“Terrivelmente cristã”: uma síntese do governo Bolsonaro, por Mestre Yoda

“Terrivelmente cristã”: uma síntese do governo Bolsonaro, por Mestre Yoda

A fala da folclórica Ministra Damares Alves no dia de sua posse, afirmando que “o estado é laico, mas esta ministra é ‘terrivelmente cristã’” encarna com perfeição a alma do novo governo eleito. Das muitas maneiras de ser cristão, os integrantes do novo governo elegeram a pior, a mais terrível. Expressão de forma similar de cristianismo foi adotada a partir do século XIII pela Igreja Católica, no período que ficou conhecido como a Santa Inquisição.

Não custa lembrar que a instituição, à época, foi criada pela necessidade de condenar todos aqueles que eram contra os dogmas pregados pela igreja ou que eram considerados uma ameaça às doutrinas, sentimento que não falta ao novo governo. O resultado disso, hoje, todos conhecem: prisões temporárias ou perpétuas, linchamentos, fogueiras “santas”. Nestes tribunais, os prisioneiros não podiam saber, nem mesmo, os motivos de sua condenação; bastavam apenas duas testemunhas. Situação similar vivenciaram muitos prisioneiros políticos nos tempos da ditadura civil-militar-empresarial brasileira, uma espécie de Inquisição Laica.

Outra semelhança com a Inquisição Medieval é o clima de perseguição à ciência e aos cientistas. Galileu Galilei, que conseguiu escapar da morte em 1616, renegando suas convicções, é símbolo desta intolerância. Em pleno século XXI, em fala de 2013, Damares mostra que, como pastora, pretende estimular a ocupação do espaço científico pelos religiosos, além de criticar a “invasão” das escolas pela Teoria da Evolução. Além disso, sua postura discriminatória em relação às feministas é também similar à da Igreja Medieval em relação às mulheres que foram queimadas por práticas de bruxaria. Damares chegou a afirmar que feministas não gostam de homem e que são feias, o que é repetido à exaustão, nas redes sociais, por bolsominions. A diferença é que atualmente, não são verrugas e narizes compridos que incomodam, mas os ditos pelos nas axilas.

Damares é, como seus colegas de novo governo, apenas uma hipócrita. Adotou uma criança indígena, para doutriná-la para o pior tipo de cristianismo. Além disso, fundou a ONG Atini, acusada pelo Ministério Público de tráfico e seqüestro de crianças e de incitar o ódio aos indígenas. Em relação aos LGBTs, na mesma linha, disseminou, criminosamente, a famosa mentira sobre o tal “kit gay” e, deste modo, ainda que afirme que “protegerá os LGBT”, também contribuiu para liquidar as frágeis políticas dirigidas a este público, até então existentes.

Das tantas formas de ser cristão, alguns religiosos nos ensinam algumas muito melhores. Em 1996, por exemplo, o papa João Paulo II afirmou, em relação à Teoria da Evolução, que esta não constituía “mera hipótese”, sendo as evidências irrefutáveis. Frei Tito, Dom Pedro Casaldáliga e Dom Paulo Evaristo Arns dedicaram suas vidas à construção de um cristianismo mais politizado e fraterno. Pastora Sônia Mota uniu suas orações às de candomblecistas baianos, para celebrar o respeito entre as religiões. Padre Júlio Lancellotti dá assistência à moradores de rua em Sampa e, por isso, outros “cristãos” chegaram a ameaçá-lo de morte. O Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil (CONIC), em novembro de 2017, lançou uma campanha para angariar fundos para terreiros que foram depredados pelo fundamentalismo cristão. Bispo Renato de Souza, organizador da fraternidade “Amigos do Evangelho” movimento que surgiu na década de 90, oferece apoio religioso para vítimas de homofobia. “Não somos nem católicos nem evangélicos. Entendemos que somos uma nova forma de ser cristão, onde não excluímos, não condenamos, mas acolhemos a todos”.

Como se vê, em pleno século XXI, o que menos precisamos é de pessoas “terrivelmente cristãs”. Que a insepulta Inquisição seja relegada aos livros de história e que outras formas de ser cristão, nas quais impere o ecumenismo, o amor, o respeito e o cultivo ao saber sejam estimuladas.

Vá de retro, Damares, você e seu cristianismo medieval!

Redação

10 Comentários

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  1. A despeito de combater os

    A despeito de combater os “preconceitos” da Damares, o autor do texto incorre em “preconceitos” em relação ao “cristianismo medieval” período da História da Europa Ocidental que certamente sobre o qual não possui conhecimentos objetivos, daí o raso argumento preconceituoso contra Cristandade (Idade Média). Em tempo: o autor confunde as práticas violentas da “inquisição ibérica” com a “Primeira Inquisição”. 

    1. A floresta e a árvore

      Entre querer entender e poder entender vai enorme diferença.

      É uma questão de de alcance.

      Há os que vêem o mundo de uma janela ampla e do alto. São os que podem ver o todo.

      Há os que vêem o mundo de dentro de uma caixinha, só com um buraquinho para respirar e olhar.

      Não dá nem pra fazer as duas coisas ao mesmo tempo. Ou respira ou olha o mundo.

      O autor do texto vê o mundo de uma janela ampla e do alto.

      O comentador se manifesta de sua caixinha.

      É compreensivel e até louvável que, pelo menos, o comentador tenha a noção de que seitas como as que fizeram a damares, são consequência de uma dissenção da ICAR, a religião oficial do ocidente por milênios, coisas que os próprios crentes não sabem.

      Querer negar a inquisição e outras barbaridades cometidas pela ICAR desde sua instituição, entretanto,  é sim, evidenciar desconhecimento.

      Não há mal que possa  ser feito somente para justificar um bem que não implique em violência ou que redunde em benefício.

       

       

    2. Conhecimento objetivo? Sobre
      Conhecimento objetivo? Sobre o passado distante? Falou o positivista, que, aliás, se apega a detalhes para tentar desqualificar, mais do que o texto, o próprio autor, sobre o qual, aliás, não apresenta qualquer “conhecimento objetivo”

  2. Raivosa e intolerantemente cristãos – estes pregadores da guerra

    Bolsonaro se acredita um salvo, um redivivo pois usa de um poder lhe conferido para impor suas arbitrariedades, mentiras, repugnância, desprezo. Esquece ele que segundo Cristo, “bem aventurados os PACIFICADORES, pois DELES SERÃO os reinos do céu”

  3. Assino em baixa. Quando vi a

    Assino em baixa. Quando vi a frase da “ministra” fiquei espantado. Mas com este governo nunca iremos deixar de nos surpreender 

  4. ABAIXO a 

    ABAIXO a  inquição…

    brilhante artigo, esse governo é o espelho inqusitório….

    va de retro saTANÁs….

    UM CARA MAIS VINGATIVO, DIRIA:

    VÁ DE RETO, DONA DAMARES, PRÁ ENFIM SER MAIS FELIZ!!!

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