A grande oportunidade de redesenhar São Paulo

Nas próximas semanas, os paulistanos serão convidados a opinar sobre um tema que poderá definir o perfil da cidade daqui para o futuro.

Trata-se da discussão sobre o PIU (Projetos de Intervenção Urbana), que deverá se constituir no principal instrumento legal para as grandes intervenções urbanas, um verdadeiro redesenho da metrópole, conforme projeto lançado pelo prefeito Fernando Haddad.

Pela primeira vez, desde as intervenções no Vale do Anhangabaú, haverá a possibilidade de desenhar uma nova cidade. Ao longo das margens dos rios Tietê e Tamanduateí, do traçado das velhas ferrovias, em regiões abandonadas por indústrias, poderão ser colocados em prática modernos conceitos de urbanismo, como o de respeito à população local, a mesclagem de emprego, residência, comércio, conjuntos habitacionais para a classe C convivendo com imóveis para as classes A e B, as preocupações ambientais e de sustentabilidade, a integração com os espaços públicos.

Essa realidade passou a ser possível, de um lado, pela aprovação do novo Plano Diretor da cidade, definindo claramente as áreas de expansão e os princípios ordenadores. De outro, pela Medida Provisória 700, de 8 de dezembro de 2015, que estipulou novas regras para a desapropriação. Definida a utilidade pública, prevista na Lei de Zoneamento, haverá imissão prévia de posse. Se houver concordância do proprietário em relação ao valor oferecido, fecha-se o acordo. Não havendo concordância, discute-se na justiça, mas sem paralisar a desapropriação.

A partir daí abriu-se uma enorme possibilidade de grandes intervenções urbanas nas cidades, monitoradas pelos respectivos Planos Diretores.

Fatores de desenvolvimento urbanístico

São Paulo cresceu sem três grandes fatores norteadores do desenvolvimento urbanístico, conforme escreveu recentemente Philip Yang, fundador do Instituto de Urbanismo e Estudos Para a Metrópole.

O primeiro, a inexistência da paisagem urbana marcante, caso do Rio de Janeiro.

O segundo, a carência de grande patrimônio histórico, como Roma, Paris, Londres e Pequim.

O terceiro, a inexistência de um plano anterior, com continuidade, e que lá atrás apontassem com clareza uma visão espacial da cidade. Nova York começou a ser desenhada em 1811; Paris em 1850; Chicago, em 1909.

O de São Paulo praticamente começa agora, a partir da nova Lei do Zoneamento.

Trata-se de um jogo com enormes possibilidades, no qual a arte consistirá em juntar da maneira mais criativa possível os seguintes elementos:

1.    Marco Regulatório

O Plano Diretor e a Lei de Zoneamento, para identificar as áreas passíveis de intervenção. Essas áreas denominadas de Macroáreas de Estruturação Metropolitana, são compostas por três setores: o Setor Orla Ferroviária e Fluvial (às margens do Tietê, Tamanduateíí, e nos espaços das antigas ferrovias), Setor Eixos de Desenvolvimento e Setor Central.

2.    Os Arcos do Futuro

Englobando as Operações Urbanas Consorciadas Água Branca, bairros Tamanduateí e Arco Tietê.

Cada área dessas tem um plano urbanístico definindo melhorias no sistema de circulação e mobilidade, áreas verdes e adensamento populacional, capacidade de suporte da infraestrutura viária e incremento de equipamentos públicos.

3.    Rede de estruturação

São os grandes corredores atendidos por sistemas de transporte coletivo de alta e média capacidade, por isso mesmo propícios ao adensamento habitacional e de demais atividades urbanas. Nessas áreas, o objetivo será reequilibrar a distribuição entre moradia e emprego, mudando padrões construtivos e de estruturação urbana.

4.    Rede de equipamentos

São basicamente duas ferramentas da prefeitura, a rede CEUs, com suas 45 unidades integrando cultura, lazer, educação e equipamentos públicos, e as redes Wi-Fi. Em torno de cada CEU foi criado o conceito de Território CEU, tornando-o centro das articulações com escolas municipais, equipamentos públicos, atividades pedagógicas variadas necessárias à educação integral e integrada.

5.    Rede de espaços públicos

Espaços cuja forma de uso está sendo modificada, caso do Centro, Anhangabaú, calçadões.

Os modelos de intervenção urbana

O objetivo dos Projetos de Intervenção Urbana é o de promover a reestruturação urbana de áreas subutilizadas. Deve levar em conta não apenas a proposta urbanística como objetivos ambientais, econômico-financeiros, paisagísticos, mecanismos de participação e controle social.

Esse tipo de intervenção está sendo adotado pelas maiores metrópoles do mundo, de acordo com vários desenhos institucionais.

Na França, o modelo foi o de sociedades de economia mista, com licitações para projetos autossuficientes nos campos energético e de saneamento. Confira, a propósito, a palestra de Guillame Sibaud, sócio da Triptyque Escritório de Arquitetura, no 66o Fórum de Debats Brasilianas (http://bit.ly/1P4UdT0).

