Cesar Locatelli
César Locatelli, economista, doutorando em Economia Política Mundial pela UFABC. Jornalista independente desde 2015.
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E se Mantega tivesse continuado na Fazenda?, por César Locatelli

Enviado por Ronaldo Braga

Do Jornalistas Livres

E se Mantega tivesse ficado?
 
César Locatelli, especial para os Jornalistas Livres
 
Guido Mantega, depois de 12 anos em diferentes cargos no governo federal, deixou o governo com grande desaprovação, tachado de incompetente e responsável pelo crescimento baixo da economia do país e pelo desajuste das contas do governo. Joaquim Levy, que o substituiu no início de 2015, saiu em menos de 1 ano, contribuiu para o aprofundamento da nossa crise econômica, é tido como um ministro competente que não teve o apoio necessário para ser bem sucedido.

Será que essa história de Mantega e Levy está sendo contada fielmente? Será que todos concordam com essa versão dos fatos? Bem, vamos a uma opinião diferente. Vamos começar falando sobre a dificuldade de se separar a economia da política.

Outro dia, ouvi um deputado federal dizer que a crise política só se resolverá com o fim da crise econômica. Sinto informar, senhor deputado, que não existe a menor chance de sairmos da recessão sem antes, minimamente, desatarmos o nó político. Se consumidores e investidores não conseguem enxergar o horizonte político, não podem igualmente ver o horizonte econômico. Retraem-se implacavelmente. Sem consumo e sem investimentos a economia degringola, como estamos vendo.

No início do capitalismo não havia separação entre a política e a economia. Eram matérias inseparáveis, partes de um mesmo todo. Em dado momento ficou mais “vantajoso”, mais fácil de convencer a opinião geral se a economia fosse tratada como uma ciência da natureza. A política, coitada, não teve outra saída senão continuar a ser tratada como ciência social. Muitas vezes na história se viram governantes ungidos por poder divino, governavam por “força da natureza” como, até hoje, tentam nos convencer que é a economia. As diferentes teorias econômicas, no final das contas, atendem diferentes interesses políticos, de classes sociais.

A verdade, então, é que nem Mantega nem Levy criaram a crise política. Cada um deles faz parte de campos diferentes. Mantega militou por desenvolvimento com distribuição de renda. Levy queria o ajuste fiscal e a queda da inflação a qualquer custo. Mas ambos são impotentes, assim como qualquer outro economista, para fazer o país crescer quando o poder econômico tenta todas as artimanhas para derrubar a presidenta. Medidas econômicas não conseguem sobrepujar os efeitos perniciosos do golpismo.

Quando a presidenta foi reeleita, o que significava apoio da maior parte do povo, tentou conquistar também os donos do capital: banqueiros, industriais e endinheirados em geral. Levou para chefe da equipe econômica um economista neoliberal insuspeito para os ricos. Dilma estava tentando lidar com uma crise política instalada em que o poder econômico, os meios de comunicação e a classe política não aceitavam o resultado das urnas. Tentava um pacto para governar. Era como se a presidenta dissesse: “abro mão da política econômica em troca de poder governar e continuar minha política social”. Mais ou menos como Lula fez ao ceder, por anos, o Banco Central a um banqueiro.

Na posse de Levy, o país vinha de gastos do governo acima das receitas. A tentativa de desviar o rumo de uma recessão, implicou gastos e investimentos maiores. Depois de muitos anos de superávits primários, gastamos em 2014 mais do que arrecadamos, mesmo antes de considerar as despesas os juros da dívida pública. Compunham o quadro, também, inflação em alta e preços administrados atrasados, especialmente derivados de petróleo. Atrasados no sentido que já deveriam ter sido reajustados muito antes, mas não foram para não se fazer pressão na inflação.

Ainda com Mantega no comando, o governo tentou incentivar a economia, enfraquecida, dentre outras razões, pelo quadro internacional, diminuindo impostos de alguns setores. Imaginava-se que com menos impostos os empresários venderiam mais, lucrariam mais, investiriam mais e atuariam como motores a propulsionar a economia para o crescimento. O conjunto dessas ações, aumentar o gasto público, segurar preços públicos e subsidiar alguns setores, não resultou em crescimento econômico em 2014. Possivelmente, no entanto, ajudaram o país a atravessar mais suavemente os anos após 2008, quando o mundo experimentos a maior crise econômica desde a depressão de 1929.

A teoria neoliberal advoga que o governo deve manter suas contas ajustadas a qualquer custo, ou seja, não gastar mais do que arrecada, mesmo que isso signifique desemprego e miséria. Deve, ainda, lutar com todas as armas para manter a inflação baixa mesmo que isso implique recessão.

