Déficit público: falácia ou misplacement?, por Décio Lima

por Décio Lima

A formulação de conceitos pode resultar de um ato de criação (transação direta entre a mente do pensador e o objeto da sua atenção), de uma descoberta casual (serendipismo) ou ainda da colocação apropriada de conceitos.

Contudo, há a possibilidade de ocorrer uma colocação inapropriada de conceitos (misplacement) que se for intencional remete ao que se conhece por falácia, ou seja, um raciocínio errado com aparência de verdadeiro.

Ultimamente na esfera pública temos percebido o emprego do discurso falacioso para convencer as pessoas de que o Brasil precisa de “uma ponte para o futuro” e que a sua travessia significa “um remédio amargo para colocar o Brasil nos trilhos”, medicamento esse que serviria para combater um mal – o déficit público.

Olhares atentos já perceberam que a política econômica do governo atual está baseada num engodo, em mal dissimulada farsa. Pretendem fazer crer que as políticas sociais dos governos Lula e Dilma quebraram o país e a eles (usurpadores) caberia reestabelecer a “ordem e o progresso”.

E assim amparados num enredo intencionalmente fantasioso pretendem o “ajuste” das contas públicas e do “rombo” da previdência. É o que está na pauta com as PEC’s 55 dos gastos públicos e da Previdência, ambas em trâmite no Congresso.

Mas a peroração do governo ilegítimo não resiste à verificação racional e objetiva dos números disponíveis, por exemplo, no site do Banco Central, bem como à análise de economistas não comprometidos.

Os usurpadores afirmam, sem rubores ou temores, que o governo federal gasta mais do que arrecada, mas omitem que relação entre receita e despesa para o exercício das atividades propriamente de governo (resultado primário do governo central) foi superavitário de 2010 a 2013 (1,8% do PIB na média), apresentou um pequeníssimo déficit em 2014 (0,4 %) e outro déficit moderado em 2015 (2% do PIB).

Em termos de comparação, sabe-se que a União Europeia entende como perfeitamente aceitável um déficit de 3% do PIB. Em suma, bem ao contrário do que ardilosamente diz o governo usurpador, os gastos com as políticas públicas não “arrombaram” as contas do governo.

Além disso, há outra artimanha ainda mais perniciosa, verdadeiro nó górdio do travamento da economia. É a questão dos juros nominais (taxa Selic). Dados do Banco Central deixam claro que grande da parte dos impostos em vez de servirem para infraestruturas e políticas sociais, são encaminhados para os bancos e outros financistas, inclusive, em pequena monta, para alguns aplicadores individuais.

Além de extorsivos os juros pagos no Brasil são ilegítimos porque não geram contrapartida produtiva. Em 2003 quando o Lula assumiu, a Selic estava em absurdos 24,5% ao ano. Ao final de 2012 a Dilma conseguiu reduzir essa taxa para 7,25% ao ano. Infelizmente a pressão dos banqueiros e de uma oposição oportunista foi tamanha que gerou um recuo nessa política. E os juros retornaram ao patamar de 14% ao ano.

Assim o percentual do PIB destinados aos juros e, portanto, transferido aos “rentistas” subiu de 3,2% em 2010 para 6,7% em 2015, incomparavelmente superior ao déficit das políticas públicas propriamente ditas (2% do PIB em 2015).

Além disso, os “defensores da austeridade” hoje no poder, irresponsáveis e sem compromissos com a Nação, aumentaram em 2016 o déficit primário para R$ 170 bilhões, para aumentar os salários de categorias privilegiadas do funcionalismo público, enquanto pregam à população a necessidade de sacrifícios. Pretendem que o povo, tal qual cordeiros se submeta a retirada de direitos fundamentais e ao cerceamento de uma aposentadoria digna e justa.

Contra a tragédia anunciada sob a forma da PLP 257, PEC55, e de outras medidas prejudiciais ao povo; contra as mentiras, falácias e meias-verdades; contra a retirada de direitos da classe trabalhadora; contra a tentativa de implantar um sistema degradante de aposentadoria; contra a destruição do Estado Democrático de Direito, enfim contra a verdadeira Caixa de Pandora que pretendem abrir em solo pátrio, estamos atentos e preparados para o bom combate.

Décio Lima é deputado federal – PT/SC

Redação

1 Comentário

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  1. PEC 55

    O relator especial da ONU para extrema pobreza e direitos humanos, Philip Alston, considerou a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 55 como sendo uma medida radical e sem compaixão, que ata as mãos dos futuros governantes com impactos severos entre brasileiros mais vulneráveis. Além disso, foi considerada uma violação de obrigações internacionais do Brasil.

     “Se adotada, essa emenda bloqueará gastos em níveis inadequados e rapidamente decrescentes na saúde, educação e segurança social, colocando, portanto, toda uma geração futura em risco de receber uma proteção social muito abaixo dos níveis atuais”.

    Segundo pesquisa da Folha, 60% dos brasileiros são contra a PEC 55.

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