Por que abandonaram a Frente Ampla?, por Ricardo Cappelli

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Foto Vanessa Ataliba/Folhapress
 
Por que abandonaram a Frente Ampla?
 
por Ricardo Cappelli 
 
O desastre histórico poderia ser evitado? Os que definiram o caminho que nos levou ao atual retrocesso civilizacional irão agarrar-se à tese da inevitabilidade. É um habeas corpus poderoso.
 
Qualquer questionamento será tratado como rebaixamento da discussão, argumento “dor de cotovelo” de uma alternativa hipoteticamente mais correta que jamais poderá ser comprovada. 
 
A crise do capitalismo, os ventos que empurram o mundo para a direita e a facada inesperada serão avocados para sustentar que não havia saída. “Como podem ver, a vitória esmagadora comprova que nada podia ser feito. Qualquer um perderia”. Será?

 
Houve alguma novidade na conjuntura? Milhões se levantaram quando Lula foi preso? Não era previsível uma poderosa onda de direita? Fomos pegos de surpresa? 
 
A falta de governabilidade sobre os fatos é sempre um confortável caminho para justificar o fracasso. Que razões motivaram as decisões que nos levaram ao isolamento?
 
Na eleição nacional, o PT prefere perder liderando a ganhar liderado. Hegemonismo clássico de olho na sobrevivência partidária. Foi coerente com sua história e trajetória. Sai como a maior força da Câmara. Bancada federal e burocracia sobreviveram. “Salvaram-se todos”. 
 
O PCdoB, que tinha como resolução a construção de uma Frente Ampla, aderiu à Frente de Esquerda. Existem algumas hipóteses para a guinada.
 
A primeira é que não foi possível construir a sonhada Frente Ampla. As conversas com atores mais amplos de outros partidos com o objetivo de construir uma  liderança mais ampla para a Frente foram verdadeiras ou apenas rito formal para justificar mais uma adesão ao PT?
 
A segunda hipótese é o pragmatismo imposto pela necessidade de ultrapassar a cláusula de barreira. Neste caso, a opção petista foi conseqüência da não construção ao longo do processo de alternativas ou imposição da realidade objetiva?
 
PDT, PSB e PSOL cresceram bancadas e votações. O PT perdeu deputados, mas manteve a maior bancada. O PCdoB viu sua votação encolher e foi barrado pela cláusula de barreira. 
 
A terceira hipótese é que prevalece entre os comunistas a visão de que não existe caminho para a esquerda sem o PT. Seria necessário o amadurecimento da sigla – que viria com a derrota – para construir junto com os companheiros um novo caminho.
 
O resultado vai fazer aflorar virtudes ou aprofundará a visão hegemonista como instrumento de sobrevivência? Prevalecerá a postura dos governadores petistas que foram contra a candidatura própria ou a aliança entre a bancada e a burocracia partidária, apoiada por Lula?
 
O PSB engavetou nesta eleição o esforço de Eduardo Campos de conferir identidade nacional a legenda. Os socialistas decidiram não ter candidato e não apoiar ninguém em nome de seus projetos estaduais.  É possível pensar interesses estaduais descolados da questão nacional? Bolsonaro promoverá um cerco?
 
Ciro caminhou isolado. O isolamento foi resultado da falta de habilidade do pedetista? Da falta de força? Se fosse um candidato mais “dócil” do PDT, do PSB, do PCdoB ou de outro partido mais amplo, o PT teria apoiado?
 
PT e Bolsonaro foram protagonistas de uma polarização que empurrou o país para o abismo. Lula é vítima da exceção e do arbítrio. Decidiu responder com o fígado mordendo a isca que lhe colocaram ou a derrota sempre foi uma “possibilidade aceitável”? 
 
Numa guerra claramente assimétrica, enfrentar o inimigo de peito aberto é suicídio. Os esquerdistas gritam: “o centro não existe mais! Foi arrebanhado pela direita!” Será? 
 
Um candidato mais amplo apoiado pela esquerda, ou por parte dela, jamais levaria à conformação de forças que se juntou em torno da extrema direita.  Poderia perder da mesma forma? Obviamente que sim. Perder é do jogo. Perder com a política errada, um grave erro.
 
#NaoVaiTerGolpe, #LulaLivre, #EleNao. Esquerdistas cantaram a fantasia da guinada triunfante à esquerda enquanto conduziam o exército para o abismo. Abandonar a Frente Ampla foi um erro histórico.
 
Todos precisam baixar a bola. Ciro cometeu grave erro no segundo turno. Depois de conduzir a esquerda para uma derrota histórica, não tem cabimento o PT querer impor sua liderança.
 
Só uma nova conformação política, ampla, de frente, livre de sectarismos, conseguirá oferecer resistência ao que se avizinha. Contra as sombras, sabedoria, amplitude e firmeza histórica. É o único caminho.
 
Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

11 Comentários

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  1. O Ciro errou grotescamente no

    O Ciro errou grotescamente no segundo turno. Já errou feio no primeiro, exigindo que o maior partido ficasse a seu reboque e de seu partido. Faltou humildade. Pensou pequeno, com o umbigo. Não tem a grandeza pra liderar uma frente. Tem pra ser coadjuvante, mas aí talvez ache pouco pra sua importância. Em 2022 pode colher os mesmos resultados que a Marina em 2018. Seria bom repensar sua postura.

     

  2. Se o PT impede a formação de

    Se o PT impede a formação de uma Frente Ampla, 

    não  onvidem o PT, ora.