O que nosso novo ministro neoliberal enxergou foi uma economia estagnada, o governo gastando mais do que arrecadava e preços, que tinham impacto nas contas do governo, que precisavam ser reajustados. Suas ações tiveram o objetivo de corrigir todos esses desajustes. Ao mesmo tempo e de uma só vez aumentou preços que estavam sob seu controle, cortou gastos e investimentos, aumentou impostos, cortou subsídios.

Ocorre que em economia nunca existe uma só saída e as soluções podem ser graduais. Ao fechar todas as torneiras e decidir corrigir todos os desajustes de uma só vez e ao mesmo tempo, o ministro deu um sinal inequívoco para consumidores e empresários de que haveria uma recessão brava: o pé no freio não deixou dúvidas para ninguém. Quem não freasse da mesma forma, arriscava-se a dar de cara com um muro logo à frente. Acelerar os negócios e ser pego por uma recessão é o caminho mais curto para a bancarrota. E de quebra levou a inflação para cima de 10%.

O resultado, que era previsível desde o começo, foi que a arrecadação do governo piorou muito, pois a economia em recessão gerou menos impostos e todos adiaram seus planos, fossem eles de consumo ou de investimento. Círculo vicioso é o nome que se dá ao fato de o governo ao aprofundar a desaceleração da economia, também gerar menos impostos. Com arrecadação menor, o governo precisa gastar menos ou retirar mais recursos da economia, isso aprofunda ainda mais a recessão, numa sequência sem fim de eventos que retroalimentam a desaceleração econômica. Receita neolibral clássica muito aplicada pelo Funso Monetário Internacional para colocar de joelhos os emergentes endividados.

Dilma tentou conquistar apoio do poder econômico ao nomear o Ministro da Fazenda. Não conseguiu, perdeu apoio de parte de seus eleitores e contribuiu para uma recessão maior do que o necessário. O desemprego subiu e o investimento caiu, ambos de modo bastante veloz, a inflação mostrou suas garras e a crise política se agravou.

Uma economia em recessão, num cenário de fraqueza da economia mundial, contou com um ministro que alardeou a austeridade aos quatro ventos e apertou todos os freios que tinha a seu alcance. Agregue-se a tudo isso o nevoeiro político em que golpistas de todos os matizes tentavam derrubar a presidenta. O resultado, agora conhecido por todos nós, não poderia ser outro: uma tempestade perfeita sobre uma economia que, em 2014, tinha alguns problemas, mas estava muito distante do abismo.

Certamente os economistas neoliberais, que abundam em nossos meios de comunicação, não admitirão a responsabilidade de Levy por grande parte do tombo que nossa economia sofreu em 2015.

Mantido Mantega como ministro da fazenda, o apoio político não teria vindo. Como de fato não veio nem com Levy. Mas esses erros, que tiveram papel central no aprofundamento da crise econômica e na aceleração da inflação, certamente, não teriam sido cometidos. Outros menos importantes talvez, esses não!

 
Cesar Locatelli

César Locatelli, economista, doutorando em Economia Política Mundial pela UFABC. Jornalista independente desde 2015.

10 Comentários

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  1. Difícil fazer uma projeção

    Difícil fazer uma projeção sobre a história na base do se. Penso que algumas medidas como o reajuste de preços administrados viriam de um jeito ou de outro. O que Mantega poderia ter feito de diferente era evitar a estratégia da paulada nos preços administrados e na demanda ou ter usado um pouco mais as reservas internacionais para suavizar a desvalorização que era outra coisa que tinha que ser feita também. Talvez as receitas da união não tivessem caido tanto, mas as despesas também não teriam sido tão contingenciadas. A grande diferença entre ambos, penso eu, seria no crescimento da dívida pública. A estratégia ortodoxa maximiza o crescimento da dívida, por mais curioso que isso possa parecer.

  2. Troca de papéis

    Acho melhor botar os ministérios que conjugam o verbo “fazer” para injetar atividades produtivas e um desenvolvimento planejado do Brasil. O Ministério da Fazenda vá por trás, de paletó e gravata, levantando números, estatísticas e colocando em gráficos bonitos para mostrar ao mercado.

    Hoje está tudo trocado, o Ministério da Fazenda formula hipóteses aceitáveis pelo mercado, e a economia real se “vira” dentro do quadro traçado. Ainda o preço dos nossos produtos de consumo interno é fixado pelo “mercado” externo.

    Se um “marciano” pudesse observar o Brasil se perguntaria como é que um lugar onde tem de tudo possa ser deficitário.

  3. Viva a usura! Viva!

    Nada de novo.

