A concorrência ao malufismo, por Maria Cristina Fernandes

Do Valor

O malufismo sob dura concorrência
 
Por Maria Cristina Fernandes
 
Foi na reforma da Previdência que o PSOL soltou-se da costela do PT. Mais tarde, a defecção acabaria por compor o enredo que passaria aos autos como o ponto de partida do mensalão. Na história escrita pela toga, foi por temer a deserção dos seus que o governo petista teria financiado a ampliação de sua base parlamentar.
 
Para se adequar à Carta ao Povo Brasileiro, o PT começava a se distanciar da mesma base que, oito anos antes, se aglutinara sob seu comando quando o PSDB mandou reprimir manifestações antiprivatizações.
 
A repulsa à criminalização dos movimentos sociais cimentou a união de tudo quanto era de esquerda em torno da eleição de Luiz Inácio Lula da Silva.
 
Quando veio o mensalão, Lula buscou apoio na mesma base, mas já não contou com a adesão daqueles que tinham se bandeado para PSOL, PSTU e seus congêneres sindicais.
 
Em junho, o PT descobriu que aquela turma do carro de som havia envelhecido nesses anos em que desaprendeu a fugir da polícia. As bandeiras de partidos de esquerda e sindicatos queimadas assustaram até mesmo o líder máximo petista, que percebeu não ter ascendência sobre os manifestantes.

 
Desde a chegada do lulismo ao poder, os partidos que deserdaram o PT permaneceram nanicos no Congresso e se consumiram em lutas internas. Parecia seguro ao PT que dali não viria concorrência.
 
O PSOL viu nas manifestações a oportunidade que os quase dez anos de existência parlamentar não lhe havia proporcionado. Foi o partido que mais filiou manifestantes para disputar a eleição de outubro. De isca, usou o discurso de que os black blocs não deveriam ser criminalizados.
 
De eficácia eleitoral ainda duvidosa, a estratégia de aproximação das ruas não parece ter sensibilizado o PT, que pouco fez para converter os rojões as suas bandeiras.
 
Dois apelos parecem ter mobilizado mais o partido, um colhido de audiências com o empresariado, e o outro, de pesquisas encomendadas a seus marqueteiros.
 
Temerosos com a escalada das depredações, patrocinadores da Copa, como mostraram Letícia Casado e Guilherme Serodio, do Valor, começaram a bater às portas de governos estaduais e do Palácio do Planalto para pressionar por mais segurança.
 
A adesão de parlamentares que batem ponto no Instituto Lula à ideia de que o país está sob ameaça terrorista, é um sinal de que o ex-presidente pode ter sido alvo de queixas semelhantes àquelas que chegaram a sua sucessora.
 
Na outra ponta, aquela que elege e derrota, o discurso da ordem também ganha adeptos. Pesquisas mostram que a dita classe C demonstra querer segurança para preservar aquilo que foi conquistado nesses anos de inclusão social.
 
Uma conjuntura de mais oportunidades de ascensão sem condições de transporte, saúde ou educação para usufruí-las serve de combustível para mobilizações. Esta mesma conjuntura produz, num outro conjunto de pessoas, a expectativa de que se possa manter aquilo que foi adquirido nesses anos de inclusão.
 
É em resposta a pressões e medos que parece agir a nova onda de criminalização. Ao longo dos últimos 20 anos o país tem assistido ao endurecimento de sua legislação penal sem que a violência tenha diminuído.
 
Parece inevitável que essa discussão em ano de eleição e Copa do Mundo produza leis ainda mais duras. E igualmente inescapável que, no fechar das urnas, o eleitor não se sinta mais seguro com a vigência do novo papelório.
 
Podia ser mais fácil explicar que se o brasileiro, seja manifestante ou não, depreda patrimônio, agride ou mata, dispõe-se de um caminhão de leis para puni-lo desde que haja uma polícia municiada de conhecimento e comando para fazê-lo. Mexer no vespeiro da reforma das polícias, porém, rende menos apoio e voto.
 
O que mais surpreende no palavrório punitivo é que, antes de o ministro da Justiça de se manifestar e direção do PT soltar nota para segurar os seus, o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) tenha tomado a dianteira para explicar que morte do cinegrafista foi ato assassino e não terrorista.
 
Não por acaso a nota do PT, em que o partido diz não endossar a criminalização dos movimentos sociais, foi divulgada no mesmo dia em que o MST juntava os seus na Esplanada em confronto há muito não protagonizado pelo movimento.
 
