O festival de legendas e a irracionalidade partidária, por Cláudio Lembo

Sugerido por Assis Ribeiro

“Ou o Brasil acaba com o festival de legendas ou as legendas acabam com o Brasil.”

Do Terra Magazine

Irracionalidade partidária

Cláudio Lembo

Há um processo de esgotamento político em curso. A perda da essência da atividade política. Já não se busca o bem comum. Muito menos a preservação da República.

Cada um por si. Os outros que se danem. A criação contínua de partidos políticos leva a uma deplorável situação. A atomização de pólos confunde a cidadania.

Hoje, grosso modo, todas as legendas apresentam idênticos programas. As diferenças são pontuais. Já não se destacam, entre si, as agremiações partidárias.

Uma geleia real partidária foi concebida e, em momento seguinte, aprovada pela Justiça Eleitoral. Esta examina os aspectos formais dos processos de criação de novos partidos. Tudo certo, limita-se a homologar.

Não podia ser ao contrário. A lei estaria sofrendo violação. Há plena liberdade de concepção de novos partidos. Aqui a grande interrogação. Pode este processo permanecer?

A Constituição admite – e preserva – o pluripartidarismo. O Supremo Tribunal Federal, em acórdão histórico, se opôs a clausula de barreira. Esta permitiria a criação de partidos.

Só estariam, porém, no parlamento as agremiações que atingissem determinado número de votos entre os eleitores. Buscavam os autores da cláusula de barreira conferir racionalidade à Administração Pública.

Esta lei – meramente ordinária – aprovada pelo Congresso Nacional foi julgada inconstitucional. Esta decisão permitiu a explosão do nascimento de partidos.

Hoje, tornou-se um bom investimento constituir um partido político. A pessoa jurídica, com objetivo partidário, é isenta de tributos e, ainda, recebe parcelas do fundo partidário.

Se tanto não bastasse, contando com deputados federais, passa a participar do horário gratuito eleitoral nas campanhas e nos períodos de entre safra, ou seja, nos anos sem eleições, com espaço no rádio e na televisão para expressar seus programas.

É um barato. Só levam vantagens os dirigentes partidários. Fazem um esforço para a criação da agremiação e, depois, colhem as benesses. Entre estas o monopólio – ou reserva de mercado – para oferecer legendas aos interessados em concorrer nos pleitos eleitorais.

Não há, pois, atividade mais gratificante e repleta de salvaguardas na coletividade. Sem ônus e riscos. Nenhuma penalização pelo mau desempenho em suas funções.

Já é tempo dos parlamentares elaborarem uma efetiva reforma política. A questão não é o sistema de votação: o proporcional confere representatividade à sociedade. O problema esta na proliferação dos partidos políticos.

Todas as ideologias já foram contempladas. É hora, com fundamento no princípio da racionalidade, colocar um basta neste carnaval de legendas. No passado se dizia: O Brasil acaba com saúva ou a saúva acaba com o Brasil.

É tempo de repetir a velha frase, hoje, superada. Agora, seria oportuno afirmar: O Brasil acaba com o festival de legendas ou as legendas acabam com o Brasil.

 

É ingovernável um País que convive com tantos partidos sem definição doutrinária ou ideológica. É de enlouquecer qualquer um. É surrealista a realidade política nacional. Mais que isto: irracional.

Redação

7 Comentários

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  1. PARTIDOS PARIDOS

     

    Concordo com Cláudio Lembo, quando ele afirma que  “Só levam vantagens os dirigentes partidários. Fazem um esforço para a criação da agremiação e, depois, colhem as benesses. Entre estas o monopólio – ou reserva de mercado – para oferecer legendas aos interessados em concorrer nos pleitos eleitorais. “

     

    Antes de discutir “política” é preciso definir o que significa este termo. Hannah Arendt dizia que “política” é aquilo que existe no espaço comum voluntariamente criado pelas pessoas. Este espaço pode ser alargado, com aumento da liberdade e da igualdade. Mas não pode ser diminuído ao ponto de deixar de existir, porque quando não há espaço voluntário entre as pessoas não existe “política” e sim guerra e terra devastada que separa inimigos irreconciliáveis. 