    Falar de economia ou ciência econômica – dê o nome que quiser dar, não interessa – é o mesmo ou quase o mesmo do  que falar,pensar, planejar e implementar formas de ENGANAR um bando de otários  que trabalham e acreditam que com o trabalho mudarão suas vidas, NOS MESMOS MOLDES propogados pelos “capitalistas”. Sempre mais  ad infinitum. Evidentemente, coeteris paribus.

    Trata -se de uma ciência falaciosa  que gera riqueza para alguns, mantendo tudo mais constante. Só isso.

    No entanto, confesso -lhes que a cada dia que passa procuro  mais e mais e mais e muito mais   acumular qualquer centavo e/ou  riqueza que consigo, a fim de  entrar para o pequeno grupo dos que contratam empregados do tipo  “economistas”  para que estes cumpram o papel( façam o serviço sujo) de   vender sofismas sobre a racionalidade do homem natural no sistema de preços, cujo consumidor é  rei, e que a demanda precisa estar aquecida  para que possamos reduzir os “custos” e  blá, blá, blá de sempre. Demanda aquecida de empregados, é claro. Daí, fica fácil fazer um “convenção coletiva” para reduzir “custos”.

    Enfim, aquelas baboseiras meritocráticas enganadoras de sempre mas que são cuidadosamente separadas dos INTERESSE e da POLÍTICA que escondem por trás.

    Pena que não sou um “empreendedor” daqueles que recebem o empreendimento, e portanto, a “meritocracia”, via herança, com baixos tributos. Pena. Seria um ótimo começo para o “empreendedorismo”. 

    Voltando.

    De vez em quando, esses “empregados” – os economistas, notadamente sofistas – reunem-se aqui e ali para dizer que o meio ambiente não suportará isso, ou que é preciso “gerar empregos formais” para saírmos da “crise”, para o bem da “nação”, para o… blá blá blá,  e continuam com as BABOSEIRAS.

    Argumentos rasos e falaciosos não faltam. Uns dizem  que não se trata uma ciência de “soma zero”, logo, todos ganham. Outros dizem dque a  “mobilidade social” vem mudando,  outros que precisa investir em infraestrutura para crescer, crescer e crescer até a eternidade, e por ai vai o monte de BABOSEIRAS que camuflavam os interesses.

    Essas baboseiras são propagadas diariamente para “convencer” e vencer a MASSA de trabalhadores imbecis que recebe SALÁRIO que, vale lembrar,  é contabilizado como DESPESA. Mas, adminstrativamente, são tratados carinhosamente como “colaboradores”.

    Ora, ora, ora, colaborador um ova!

    Se você se encaixa num destes – que são tratados românticamente como “colaboradores”-  exija respeito. Peça para ser tratado como empregado, obreiro, subordinado, razão pela qual, cumpre ordens, NADA democráticas. Trata-se de um contrato sinalagmático.  Um presta serviço e o outro paga. Individualmente, seu empregador, aquele que manda você fazer ou não fazer algum trabalho e que lhe paga por isso, é SUPERIOR  a você, isoladamente. Para você se igualar a ele, isto é, ao SER COLETIVO que ele é, você NECESSITA de ASSOCIAÇÃO. Trabalhadores do mundo uni-vos”! Só que nossas “associações também precisam ser , digamos, “reformadas”. Nada de BABOSEIRA municipal, por exemplo!

    Lado outro, se pensarmos bem, economistas são fabricantes e também  vendedores de ideias. Sim!  Fabricam e vendem  “ideias”  para um monte de desorientados. Por exemplo, fabricam e vendem “crises” econômicas quando no fundo a crise é de INTERESSES e está sendo fabricada.  Fabricam e vendem “crises políticas” quando no fundo o CONFLITO é de uso ou abuso do poder. 

    Economistas aceitam pedidos. Negociam pedidos e vendem pedidos, mesmo antes de fabricar o produto. 

    Ex: determinado segmento do “mercado”( aquele ser humano que vive em algum lugar) pede para um economista de viés xyz fabricar um crise tal e vendê-la a preços de mercado, com custos de fatores. Este economista procura a bolsa de fabricação de “valores” , mais conhecida como grande mídia, ou mírdia( se preferirem) para “negociar” a venda da “crise” e fomentar o “mercado de mentecaptos trabalhadores que pegam ônibus lotado.  Logo, logo, os “economistas” cooptam várias “clientes” para seu cliente. E assim vamos vivendo como idiotas.  

    Acreditem, alguns vendem ( ou já venderam) que no “reino dos céus” todo aquele que trabalha duro e não reclama, terá o seu lugar garantido. Ao contrário daqueles que praticam a USURA e o hedonismo por exemplo.

