Os muitos ônus da cessão, por Túlio Muniz

Os discursos oficial e o midiático estão concertados na propagação duma suposta 'incompetência' da Petrobrás em explorar sozinha o Pré Sal, e assim a presença privada seria não só necessária, mas inevitável, quase redentora.

Reprodução TV Gazeta

Os muitos ônus da cessão

por Túlio Muniz

São compreensíveis a cautela e prudência de Gustavo Gollo ao levantar mais dúvidas que certezas acerca do que de fato tem causado a poluição das praias em todo o litoral Nordeste nesses últimos 40 dias (aqui).

Ainda que ele remeta ao desastre do Deepwater nos EUA, não cita – pelo menos não diretamente – uma suspeita que não foi sequer aventada pela mídia ou pelo discurso governamental: e se se trata de um vazamento de poço de extração? Quem vive ao e do litoral sabe desde o início que não foi lavagem de tanque de navio próximo da costa, prática danosa porém corriqueira, que gera borras muito menores de petróleo, numa área restrita e com um tempo de concentração muito menor que os atuais 40 dias

Não espanta a adesão imediata da mídia à suspeita do governo Bolsonaro, de que se trata de um ato proposital da Venezuela, ou de navio petroleiro de outro país que derramou o óleo no mar, o que está longe de ser comprovado. 

Em paralelo, um fato que ajuda a entender porque a mídia está preocupada em manter o foco na ‘suspeita venezuelana. Há um empenho imenso, em âmbito político, financeiro e midiático, na ‘positividade’ do leilão da extração de petróleo da chamada ‘cessão onerosa’. 

Os discursos oficial e o midiático estão concertados na propagação duma suposta ‘incompetência’ da Petrobrás em explorar sozinha o Pré Sal, e assim a presença privada seria não só necessária, mas inevitável, quase redentora. 

Está no InfoMoney deste 09 de Outubro [aqui]

“Ainda sobre a Petrobras, a companhia finalizou a venda da totalidade da sua participação nos campos de Pargo, Carapeba e Vermelho, localizados em águas rasas na Bacia de Campos (RJ) para a Perenco Petróleo e Gás do Brasil. A operação foi concluída com o pagamento de cerca de US$ 324 milhões para a Petrobras, com os ajustes previstos no contrato. Esse valor se soma a US$ 74 milhões pagos à Petrobras na assinatura dos contratos de venda. (…) Três licitações de áreas de exploração e produção de petróleo e gás nas próximas semanas devem render R$ 237 bilhões à União e à Petrobras. Cerca de R$ 120 bilhões devem ser direcionados à petroleira por investimentos realizados nas áreas e R$ 117 bilhões virão do bônus de assinatura”.

E se Gollo tem razão em lembrar Deepwater não só pela catástofre ambiental, mas sobretudo pelo que a causou? Vale remeter a “Deepwater Horizon”, de Peter Berg (2016, excelente filme, aliás), onde fica demonstrado que negligência operacional motivada por busca de lucro acelerado na extração de petróleo foi a causa real do desastre. 

E por que não se considera essa possibilidade no vazamento de agora e não se investiga também se esse óleo vazou de poço operado por empresa privada no Pré Sal? Será por que, sendo essa a causa, fica comprometido o leilão de novembro relacionado à ‘cessão onerosa’? 

Como demonstrado na primeira parte da matéria do InfoMoney, a presença privada já é expressiva e tende a aumentar. As devidas prevenções ambientais acompanham a celeridade das concessões em curso?

Reitero: Gollo age corretamente ao não apontar o dedo para ninguém, e igualmente é perspicaz ao lembrar que a empresa responsável pelo Deepwater adulterou o petróleo para que afundasse e não chegasse todo todo ele  à costa. E se o petróleo que vaza agora é ‘brasileiro’ e tiver sido também adulterado? 

E, sobretudo,Gollo nos alerta: seja o que for que tenha havido, é preciso que a verdade venha à tona.  Porque o óleo derramado e o estrago já aí estão. Se são ou não resultado de negligência, isso tem de ser conhecido para que se evitem novos desastres com a privatização da extração.

Túlio Muniz. Jornalista, historiador, Doutor em Pós Colonialismos e Cidadania Global / Sociologia pela Universidade de Coimbra.

Redação

2 Comentários

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  1. A BP das primeiras PRIVATARIAS do Pré-Sal é a mesma do acidente da Costa Brasileira, que é a mesma do histórico acidente do Golfo do México. Quanta responsabilidade e interesse com o Meio Ambiente de outros países, demonstrado por uma Empresa de Capital basicamente do Estado Britânico? Estamos privatizando Nossas Estatais as vendendo para Estatais de outros países. A rapidez em acusar a Venezuela e os argumentos, como se enviassem um navio a 50 Kms da nossa costa para despejar propositadamente este petróleo, mostra a que nível chegaram as discussões nacionais. Mas o pior de tudo. A ABERRAÇÃO TUPINIQUIIM do Estado Ditatorial Absolutista !!! Esta hecatombe de dinheiro, produção industrial e tecnológica, formação e diversificação de Mercado está virando em apenas ‘Exploração de Pau Brasil ‘, ‘Exploração de ouro das Minas Gerais’, que criaram um Elite endividada com a Coroa Britânica depois de financiar sua Revolução Industrial. Será que continuamos assim tão Lunáticos? MultiNacionais Estrangeiras importaram de tudo, de máquinas, a licenças e patentes, fora Empregos Especializados e pagarão uma ínfima parte deste Petróleo à Elite Brasileira do Estado Absolutista., E esta Elite continuará a propagar sua Indústria do Atraso, da Miséria, do Coitadismo, da Pobreza, do Analfabetismo. O Brasileiro precisará estudar para que? Para trabalhar aonde? Se nem nas suas Empresas, no seu Território, nas suas Riquezas não pode se desenvolver? Como afirmou o eleito e atual Presidente do Tucanato: ” – Precisamos pegar estes milhões de Brasileiros e dar a chance para que varram ruas e cuidem das praças, para diminuirmos o desemprego “. FANTÁSTICO !!!!!!!! Sempre Nos sobrarão as portarias e sarjetas. Pobre país rico. Mas de muito fácil explicação.

  2. Bolsonaro acusa a Venezuela de ser a possível fonte do derramamento de óleo.
    E se os governadores dos estados nordestinos, cismarem com a possibilidade desse mesmo vazamento, ter sido causado pelo próprio governo federal, seja por incompetência ou por algum interesse?
    Na atual conjuntura política, tudo é possível como bem sabemos.

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