A volta de Miguel Rossetto ao Ministério do Desenvolvimento Agrário, petista de diálogo com os sem-terra, pode segurar o mais aguerrido dos movimentos organizados, mas diz pouco sobre o que o governo pretende fazer com os desorganizados.
 
Terrorismo e manifestações sociais têm produzido em toda parte leis mais cerceadoras, que, em muitos países, têm sido concomitantes à deterioração das condições de vida da população. A repressão se segue à revolta pela perda de direitos.
 
O Brasil pega o trem na bitola errada. Num país com 5% de desemprego é o ritmo da expansão de direitos que deveria puxar o vagão. Que se prendam vândalos e assassinos e se permita que o debate eleitoral se paute pelas condições em que a expansão de direitos sociais pode se dar.
 
A transição de Lula para Dilma se deu sob o mote de que o Brasil tinha se mantido a salvo das tempestades financeiras de 2008 que, em boa parte do mundo, causou protestos. O vagão em que o Brasil foi colocado, e isso parece cada vez mais claro nesta sucessão, aportará em 2015 numa estação em que, sem arrocho, não vai caber todo mundo.
 
É o que fazer para dividir os custos desse arrocho, e não o terrorismo, que deveria pautar o debate. A presença do PT na liderança desse palavrório punitivo sugere ao eleitor que não há nada garantido nessa sucessão.
 
As nuvens ausentes desse verão escaldante ameaçam chegar carregadas de conservadorismo. Tantos são seus porta-vozes que ninguém mais procura aqueles que um dia se orgulharam de ser os únicos guardiões da lei e da ordem num país sob ameaça esquerdista.
 
Para ser ouvido esta semana, o deputado Paulo Maluf precisou enviar uma carta aos jornais em solidariedade à apresentadora de TV que defendeu a justiça com as próprias mãos.
 
Maria Cristina Fernandes é editora de Política. Escreve às sextas-feiras

 

Redação

8 Comentários

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  1. O movimento aéreo esta muito

    O movimento aéreo esta muito grande!!!

    Não temos autorização para pousar….então temos que dar voltas, voltas, até abrir espaço ou ir pra outro aeroporto.

    voltas, voltas,…….

  2. ô testinho ruim

    Tive a pachorra de ler inteiro e nunca vi uma tentativa mais fraca de transferir ao PT a conta da missao patriotica. Se a dita cuja nao sabe, o relator da emenda do combate ao terrorismo no senado chama-se Romero Jucá.  Que senadores do pt como o Pain e o Jorge Viana apoiem,  nao significa que seja questao fechada pelo partido, até porque o proprio Rui Falcao declarou que o pt nao pode apoiar qualquer criminalizaçao de movimento social.  Ah, e como nao poderia deixar de ser, a dita cuja ja vem falando em arrocho.  De fumar cachimbo a boca fica torta mesmo….

  3. Maria Cristina Fernandes é editora de Política do diario “Valor”

    e pelo chilique em forma de editorial está querendo aderir ás hostes black bocks “contra tudo o que está aí” menos meu patrãozinho que me paga tão bem para falar mal do PT.

    Ainda existe gente que paga para ler isto? A grana anda tão solta assim?

  4. Obrigado Nassif, por publicar

    Obrigado Nassif, por publicar este artigo pois mostra claramente como o PIG tentará sempre transferir ao PT a conta de suas traquinices. Quem elevou os chamados black blocs ao estágio de celebridades senão o PIG? Quem oferecu glamour ao vandalismo? Essa “jornalista” é mesmo uma pena de aluguel.

  5. Coerência  só o grupo para

    Coerência  só o grupo para quem a  moça  trabalha. 61 anos dedicados aos mesmos objetivos é coisa  de Guiness(deixe a cerveja  fora dessa!).

    Sabe lá o que é conspirar como quem respira,isto é,  às 24 horas  ?

    O longevo  “dr.”Roberto,manteve a tradição até o último suspiro transmitindo aos pósteros juntamente com

    o império que o colocava como uma das  grandes fortunas das Américas,os seus  princípios  basilares .

    Hoje,seus periódicos   estão irreconhecíveis. Provincianismo e mediocridade é binômio modesto que conquistaram ao longo destes    últimos  doze anos.

    Pior, é   a hipócrita  tentativa  de  convencer os  desprevenidos do  seu arrependimento  pela participação no golpe  de 

    1964. Só acredita o néscio e o nefelibata.  E, certamente os amanuenses que lá pensam que  escrevem….

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