É preciso que paremos de nos assoprar, por Francy Lisboa

É preciso que paremos de nos assoprar

por Francy Lisboa

A intervenção causou revolta em todos os espectros da Esquerda, mas também na Direita. Sim, somos todos brasileiros e essa dicotomia clássica do espectro político as vezes soa inútil, certo? Errado. A gritaria da intelectualidade brasileira contra a intervenção faz parecer que o brasileiro sabe ser possível vencer o medo cotidiano, sabe sobrepor os anseios imediatistas desse sentimento simplesmente com base na oratória intelectual sobre o fracasso anunciado da intervenção como arma de combate à violência generalizada. A intelectualidade subestima demais o medo, ou não o considera importante fator de retroalimentador da instabilidade social.

Dói constatar que é preciso romper com as ilusões sobre nós, brasileiros. A violência é um traço nosso pelo simples fato que combatemos justificativas de mortes com justificativas de mais mortes. Nenhum líder sindical, comunitário, ou vereador identificado com a esquerda é assassinado sem que haja a nefasta divisão entre os que apoiam e os que condenam. A morte brutal, que deveria comover sem distinção de orientação política, sabemos não ocorrer na grande massa brasileira. Basta pegar trens lotados e levantar o assunto de assassinatos por forças de segurança presumidamente treinadas fisica e mentalmente para termos pavor de nós mesmos.

Policiais matam e corremos para justificar com policiais mortos. Adolescentes negros mortos em guetos e corremos para justificar com a gravíssima acusação do “devia se bandido”. O devia, como elemento de indeterminação usado como prova de culpabilidade, sabemos que vem bem antes a Lava-Jato, logo, nada de novo na farsa jurídica que ajudou acelerar a podridão desse território tropical.

Na batalha de quais mortes doem mais, o Brasil jamais vai sair do seu ciclo de violência. A necessidade de pacifistas é a coisa mais urgente no Brasil de hoje. Um projeto de paz para o brasileiro é difícil porque como dependentes da droga do toma lá dá cá somos bem difíceis de sermos domesticados no curto e médio prazos. As justificativas para mortes brutais são como episódios de desesperança e não podemos mais ficar tecendo loas sobre nossos atributos porque eles são suplantados, e muito, pela nossa ignorância e recusa em dar uma chance para paz brotar dentro de nós.

Para todos aqueles que celebram a morte baseados em critérios de afinidade/desafinidade política ou moralismo tosco apresento seus papéis nessa chaga que parece interminável: replicadores de um jeito de ser que nos condena a um só caminho, o eterno sudesenvolvimento. Um povo em que todos querem ser perdoados, mas ninguém perdoa.

 

Redação

2 Comentários

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  1. Paz agora é inadequado

    A direita, claro, clama pela paz. É óbvio que não deseja a reação à violência que vem praticando faz tempo mas que agora ficou mais evidente. “Não reajam”, diz a direita. Podemos entender “apanhem quietos”.

    Mas lembrando do Barroso lembrando a Bíblia, há o tempo para a paz e o tempo para a guerra. Agora o tempo é de guerra, uma guerra aberta pela direita. Vai ser difícil convencer as pessoas a ficarem pacíficas enquanto são vilipendiadas…

  2. Francy

    Francy, muito bom poder ler suas análises.

    Estou convencido de que enquanto não for solucionada a questão da desigualdade social nunca esse problema será resolvido.

    As pessoas pobres, vivendo por muitas vezes em situações desumanas, muitas sem emprego, sem condições mínimas de uma sobrevivência com dignidade tem aí o estopim para na criminalidade, para a sobrevivência.

    Crianças que crescem sem escola, sem adequada alimentação, cultura e lazer, que são bombardeadas diariamentte pelo consumsmo capitalista que propaga que você só será gente se consumir, que outra saída tem se não o crime?

    Não toco aqui em desvios de caráter que atingem a pessoas de todas as classes.

    O classe média e média pobre, vê no pobre um inimigo que vai lhe subtrair o que tem ou o pouco que tem, não conhecem a realidade diária de milhões de pessoas atiradas à pobreza, não conhecem suas condições de vida, morando em barracos, sem saneamento, que muitas vezes dormem muito pouco, sofrem no transporte público, são humilhados por seus patrões e pessoas que estam acima da sua classe social.

    Policiais militares, também advindos da classe pobre, que são doutrinados a ver principalmente os pretos, pobres e favelados como o inimigo a ser derrotado. Pessoas que com uma arma na cintura e um cassetete na mão pensam que tem todo o poder domundo, que se corrompem porque a eles também a pobreza afeta e o dinheiro corrupto fácil se torna um imã.

    Difícil para todos esses compreender o que é a paz, menos ainda ver o outro como seu semelhante, como seu igual.

    Não teremos paz enquanto as feridas da desigualdade não forem curadas, ou pelo menos amenizadas.

    Concordo com o comentário de Renato Lazzari quando escreveu que agora é tempo de guerra, guerra onde todos são inimigos de todos, uma guerra surda, mas que já se tornando gritante, uma guerra sem ideologia, sem objetivo, mas uma guerra e que será catastrófica.

     

     

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