um próximo governo,  que abra ainda mais espaço para a via fascista, provavelmente não será mais ocupada por um Bolsonaro da vida. Se preparem para o “Partido da Justiça” vir aí com tudo disputando este espaço, com algum Moro na cabeça em 2022, ou até antes, via golpe.

 

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

6 Comentários

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  1. joguinho..

    Política no Brasil se resume à melhor estratégia para chegar ao poder..

    .. todo esse texto se resume a isso..

    .. PT e PSDB não se coligaram, então FHC saiu na frente e ganhou a parada..

    .. é um joguinho..

    .. por isso que esse país está essa ()..

  2. Eles Perderam, a Nós Resta “Vencer a Eleição” com “Lula Livre”

    Acorda Nassif!

    O golpe atolou com Temer e a Pinguela banqueira da Casa das Garças, deixando quicando na área, para alguém fazer o gol, a oportunidade de realizarmos finalmente a revolução que o país necessita para sair dessa nhaca do atraso e da desigualdade , grandes impecilhos para que o Brasil torne-se de fato e direito uma nação soberana.

    O melhor é que essa revolução pode ser realizada sem derramamento de sangue, basta unificarmos os esforços em movimento para que haja eleição em 2008 com Lula livre, com o povo pressionando para tira-lo da cadeia da vergonhosa tragédia que é essa farsa judiciária de Curitiba, para leva-lo até Brasilia e comandar a revolução brasileira, aquela que transformará o país em nação soberana, junto com o povo, enterrando a Casa Grande, a classe dominante e os Marinho, como posseiros do poder no Brasil, através de reformas no judiciário, na política e nas forças armadas brasileiras, acabando com todos os resquícios do passado do atraso, da escravidão e da desiguladade, como eixo de sobrevivência de uma classe dominante, por séculos e o sossego geopolítico do Norte, querendo-nos colônia. 

    Ciro é apenas fogo de dispersão para evitar essa “revolução”, fruto da fome que junta, a obsessão de Ciro pelo poder pessoal, com o risco de extinção sem a manutenção do poder, por parte da classe dominante.   

  3. Distribuição de renda e defesa dos direitos trabalhistas
    Em função da enorme desigualdade social, não há espaço para o avanço de um movimento fascista no Brasil, no máximo podermos seguir para um regime Franquista, autoritário e defensor das relações cristãs, para manter os privilégios de parcela mais rica, em relação a maioria da população.

    Hoje o PSDB ocupa um espaço a direita do espectro político, em que nada lembra o de 1989. Hoje o PSDB está mais para o PDS e PFL daqueles tempos.

    Não temos um Brizola, já que Ciro Gomes parece mais Covas de 1989 ou/e FHC de 2002, do que com Brizola de 1989.

    O PT deixou de ser a mistura de esperança e medo, o medo da grande maioria da população foi apagado pelos Governos do Presidente Lula e da Presidenta Dilma, e a esperança foi substituída pela realidade da melhoria da distribuição de Renda.

    A única coisa que restou daqueles tempos foi, o pavor e o medo dos mais ricos de perderem parte dos seus privilégios em relação à maioria da população, aliás o que vem alimentando a tese Franquista no Brasil.

    O PT ainda é o grande representante da defesa dos direitos trabalhistas e da melhoria da distribuição de renda, que o golpe de 2016 não conseguir apagar, muito pelo contrário.  

     

  4. A miopia desse tipo de texto…

    Talvez em 89 houvesse mais de uma possibilidade à esquerda. Agora nao há, ou há, mas só com um candidato viável (Boulos pode ser até ótimo, mas convenhamos, possibilidade nenhuma de ser eleito, e além do mais ainda nao está pronto; ele é o Lula de 89, que felizmente nao ganhou naquele momento). Ficar falando de Ciros e outros “menos ruins” do gênero é conversa para boi dormir. Ele nao realizaria um governo que desejemos, é o plano B DA DIREITA!

  5. Collor II

    Não enxergou a semelhança entre Ciro e Collor?

    O apoio de Steinbruch (FIESP) e a busca por DEM, PP e ala direita do PSB são sinais mais do que suficientes para demonstrar que estamos diante de um candidato de direita, no velho estilo “salvador da pátria” e “caçador de marajás”.

    Abra os olhos.

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