     

    O Brasil não é e nunca foi produto da “política”, mas de uma guerra permanente. Cá chegaram uns portugueses aventureiros e impuseram sua vontade pela força, tomando as terras, as índias e a força de trabalho dos índios. Não havia espaço voluntário entre colonos e os índios, o que havia era a terra devastada. Estabelecidos na colonia, os colonos importaram os escravos, explorando-os até a exaustão e castigando-os de maneira impiedosa. A terra devastada que existia entre colonos e índios se ampliou pela aquisição de novos espaços devastados entre colonos e negros escravizados. 
     

    As conquistas que a esquerda considera históricas, como fim da escravidão e proteção aos índios, não conseguiram construir um espaço voluntário entre os campos inimigos, por dois motivos. Primeiro: nem a precária proteção aos índios (ainda considerados pouco mais que crianças) nem a libertação dos escravos (cujos descendentes seguem sendo abatidos como moscas pelas PMs) foi negociada. Tudo foi imposto como uma trégua concedida pelos brancos donos do Estado, tendo em vista seus próprios interesses. Segundo: como não há e nunca houve um espaço voluntário comum criado pelos atores sociais de maneira a por fim às chagas abertas pela colonização e escravidão, o Brasil permanece eternamente na ante-sala da barbárie colonial qualquer que seja seu regime político (muito embora não exista “política” no sentido arendtiano e sim apenas “regimes” que mascaram a inexistência dela) . Portanto, ninguém deveria estranhar a fragilidade dos partidos políticos brasileiros e a existência e a criação de legendas partidárias que permitam aos seus donos desfrutar as benesses do poder (disputa de cargos, salários e, principalmente, verbas eleitorais oficiais, oficiosas e até criminosas).

     

    Cá não há e nunca houve espaço voluntariamente criado pelos atores políticos e sociais. De um lado há uma elite que se considera magnânima, mas apóia com alegria a brutalização policial nas áreas pobres e favelizadas. De outro há uma imensa quantidade de pessoas-coisas a quem a soberania pertence apenas nominalmente por causa do “regime” adotado para mascarar a inexistência de “política” (vide Hannah Arendt). Desde que a população vote nos candidatos-donos das legendas ou nos produtos eleitorais preferidos da elite (que controla a mídia) não existe conflito, mas se a população ousar votar “errado” (quem diz o que é “errado” considera-se dono não só do Estado, mas dos votos que deveriam ser livres e investir livremente mandatários) o conflito latente e eterno renasce. Nos momentos de tregua o conflito toma a forma de disputas judicializados (caso dos Mensalões tucano e petista). Quando a tensão não pode ser mais aliviada através do Judiciário, o conflito é resolvido por intermédio de um golpe de estado (que a elite chama de “revolução” como em 1964). 

     

    O texto de  Claudio Lembo é importante, mas de certa maneira colabora para a preservação do impasse. Antes de discutir “política”, como uma categoria abstrata, ele poderia fazer como Hannah Arendt fez, tratá-la como uma categoria histórica para chegar a uma definição mais acurada que permitisse compreender o problema brasileiro. Só depois podemos começar a discutir como desfazer a terra devastada mediante a criação voluntária de um autentico espaço comum partilhado por todos. 

  2.   Discordo em parte.
     

      Discordo em parte.

      Acredito que – caso raro – vivemos um meio termo indesejável: é fácil criar partidos no Brasil, mas apenas para quem conta com uma certa estrutura de poder.

      Acredito ainda que as soluções possam ser duas, talvez até mescladas: de um lado, maior facilidade na criação de partidos por cidadãos interessados em ingressar na política (concomitantemente a maior rigidez e transparência no controle do financiamento) e, de outro, maiores exigências à entrada de partidos na arena nacional.