Como informou o presidente do Secovi, Cláudio Bernardes, em artigo recente, nos EUA e no Reino Unido, intervenções urbanas foram viabilizadas por mecanismos como os Section 106 Agreements, que regularam a contrapartida privada para a presença de incorporadores em Londres, ou as PPPs que deram moldura a projetos como o Hudson Yards e o Highline em Nova York.

Outra alternativa é o chamado “land poolilng”, pela qual a autoridade pública requisita determinada área de terra, implanta infraestrutura, devolve aos proprietários, após dedução do custo dos investimentos públicos efetuados.

Nos anos 60, Rômulo de Almeida pensou para Salvador um modelo similar. A prefeitura desapropriaria a terra, pagaria por ela. Depois, implantaria a infraestrutura urbana e um projeto de habitação popular. A valorização dos terrenos em volta, com a infraestrutura, seria aproveitada para financiar os projetos.

A consulta pública

A Minuta do decreto que regulamenta o PIU já foi colocada para consulta pública (http://minutapiu.gestaourbana.prefeitura.sp.gov.br/).

Nos próximos meses, deverá ocorrer ampla movimentação de organizações sociais, arquitetos, urbanistas, empresas do setor imobiliário.

Dependendo dos desdobramentos, o PIU poderá resultar em uma São  Paulo jamais imaginada pelos paulistanos, especialmente após o adensamento populacional ter encarecido significativamente qualquer intervenção urbana.

Se houver bom encaminhamento, abertura para as sugestões da sociedade civil, especialmente das áreas atingidas, predisposição para patrocinar projetos inovadores, se deixará uma herança de valor incalculável para as futuras gerações.
 

https://www.youtube.com/watch?v=fGBNEmtKq18 width:700

Luis Nassif

15 Comentários

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  1. Interiorização do Brasil, Plano: Meu Brasil, Minha Vida

    A relação entre população rural e urbana mudou drasticamente no Brasil, nos últimos 60 anos. Antes da década de 50, apenas 30% da população brasileira morava em cidades. Hoje, mais de 80% da população está aglomerada em grandes (ou mega) cidades.

    A passagem de rural a urbano não tem nada de errado, pois são metas que a Europa já tinha conquistado há mais de 100 anos. O problema são as megacidades e a enorme concentração urbana, coisa que na Europa não existe. Com exceção de Moscou (12 milhões de habitantes), não existem em toda a Europa cidades maiores que 10 milhões de habitantes.

    Países da América latina (por conta da política de desenvolvimento baseada na exportação de commodities) sofreram um escorregamento da população para os pontos de saída do fluxo da riqueza nacional. Funciona como se os portos onde saem matérias primas, os shoppings onde o dinheiro do consumo é concentrado, e os bancos por onde o dinheiro é convertido em dólar e flui para o exterior, tivessem um imã para seres humanos. Como o ralo de uma pia. Brasil é isso,uma pia que escorrega para Miami.

    A transformação do transporte ferroviário para as estradas, impulsionado pelo Juscelino, gerou mais condições para a população escorregar até o ralo. Hoje, as velhas estações de trem, em cidades do interior, são testemunhas de um passado bem diferente, de um Brasil que crescia – embora lentamente – para dentro de sim mesmo.

    Muito mérito na ação do Haddad, de humanizar o espaço urbano, mas, acredito que uma boa política nacional seja mudar o fluxo de desenvolvimento, do crescimento econômico e populacional, e do transporte (de todo tipo). O Brasil deve focar em sim mesmo, para dentro. Devem voltar as ferrovias, metros, trem bala, navegação em rios e cabotagem costeira. A vida bonita e calma do interior pode hospedar milhões de brasileiros hoje estressados, que, por causa da tecnologia, não ficarão sem internet nem TV, muito menos de boas universidades ou de trabalho, em pequenas cidades ou em centros urbanos comunicados por menos de 60 minutos num bom trem urbano (muito menos do que a média do brasileiro demora em ir a trabalhar) e, ainda, sobra aquele maravilhoso final de semana com ar puro e natureza.

    Verticalizar a indústria, manufaturar as nossas matéria primas e reverter o fluxo do aço no sentido interior do Brasil (ferrovias, construção civil, maquinaria), dentre outras ações. Haverá um novo Brasil nos aguardando dentro deste extenso território, onde existirá o mais bonito que um ser humano pode aspirar: a riqueza latente, as promessas de um caminho a percorrer, as coisas boas ainda por fazer, e esperança de que o futuro pode ser melhor, porque o Brasil é um país em construção, e esta construção ainda não começou pra valer.

  2. Pois é, a população

    Pois é, a população paulistana terá uma oportunidade única de levar São Paulo para o futuro, de participar de fato das transformações e melhorias a serem discutidas.

