O buraco é bem mais embaixo, por Felipe Silve

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Foto Amo Direito

O buraco é bem mais embaixo

por Felipe Silve

Comentário ao post “Xadrez da indústria de armas e o financiamento da direita, por Luis Nassif

Não há dúvidas que há uma excitação em torno da questão da posse das armas. Mas o tema precisa ser melhor tratado.

Vamos tentar:

– Há uma distância enorme entre o direito defendido pela NRA em solo dos EUA, e as condições históricas em que esses direitos foram construídos, com a situação brasileira.

Como cópia mal feita da matriz, seja em aspectos do formato institucional do MP, seja na questão da mídia, seja na escalada do encarceramento, seja na adoção da militarização da segurança pública, o Brasil acaba por “importar” de forma totalmente equivocada tudo que os EUA vomitam.

É aquilo que fhc copiou mal e porcamente em sua teoria do subdesenvolvimento, ou seja, por aqui os processos históricos tendem a defeitos próprios da inadequação e assimetria do capitalismo do centro para a periferia, até porque essas relações são estruturadas primeiro na hierarquia e subordinação dos interesses periféricos aos centrais, sempre!

Por mais equivocado que seja, o direito às armas nos EUA é bem mais complexo e arraigado àquela cultura, e a própria necessidade do capitalismo de lá, afinal, aquele país esteve a frente de conflitos sangrentos desde sua formação como tal, seja no âmbito da sua gênese (Independência), seja no aspecto interno, já como um Estado soberano (Secessão), até nas diversas guerras imperialistas até hoje.

Por tais razões, dentre outras, não poderia tratar seu cidadão como inapto ou estranho às armas e seu manuseio.

No Brasil o monopólio dessa violência ficou híbrido.

De um lado dizemos (legalmente) que só o Estado e seus agentes possuem essa outorga, de outro, os conflitos são privatizados ao número de 67 mil mortes violentas em 2017, conforme notícia do próprio blog hoje, a esmagadora maioria por armas de fogo.

Então, a abordagem ou a suposta abordagem da NRA por aqui não é mais que peça de propaganda, explico:

– Muito pouca gente tem grana para adquirir uma ou mais armas (preço médio entre 1.000,00/1.500,00 por um revólver calibre .38 de 2 polegadas), e muito menos pagar pelos exames de aptidão (psicológico e de tiro).

Boa parte das armas é clandestina e assim permanecerá.

E as afiliadas a NRA estão muito pouco preocupadas com essas vendas de varejo por aqui, ao contrário dos EUA, onde além das compras governamentais, o que puxa mesmo são as vendas no Wal Mart, por exemplo.

Talvez as vendas de munições disparem, se forem afrouxadas as exigências e quantias para cada possuidor, mas não pesquisei sobre o tema.

São as políticas (equivocadas) de segurança pública (guerras as drogas) que garantem (e já garantiam mesmo antes da ascensão do coiso, inclusive nos nossos governos do PT) a estabilidade dos fluxos de produção e compras dos governos, quer derretem boa parte de seus orçamentos na indústria do medo (segurança, armas, insumos, etc).

Enquanto permanecerem as condições ambientais (guerra as drogas/militarização das polícias) as fábricas de armas locais e internacionais (COLT, SIG, etc) manterão seus lucros, seja no mercado formal, seja no mercado negro, sim porque se não faltam armas às polícias e aos bandidos, e como explicar esse excedente?

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Sim, a TAURUS é uma arma de merda. Os problemas enfrentados pela polícia de SP e do RJ, com farta divulgação na rede mundial deixa claro o baixo padrão das armas oferecidas ao público nacional, embora a forja tenha fornecido seus modelos 24/7 calibre .40 ao FBI, senão me engano.

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Há outra questão a ser abordada nesse tema:

O verdadeiro lobby aqui foi dos ruralistas, justamente quem mais tem “necessidade” de possuir armas, e justamente onde os conflitos se dão nos arredores dos domicílios dos fazendeiros, abrindo a brecha jurídica para as “legítimas defesas” da posse da terra e dos fazendeiros, já que possuir armas em grande número ficou normal e mais fácil (legal).

Outro ponto que não considerei e deveria ser estudado é:

– Ora, se a lei posterior que altera os crimes e que for mais benéfica ao réu pode tornar seu crime impunível retroativamente, todo mundo que responde por posse de armas em quantidade maior a que era permitida ou que passar a se enquadrar nas novas exigências mais frouxas, mas que antes o incriminava, deverá ter seu processo suspenso/arquivado e/ou ser solto caso esteja preso.

– Lembremos que o decreto é ato executivo revestido de força de lei, pois a lei das armas 10.826/03 é estatuto penal “em branco”,  isto é, enuncia um crime que precisa de um regulamento/norma/portaria (como no caso da lista da ANVISA sobre drogas legais e ilegais).

Novamente, a lei atinge diretamente os grupos de interesse e da base de apoio do atual presidente: ruralistas, seguranças privadas, etc. e enfim, não se pode afirmar que tenham apoiado o presidente, as milícias.

 

 

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

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