    Pois que façam a Frente Ampla sem a inclusão do PT.

    1. Chega de Capatazes

      Concordo com você. O PT é o maior e o mais estruturado partido, mas tem uma postura histórica arrogante.

      Uma Frente se constitui com Companheiros e não com TUTORES.

      Na Argentina já estão articulando uma Frente para as eleições de 2019. A ex-presidente e senadora Cristina K. aderiu. Veja bem: aderiu !

  3. O Ciro errou grotescamente no

    O Ciro errou grotescamente no segundo turno. Já errou feio no primeiro, exigindo que o maior partido ficasse a seu reboque e de seu partido. Faltou humildade. Pensou pequeno, com o umbigo. Não tem a grandeza pra liderar uma frente. Tem pra ser coadjuvante, mas aí talvez ache pouco pra sua importância. Em 2022 pode colher os mesmos resultados que a Marina em 2018. Seria bom repensar sua postura.

     

  4. Nesse assunto, a verdade é inconveniente

    Parabéns ao articulista de levantar o tema, que acredito ser de extrema relevância.

    O autor coloca três hipóteses: 1) A frente ampla falhou por “incorrespondência” – ninguém topou; 2) A frente falhou por cálculos partidário-eleitorais – cláusula de barreira, fundo partidário; 3) A frente falhou por “hegemonismo petista”.

    Respeito a visão do articulista, mas sinceramente, acho tudo isso um besteirol.

    O PT é um partido imprescindível não só para a esquerda, mas para o próprio funcionamento do pacto constitucional. Remova o PT do cenário e em dois tempos estamos no Pinochetismo mais escabroso.

    No entanto, a direção do PT tem sido muito reacionária enquanto liderança de esquerda. Aburguesou-se completamente.

    Desde o dia em que o PT chegou à presidência, a demanda de mobilização popular tem sido cada vez mais hostilizada por essa “ala burguesa” do PT. Dizem que é uma perspectiva adolescente, ou perigoso por amedrontar os poderosos, ou inútil por periodicamente haver eleições. O fato é que têm aversão à idéia de mobilizar a sociedade, principalmente as bases mais populares.

    Ontem o Wanderley Guilherme dos Santos propunha uma “frente apartidária liderada por intelectuais”. Algum tempo atrás, o Bresser-Pereira propôs um manifesto-frente. Tudo isso é bonito, mas nada disso tem substância.

    Parecem se esquecer placidamente da própria história política do país, em que frentes só podiam ser as de trabalhadores, camponeses e estudantes. A ditadura foi derrotada assim. O próprio PT foi formado assim.

    Então, se nos questionamos por quê a “frente ampla” falhou, a resposta é uma só: não houve mobilização popular! Não houve demarcação ideológica! Queriam juntar a classe média que vota(va) no PSDB com a que vota no PT! E deixar o povão de fora!

    É isso que dá deixar as bases de lado e secundarizar a mobilização popular em prol de uma “política parlamentar”. Um partido político de esquerda, antes de ser burocracia, deve ser movimento. E nisso o PT falhou miseravelmente. A militância mais lúcida queria a mobilização contra o golpe, contra a prisão do Lula, contra as eleições fraudadas, mas a cúpula burguesa do PT achou que poderia “resolver por cima”. Deu no que deu.

  5. Essa frente democratica
    Essa frente democratica jamais existiu. Impuseram como condição que o PT, PT, PT se suicidasse para que o guarda da cancela permitisse a entrada da “esquerda” na polis.

    O Partido dos Trabalhadores já ganhou e ja perdeu varias eleições. Pra Presidente está 4 x 4, podendo se orgulhar de nao ter cometido estelionato eleitoral, nem fraude nem tapetao.

    2014 foi ganha na moral, mas ficam os outros querendo autocritica…

    Eu falo para os poucos petistas que eu conheço: “nao embarquem nessa de se autoflagelarem em publico; se os donos da comunicaçao, os golpistas as facçoes judiciarias fizerem a autocritica deles, chegarem a um acordo se o PT. PT, PT conciliou demais ou é ‘radical’, aí, sim, voces podem pensar eu um debate razoável; fora isso, é suicidio”.

    Perdeu eleição, cuida de sobreviver, reune forças e tenta ganhar na proxima.

    …E, pelamordedeus, aprendam a se comunicar: só o Lula saber falar em um partido que ainda é o maior do Brasil é “dose”.

  6. A arrogância que nos destrói

    Perfeito, Ricardo: “o PT prefere perder liderando a ganhar liderado. Hegemonismo clássico de olho na sobrevivência partidária”.  A hegemonia e o protagonismo futuro foram os objetivos assumidos pelos dirigentes do PT em entrevista ao Nassif. Isto é um fato documentado.

    Por todo esse histórico e as terríveis consequências que já estamos vivenciando, acredito que o comentário do Walter Araújo está correto: se o PT vier com imposição, que se faça a Frente SEM o PT.

    1. Quantos deputados, senadores

      Quantos deputados, senadores e governadores tem os outros partiddos ditos esquerdistas?

      Quantos deputados, senadores e governadores tem o PT?

  7. A Frente possível HOUVE

    Só nao houve com quem nao quis tomar parte dela, ou só com condiçoes inaceitáveis. Ciro mostrou perfeitamente quem é no segundo turno (para quem ainda nao sabia). Agora é bola para a frente e parar de mimimi, isso nao ajuda nada.

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