      Para exemplificar um pouco mais: por qual razão prática um grupo de cidadãos de, digamos, Mato Grosso do Sul, é impedido de criar um partido apenas para viver a política naquele Estado da federação? A impressão que tenho é que o país é grande demais para permitir a participação cidadã nos partidos – e, convenhamos, tirando um ou outro partido não há verdadeiros militantes. O próprio PSDB, que querendo ou não é um grande partido nacional, deu-se conta disso ao realizar prévias na cidade de São Paulo, domicílio de mais de 7 milhões de eleitores.

     

  3. Nesse caso não podem culpar o

    Nesse caso não podem culpar o Congresso. Este agiu conforme a constituição. A justiça, como sempre, melou tudo e declarou a lei inconstitucional, quando na realidade era uma boa lei. Combrem essa baderna que está aí lá no STF, são eles os verdadeiros culpados por esse festival de partidos novos.

    Quem manda ter um judiciário sem controle.

    1. “STF, são eles os verdadeiros

      “STF, são eles os verdadeiros culpados por esse festival de partidos…”

      Errado. O estopim foi a criação do partido do Kassab, PSD, com ajuda do Planalto.

      Ele criou a jurisprudência de puxar deputados de outras agremiações levando tempo de tv, que interessava ao governo (e não ao Estado!) para minguar o DEM.

  4. Nassif, uma observação a

    Nassif, uma observação a fazer:

    É no campo da direita que essa farra de criações e fusões partidárias se observa, veja atualmento o caso de DEM que, morrendo agora, está dando vida aos PROS, REDE e Solidariedades da vida, tudo com intúito de manter a ideologia do atraso com outros nomes… e olha que vai sobrar até para o PSB essa artimanha para manter vivos e com mandatos os velhos arautos do PDS, PFL, PL, PP, ARENA e todas as antigas denominações dos “liberiais” brasileiros… no DEM, imagino, só vão sobrar José Agripino e Rosalba Ciarline, um dos dois vai ter que um dia jogar a pá de cal no defunto.

    No RN, por exemplo, e particularmente em Mossoró, está havendo uma corrida alucinada dos “caciques” locais do DEMocratas para abandonar o navio outrora virtuoso… o tal do PROS é a legenda da moda por essas bandas agora.

  5. Troca-troca

    O movimento dos políticos no troca-troca de partidos, em ano pré-eleitoral, se assemelha a jogadores de futebol que mudam de time por melhores vantagens.

    Muitos desses 32 partidos políticos, nada mais são do que uma ‘banca de feira”. É vergonhosa a maneira como “se insinuam para serem cortejados”. 

    Representam, apenas, interesses pessoais, financeiros, vaidade e orgulho ferido.

  6. O problema da política

    O problema da política brasileira é que querem mudar sem mudar nada.

    Os partidos estão surgindo aos montes por quê?

    Por que para restringir o troca-troca de partidos fizeram uma lei proibindo. Porém, podia-se trocar de partidos se surgisse outro partido (era uma das exceções). Esta é a consequência de resolver um problemas complexos com soluções simples.

    O problema da política brasileira é a despolitização, ou seja, está faltando as pessoas individuais participarem mais da política, não necessariamente a partidária, mas também a partidária. Está faltando o povo se organizar mais, ocupar mais as praças, os parlamentos, questionar mais.

    Nós aqui do blog, que é o que existe de melhor, acabamos entrando na discussão pequena. Deixem os partidos surgirem, eles não significam nada, na verdade, estes partidos, em geral, servem mais aos interesses da direita, dos políticos pragmáticos, dos interesses regionais, em breve vão desaparecer da mesma maneira que apareceram.

    O que me impressiona é o presidente do stf entrar nesta discussão que não pertence a ele. Para ver que o cara é mediocre e está totalmente pautado pelas elites.

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