Silêncios, silêncios, por Wilson Ramos Filho

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Silêncios, silêncios

por Wilson Ramos Filho

Sou pai. Quando as crianças ficavam muito quietinhas era sinal de que estavam aprontando algo. Interrompia a leitura e ia lá espiar. Sou filho. Meu pai sempre repetia “se a floresta está em silêncio é sinal que o tigre está passando”. O silêncio sempre é cheio de significados.

A maioria da população brasileira assistiu em silêncio aquela absurda decisão do parlamento que deu concretude ao Golpe de 2016. Era como se não fosse com ela, indiferente, lobotomizada pelos meios de comunicação, a população assistiu calada a deposição de uma Presidenta honrada por uma quadrilha de reconhecidos escroques. 

Vieram as primeiras maldades aprovadas às pressas pelos golpistas, congelaram os gastos públicos por 20 anos, entregaram a melhor parte de nosso patrimônio natural e mineral, e novamente o silêncio foi ensurdecedor.

Condenaram o Lula sem que tenha havido crime, sem provas, atropelando dezenas de normas jurídicas e constitucionais. Novo silêncio. As cortes superiores certamente haveriam de reparar a injustiça. A maioria da população acreditava na Justiça.

Os golpistas seguiram destruindo o Estado Social, acabaram com a CLT e com os sindicatos e fez-se novo silêncio. A justiça não aceitaria tamanhos retrocessos. O Judiciário, sabe-se lá por qual razão, ainda tinha quem nele acreditasse. O silêncio foi explicado: Lula voltará e acabará com essa palhaçada toda.

O TRF4, atropelando todos os prazos, em janeiro deste ano, não apenas convalidou todas as arbitrariedades contidas na condenação sem crime e sem provas contra Lula, como aumentou-lhe a pena para tornar perpétua sua prisão. Não houve sublevação ou insurgência. Estupefatas, desalentadas, as maiorias ficaram em silêncio. O Lula, quando voltar, haverá de desfazer as maldades praticadas pelos políticos golpistas e por esses juízes partidários e injustos, ouvi muitas vezes.

Os golpistas no Executivo e no Legislativo seguiram destruindo o futuro do país, aumentando as desigualdades sociais, mas a população parece ter decidido aguentar silente para dar o troco nas urnas.

Lula é preso. Sem crime, sem provas, sem que tenha havido o trânsito em julgado da sentença, o maior líder popular do mundo é encarcerado e a população aceita, calada e triste. Não haveria de durar muito a prisão, seríamos a sua voz, prepararíamos em silêncio uma grande festa para a sua volta.

Os golpistas no supremo fizeram todas as manobras para evitar colocar em pauta o tema da presunção de inocência que libertaria Lula para concorrer às eleições. E, contra a quase unanimidade dos juristas, o supremo permitiu a manipulação das pautas apenas para evitar a livre manifestação da vontade popular. E a população ficou em silêncio. Afinal as eleições se aproximam.

Um desembargador, destoando dos golpistas que compõem a Direita Concursada, sem que esperássemos, determina a libertação de Lula. Correria nos subterrâneos do poder, festas e comemorações. Ele estava voltando!!! Assistiu-se então o inimaginável para quem tem formação jurídica. Uma conspiração togada para, contra a lei, mantê-lo preso. As notícias recentes apenas colocam mais luz no que todos já sabiam. O golpe não era mais parlamentar, o golpe veste toga. Não houve, contudo, revolta nas ruas. Fez-se o silêncio.

Aparentemente, pelo que demonstram as pesquisas eleitorais, o povo brasileiro resolveu dar sua resposta nas urnas. Já não acredita nos partidos políticos que se conluiaram no Golpe, já não respeita, confia ou espera nada do Judiciário, o mais desmoralizado dos Poderes, já não crê no que assiste nas TVs, já não acredita em promessas. Sua resposta virá silenciosa, eloquentemente silenciosa, nas urnas.

Esse silêncio abrumador nos ensurdece e esfuma as nossas análises. O que será que o povo brasileiro está aprontando?

Wilson Ramos Filho (Xixo) é doutor em Direito, presidente do Instituto Defesa da Classe Trabalhadora – DECLATRA.

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

4 Comentários

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  1. Mais uma vez o povo

    Mais uma vez o povo brasileiro assiste bestializado o espetáculo grotesco das elites podres e servis desse país! Penso que as eleições não virão, ou, se vierem, serão, falseadas/falsificadas e o povo permanecerá calado, quieto!!! Sei lá, talvez seja o caso de investigar as caixas d’água desse país ou nos conformar com a nossa covardia, infinita e generalizada. 

  2. A única utilidade do Golpe

    A única utilidade progressista do Golpe foi o desmascaramento para o povo da corrupção constitutiva do poder judiciário, do ministério público, da pf, das forças armadas, do empresariado, do sistema bancário e do pig. As corrupções do legislativo e do executivo já eram carimbadas de longa data. Enfim, todas essas instituições que no mundo civilizado dão consistência à democracia dita formal, outra que também desceu pelo ralo. O antagonismo, a antipatia, a desconfiança por parte do eleitorado, com as quais terão de interagir, durará gerações. Noves fora, na perspectiva do tempo histórico e da pedagogia que dele emana, o golpe irá se configurar como mais um tiro no pé para o cambaleio ideológico da direita tupinambá, na razão inversa do aumento da importância simbólica e da valorização de uma liderança como a do Luis Inácio Lula da Silva, alçado à categoria de gênio da “raça”, herói mártir do Povo brasileiro.

  3. A resposta é assaz simples

    Há uma resposta simples a todos os questionamentos levantados pelo Dr. Xixo: o povo não se rebela porque não dispõe de armas e sabe que todo o aparato repressor e de força está com os golpistas. E NENHUMA revolução ou transformaçaõ social se faz sem três elementos básicos, como já dizia Lênin há mais de um século:

    1) – Povo, contingente de pessoas exploradas, mas com consiciência política dessa exploração;

    2) – Dinheiro/recursos materiais;

    3) – Armas, para combater o inimigo e derrubar o regime opressor.

    No Brasil o que temos é apenas parte do prmeiro elemento, uma massa popular, pobre, explorada, excluída, porém despolitizada e desorganizada. Essa massa despolitizada e desarmada, sem lideranças, não está disposta a encarar o aparelho repressor armado, cruel e assassino, pois milhares perderão a vida ou ficarão  mutilados. Essa a razão mais simples para explicar por que o povo brasileiro não se rebela contra essa espoliação, essa humilhação, esse desmonte e destruição do Estado Social e do Projeto de País, com Desenvolvimento Soberano e Inclusivo.

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