    Todavia, se pensarmos bem,  não é exatamente a USURA em conluio com o hedonismo em âmbito mundial ,que estão dominando cada vez mais nossos hábitos e costumes, nossa cultura, nossos “valores”, nossa “ética”, nossa “moral” nesse mundo? Mormente,  com a quebra do muro romântico em 1989?

    Ora, ora, ora, Viva a usura meu caro! Viva o hedonismo! Viva a “alma” protestante!

    E , se refletirmos bem entre nós, por que não dizer: viva a revogação dos incisos I a VIII do artigo 192  da Constituição da “res privada”  federativa do Brasil.

    Viva o Estado oligárquico de direito burguês!

    Salve! Salve!  a “neo”  obsolescência programada! Viva a liberdade! 

    Abaixo a igualdade vez que essa é coisa de comunista, barbudo, tarado, revolucionário, fabiano, ladrão, vagabundo, preguiçoso, analfabeto entre outros adjetivos.

    _________________

    Por fim, no fundo, estou torcendo para que, de fato, venha mesmo a crise fabricada e vendida.  Quem sabe assim não consigamos finalmente, realizar as “reformas” político, agrária, tributária, previdenciária, trabalhista, administrativa, do executivo, do judiciário, do legislativo, do asfalto, do minério, da lama do rio outrora doce, da casa do vizinho, do quintal, da casa do cachorro, da escola, do ensino, da educação,  o botox da mulher,  do marido, do concunbino(a) enfim, todas as infinitas reformas de “base” e sem base “política” que tantos “economistas de escol e de meia tigela” ficam “falaciando” por ai?

     

    Saudações 

  4. Levy surpreendeu a mais otimista expectativa dos clientes dele.

    Congresso, se não fosse financiado por empresários e banqueiros, fixaria limites de despesas de juros do Governo, economias supostamente sérias tem despesa de juros no máximo de 1.5% do PIB.

     

    Despesa de juros elevada e falta de recursos. A justificativa para governo fazer mais privatização. Entrega de patrimônio publico, de prédios a negócios estratégico ( comunicação / mineração / energia ) a grupos nacionais e estrangeiros. Obviamente aos Engenheiros do processo a sua Contribuição pela Movimentação Financeira – Asset Management;

     

    Levy, veio diretamente do Mercado para comandar o Ministério da Fazenda e dar pitacos, como membro do COPOM do Banco Central do Tombini que presta contas ao Mercado e não presta contas a Presidente que o nomeou.Conta de juros não tem limites no orçamento. Não existe lei de responsabilidade financeira. O crime perfeito.  Mentes brilhantes. 

     

     

    Plantou no país a estagflação deliberadamente. Vilania travestida de incompetência 

     

    Sangue-sugas, improdutivos, do mercado financeiro, que estavam correndo risco de trabalhar, com Levy voltaram a lavar a égua com ganhos financeiros exorbitantes .  Como resultado levou Diretoria do Banco Mundial. Obviamente, por indicação do Fed, BCE, FMI, Obama, Psicologo Trabuco e brilhantes colegas dele quando do governo tucano estão todos felizes com o resultado da performance.

     

    Quanto maior a inflação maior taxa de juros, maior ganho financeiro real.

     Depois de extinta a ORTN, BC faz correção monetária dos vagabundos,  via taxa SELIC.  O raiz do desajuste financeiro do país

     

    Se quiser colocar o pais de volta no crescimento e acabar com desemprego do pais, Dilma falta exonerar Tombini e nomear para o BC um servidor público, de Universidade, na sentido sério da palavra, par acertar reduzir a sangria de R$ 400 bilhões do orçamento,

    Simplesmente o maior programa de transferência de renda para magnatas, dignna do Guinness Book..

     

    Desonerar encargos sociais de pessoas trabalhando e mais eficaz e logico do que as medidas e incentivos para Empresas sustentarem o Trabalhador sem trabalhar.

     

    Governo querer matar o trabalhador de vergonha ou vicia-lo na vagabundagem.

     

  5. Loucura
    A crise politica começou no resultado das urnas. Porém a crise económica ja estava instalada, já era sentida no bolso, mas os numeros eram maquiados, escondidos, velados, nas tais pedaladas fiscais. Não adianta ficar repetindo essa loucura, pois mentira não vira verdade no mundo real, só no mundo da propaganda.

  6. Sacrificado injustamente

    Mantega é competente, apenas foi a vítima mais visível do terrorismo econômico que os perdedores de 2014 logo fizeram para forçar o governo a mudar o rumo da economia. Infelizmente a mudança foi feita nas base do tal “ajuste” que é igual à “austeridade” que é igual a ARROCHO, ou seja, medidas que levaram TODOS os países que as adotaram ao abismo.

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