Governo deve facilitar tomada de crédito com “renúncia fiscal”

Jornal GGN – O Ministério da Fazenda está confiante de que a medida adotada na quarta-feira passada (4) de zerar o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) para mais operações de captação e financiamento externo deve normalizar a situação no mercado.

O Ministério da Fazenda anunciou a redução do Imposto que incide sobre os empréstimos tomados por empresas e bancos, diminuindo de 360 para 180 dias o prazo médio das captações externas que têm incidência na alíquota zero do IOF. Para as operações inferiores a seis meses, a alíquota de IOF continuará em 6%. No passado, o Brasil já precisou de medidas bruscas diante do excesso de capital. Mas para Guido Mantega, a decisão deve mesmo facilitar a captação de recursos no mercado externo, com reflexos positivos sobre custo e oferta de recursos. A alteração proposta tem custo fiscal estimado em R$ 10,31 milhões para o ano de 2014, R$ 18,19 milhões para o ano de 2015 e R$ 18,44 milhões para o ano de 2016.

A pergunta que fica é: isto vai mesmo trazer dólares para o Brasil? De acordo com Pedro Galdi, da SLW Corretora de Valores e Câmbio, o governo se contradiz quando anuncia medidas e volta atrás depois, a chamada “renúncia fiscal”, mas acredita que esta providência pode mesmo favorecer a tomada de crédito no exterior.

“Esses seis meses de abono do IOF facilitará às empresas capturar investimentos no exterior. Com a queda das taxas de juros anunciadas pelo Banco Central Europeu, por exemplo, isso ajuda as corporações a trazerem mais dólares para o país. Ou seja, com a moeda depreciada, a inflação não sobe. É um círculo”, explica.

O especialista diz que a forma encontrada pelas lideranças econômicas de facilitar a vida das empresas a captarem recursos, abrindo uma porta para quem quiser emprestar, seja qual for o setor. Mas, de acordo com ele, quem mais ganha com esta facilidade nas operações realizadas a partir de um ano é mesmo a indústria. O setor vem patinando em todos os segmentos, com muita desconfiança sobre o futuro econômico do país. Para eles, a notícia foi excelente”, conclui.

“Do ponto de vista de captação de curto prazo, parece interessante, embora não seja exatamente disso o que o país precisa, para o momento”, opina Celso Grisi, da Fractal Consultoria e professor da Universidade de São Paulo. “Os efeitos serão muito modestos, não espere desta medida impactos muito profundos na economia. Inclusive, esse caráter intervencionista do nosso governo atual de interferir no curso natural das coisas é algo que ‘pega mal’.  O que se busca no mundo hoje é absolutamente o inverso: cada vez menos intervenções no fluxo de dinheiro”, analisa.

Para Grisi, a intervenção é positiva já que retira um imposto importante, mas não é algo que deva mudar substancialmente o cenário. “São captações junto a bancos de desenvolvimento, empréstimos interbancários, financiamento de importação e exportação, etc. O que pegou o ministro é que até mesmo a importação de máquinas industriais, bem como os aluguéis disso, caíram bruscamente. O que reflete algo parecido com a recessão, já que a nossa atividade econômica diminuiu muito. Isso foi para manter algum ritmo, mas não é o suficiente”, completa.

Na prática, medida pouco ajuda

Para Andrew Storfer, diretor de economia da Anefac (Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade), o governo federal está em uma situação em que o câmbio precisa ser mantido baixo para conter a inflação, mas essa é apenas uma parte do debate. “Nessa altura do campeonato, com a inflação batendo no teto da meta, PIB crescendo pouco e a situação fiscal difícil, toda ajuda é bem vinda”. O executivo diz que, no curto prazo, a medida faz com que se tenha um incentivo adicional para o capital que está entrando no país, mas seu alcance é limitado. “Isso mostra que a situação atual está delicada, e o governo não quer colocar a meta da inflação em risco em hipótese alguma”.

Storfer explica que o alcance da medida será limitado justamente por atingir linhas de prazo mais curto. “A questão de crédito necessário de curto prazo é o chamado crédito de desafogo, para situações que estão críticas tanto para as empresas como para as pessoas físicas. A pessoa física encontra-se pressionada pela inflação e menor renda disponível, o que pode aumentar a inadimplência e, pelo lado das empresas, a atividade econômica está em queda e existe uma dificuldade crescente em se obter capital de giro. O alívio que pode ser dado é mais emergencial do que em prazos mais longos”.

Tal visão é compartilhada pelos bancos – que, de forma geral, indicam que não existe mesmo remédio mágico de curtíssimo prazo. Ao menos é o que acredita o superintendente executivo da tesouraria do Grupo Santander, Maurício Auger. “O que realmente falta e vem sendo discutido há muito tempo é o gargalo de estrutura, dúvidas dos participantes sobre a capacidade do governo de deixar o mercado ditar algumas regras naturais. É importante ressaltar isso porque não necessariamente a redução mirou somente na captação externa: essa dedução já era feita pelas instituições bancárias, para que o cliente não tivesse uma dívida em dólar no balanço. Acredito que a medida não mire somente uma melhor entrada de recursos ou concessão de crédito. Ela foi criada apenas para estabilizar uma curva. Nem mesmo o governo esperava que ela tivesse um grande um impacto da economia”, explica.

Auger afirma que, na verdade, ao contrário do que se esperava, a medida não foi tão bem digerida pelo mercado.

“O que mudou com o corte foi só a operação de curtíssimo prazo. Há um ano, já não tínhamos os 6% de IOF. Para o cliente que se interessaria por essa linha, já era possível fazer. A mudança só alterou empréstimos de 180 dias. O efeito no mercado dessa operação é muito tímido e contrário do que se esperava. Quando se toma uma medida como essa, libera-se um pipeline de operações que favoreça o tomador final. Uma alteração na regra, na percepção do mercado, é adverso, tanto que a reação do câmbio foi neutra pra negativa”, conta..

Além de ser uma decisão de impacto discutível, a medida pegou um pedaço muito pequeno do mercado. “Claro que os investidores tendem a gostar mais de regras amigáveis, no entanto, o efeito foi e será muito fraco. Tudo isso aconteceu próximo a um dia em que dólar deu uma ‘pequena escapada’. Parecia que o governo brasileiro estava querendo conter esse avanço. Mas acredito que nem mesmo eles estavam esperando por isso. Foi difícil entender a real proposta do anúncio do ministro. Tiraram uma tributação? Fizeram uma correção? Alteraram uma regra, sem aviso prévio? Qual foi a real intenção? Isso não ficou realmente claro para o mercado”, finalizou.

Redação

2 Comentários

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  1. Batendo cabeça

    Qual será o impacto dessa medida? Atrair capitais especulativos de curto prazo, basicamente quem quer se beneficiar com operações de carry trade.

    Não terá o menor efeito de fundo sobre a situação da indústria, pelo contrário pode piorar ainda mais a competitividade, com a apreciação do câmbio.

    Política cambial e econômica totalmente errática, o prazo mínimo de permanência dos capitais de fora tem variado feito gangorra nos últimos anos, passando de 90 dias a 1 ano a 2 anos a 3 anos a 5 anos, 2 anos novamente, 1 ano, e agora 6 meses. Ou seja, 8 alterações de prazo desde o início de 2011!

    Depois o governo quer que empresa invistam, quando não tem capacidade para dar a elas um horizonte estável nem um mínimo de certeza sobre o que ocorrerá no futuro próximo.

    Desculpem, mas é muita incompetência…

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