Não tolerar o intolerável, por Wolfgang Leo Maar

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Não tolerar o intolerável

por Wolfgang Leo Maar

A situação é gravíssima: a tolerância frente ao que está à nossa frente é altamente repressiva. A disputa não é entre duas propostas de sociedade, mas entre uma proposta de sociedade e um projeto de “não-sociedade”, uma construção falsa e desumana de uma realidade onde vale quem tem mais poder, sem qualquer referência ao bem-estar do conjunto da população brasileira. Nesse avesso de sociedade não há democracia possível.

O que está em pauta hoje no Brasil é se viveremos efetivamente em uma sociedade humana ou se apenas habitaremos uma ordem social pautada, no final das contas, pelo exercício da violência e da exploração sem freios. O Brasil tornou-se uma verdadeira sociedade apenas muito recentemente. Só em uma sociedade é possível a democracia, pela garantia de haver um terreno comum, da universalidade de direitos humanos e sociais, de que ninguém seria excluído. No ordenamento social proposto pelo candidato totalitário, não há lugar para todos; ele procura desumanizar, retirar do convívio, a maior parte da população brasileira: as mulheres, os negros, os nordestinos, os pobres, os homossexuais, os que participam de movimentos sociais, os habitantes das ruas, os sindicalizados, os aposentados, os que são favoráveis às políticas públicas, os que são favoráveis à autonomia universitária, os que falam em classes sociais, os que discordam, os que querem discutir … A lista é enorme.

É visivelmente a disputa contra um poder avesso à soberania do povo brasileiro, a um Brasil para todos, uma democracia de que o povo já sentiu o gosto e que não vai deixar de lado. Em nosso passado esse Brasil de e para todos já foi tão afetado pelas chagas da escravidão e da ditadura. Hoje o que está em pauta é sobretudo a limitação, exercida pública e coletivamente pelo povo em sua totalidade, do poder absoluto, qualquer que seja. Às Instituições Públicas cabe refletir esse controle; sob pena de, se não o fizerem inteiramente, sua existência e eficácia se encontrarem ameaçadas, com a perda de sua capacidade de interferir socialmente.

Afinal temos que compreender e explicar porque uma grande parte de pessoas vota em um candidato da extrema-direita, que anuncia publicamente projetos que são amplamente nocivos à maior parte do estrato social que o apoia. Esses eleitores são impedidos de perceber que o que está em jogo é a sociedade democrática que foi construída no Brasil. Isso é escondido deles cotidianamente. Eles apreendem seu dia a dia como necessidade de adequação a quem tem poder e quem os municia diariamente com informações destinadas a manipular e distorcer a realidade social e construir falsas soluções.

A única maneira de enfrentar o Totalitarismo desumanizador é uma prática que une a denúncia da falsidade do discurso do Totalitarismo e o fortalecimento da resistência ao mesmo. Não podemos ser tolerantes com quem, para falar bem a verdade, é intolerável.

Wolfgang Leo Maar, Professor Titular Sênior da Universidade Federal de São Carlos e pesquisador do Cenedic da FFLCH-USP

 

 

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

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