O Fake-Fake, por Jean Pierre Chauvin

O Fake-Fake, por Jean Pierre Chauvin

É sintomático. Há meses temos lido e ouvido que haveria uma preocupação crescente do jornalismo, dito “sério”, com as famigeradas fakenews. Nem discuto o emprego do termo, já colonizado, por aqui. Hoje, 8 de abril de 2018, a Folha de S. Paulo – com a ajuda inestimável de “especialistas” no assunto, alerta para o aumento das tais notícias falsas, nos próximos dias. E exclusivamente na internet.

O artigo não é gratuito. Acontece em respeito ao nosso tempo e lugar. O jornal esperou pela melhor oportunidade, segundo os editores, jornalistas, anunciantes e uma parcela de seus leitores, antes de ser enviado, como manchete de destaque, para os assinantes (e mesmo para os não assinantes, como é meu caso).

Disseminado por um jornal que ainda conta com a credibilidade parcial de seu público, o senso comum adquire ares de formulação científica e incontestável, com a ajuda dos argumentos “de autoridade”, já que se trata da suposta conclusão justa e ponderada de experts no tema.

Cumpre dizer que fakenews não são privilégio de gente supostamente mal intencionada, localizada entre os pixeis e bites da esfera virtual. Com ternos alinhados, em cores sóbrias, e gravatas a sugerir gravidade, a dita “grande” imprensa continua a reivindicar que o teor do que reportam é abrangente, neutro, sério e honesto.

Se fosse abrangente, como acontece no telejornalismo internacional, ofereceria mais de uma versão dos fatos, concedendo ao telespectador alguma possibilidade de chegar à terceira opinião.

Se fosse neutro, concederia o mesmo tratamento a todo e qualquer político ou persona, que pretendam transformar em vilão ou celebridade.

Se fosse sério, não subestimaria a inteligência e a sensibilidade do telespectador.

Se fosse honesto, não condicionaria o teor do que “noticia” às benesses de poderosos anunciantes, sejam eles megaempresários (daqui e de fora) ou correspondentes do governo.

O “alerta” veiculado na Folha de S. Paulo acontece horas após a prisão de um ex-presidente (o mais popular que o país já teve) – ponto alto da operação Lava-Jato, que custou apenas alguns bilhões de reais, para tentar nos vender a imagem de que haveria super-heróis incorruptíveis, togados, que merecem receber cem vezes mais que um operador de telemarketing.

É que a lei, assim como o sol, como bem sabemos, “é para todos”. Não será por acaso que, nas semanas que encerraram o “grande acordo nacional”, mas entreguista — sob o caloroso manto estadunidense – prescreveram os processos de figuras-chave do governo ilegítimo.

A sanha pelo fakenews é a mais nova pedra de toque da imprensa e do telejornalismo tradicionais. Não se trata de “proteger” o “homem de bem” das mentiras perpetradas nas ondas da rede ciber; mas de assegurar a manutenção do trono, a seriedade fake de certos foruns.

Alguém já deverá ter se perguntando por que determinadas figuras permanecem décadas no assento maior da Rede Globo. Agindo em acordo com o que manda o seu diretor-geral, rigorosamente alinhado com os seus anunciantes, alguns “âncoras” (o título é pretensioso) lembram os antigos Senadores do Império: seu cargo parece ser vitalício.

E por falar em senadores, algo tão ou mais curioso. O jornalismo que confunde técnica com efeito de verdade, visando a “combater” as tais notícias falsas, é o mesmo que concentrou os holofotes em praticamente uma legenda partidária, bem antes do junho de 2013, no encalço de suas figuras mais representativas.

Graças à imprensa tradicional, somos mais polarizados do que nunca e o cargo no senado, dependendo da legenda, é mais inatingível que o da presidência, na república dos bananas. Substituiu-se o vitalício pela aposentadoria decorrente de um mandato. De fato, vamos bem melhor. Deve ser o que explica a retomada da divisa comteana, que soa como piada diante do tratamento excludente que o atual des-governo concede ao “povo”.

Se você continua a assistir ao telejornalismo de certas emissoras; se persiste em escutar rádios mantidas pela crença de que não há outro país possível; se insiste em ler e acreditar em jornais mancomunados com os seus anunciantes, nada posso fazer. Mas se pretende proclamar a sua coerência, é hora de dar crédito a outras fontes e pessoas. Não há nada de patriótico em fazer saldão dos bens que restam no país. Não há nada de inclusivo em exirpar o pouco que resta da seguridade social.

Ou a gravata, a voz, a locução, a aparente gravidade dos teleapresentadores embotou a sua capacidade de discernir entre o bonitinho e o ordinário? Tsc, tsc.

Redação

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