    Entretanto, receio que os paulistanos não montarão neste cavalo selado, não aproveitarão a janela de oportunidade, muito devido ao alto grau de “coxinização” pelo qual a cidade atravessa.

    1. Esse é o X da questão

      O paulistano não quer levar a cidade para o futuro. Pelo contrário, a maioria deles quer é o retorno ao passado, idealizam uma cidade perfeita da época do quarto centenário, dos anos 50… E é possível ver e ouvir coisas desse tipo até de pessoas que nasceram nos anos 80 e 90!

      Para constatar isso, basta andar pela cidade e ver/ouvir:

      – um monte de monstrengos arquitetônicos, os chamados edifícios “neoclássicos”, que são apartamentos com arquitetura geral retrô, inclusive com varandas cheias de balaústres e pórticos, portões e decoração que mais parecem retirados do Museu do Ipiranga

      – grafites retratando a “cidade” (centro) entre os anos 1920 a 1950 em grandes avenidas

      – ouça qualquer uma das rádios de notícias e você ouvirá loas e mais loas ao que SP era há 60/70 anos atrás… mas somente no centro e áreas nobres, que fique bem claro

  3. Hahaha, você acha mesmo,

    Hahaha, você acha mesmo, Nassif, que esse tipo de conversa cabe no bestunto de um paulistano? Ou é só torcida?

    Paulistano quer pegar o carro e ir ao restaurante da moda; pegar o avião e voltar contando historinha; tudo entre uma e outra piadinha sem graça e uma frase de “valente guerreiro MBA”…

    É um tremendo erro falar em “falta de planejamento urbano”. O plano é esse que está aí não é de hoje! Pura “espoliação urbana” (título de um classico de Lucio Kowarick, e com prefácio de, de, de FHC, rsrsrs)!

  4. MAIS UMA BOA INICIATIVA E

    MAIS UMA BOA INICIATIVA E MAIS UM ARTIGO

    AGREGADOR Q NOS RECONFORTA DESTA MARÉ NEGATIVA

    PAUTADA POR UMA MÍDIA GOLPISTA QUE NÃO DESEJA O BRASILEIRO

    COM AUTOESTIMA E SEMPRE POSITIVO(SENDO ASSIM Ñ PROGRIDE NÉ!!!)

  5. Tá brincando, Nassif…?

    “São Paulo cresceu sem três grandes fatores norteadores do desenvolvimento urbanístico, conforme escreveu recentemente Philip Yang, fundador do Instituto de Urbanismo e Estudos Para a Metrópole.

    O primeiro, a inexistência da paisagem urbana marcante, caso do Rio de Janeiro.

    O segundo, a carência de grande patrimônio histórico, como Roma, Paris, Londres e Pequim.

    O terceiro, a inexistência de um plano anterior, com continuidade, e que lá atrás apontassem com clareza uma visão espacial da cidade. Nova York começou a ser desenhada em 1811; Paris em 1850; Chicago, em 1909.”

    São Paulo foi fundada no entrocamento de dois grandes rios, cercados de matas e montanhas, que possibilitavam um deslocamento fácil. Fazem parte de uma bacia de milhares de córregos, hoje soterrados e transformados em esgotos.
    Uma paisagem belíssima e propícia à navegação, que dava acesso ao interior e por isso mesmo já era um polo de intersecção antes mesmo da colonização.
    Uma Veneza ou Amsterdã tropical!

    O patrimônio histórico urbano entendido como construções antigas não existe no Brasil porque nossos antepassados – ao contrário das civilizações andinas – não dominavam a arquitetura urbana e as técnicas de construção com pedras. Ocas de palha e casas de taipa não resistem ao tempo! Isso não quer dizer que ele não existiu!

    Os planos anteriores não foram inexistentes! Eles simplesmente não foram escritos, porque nossos antepassados eram analfabetos durante muito tempo e nossa cultura ainda é majoritariamente oral. Nossos vizinhos andinos também não tiveram esse problema, bem como os empresários ingleses e alemães, Prestes Maia e seus sucessores, que planejaram, desenharam e escreveram muito bem a destruição de todo nosso patrimônio, que muito mais do que histórico era ambiental também!

    Você acha que a retificação dos leitos do Tietê, Tamanduateí e Pinheiros, para ocupar as terras baratas das várzeas não foi planejada, escrita e inscrita nos cartórios?|

    O que são os “modernos” piscinões politécnicos de hoje, senão várzeas artificiais de concreto?

  6. Paulistano é provinciano reacionário.

    Não acredito na reeleição de Fernando Haddad.

    Ele colocou a camada média paulistana que adora ser a forma caricatural do “american way of life” frente ao espelho, deixou exposto em praça pública o seu ridículo. e ela não gostou disso.

    A mídia paulistana é a primeira camada de controle e repressão tentando vender para os “acampados” em São Paulo a idéia de que toda a poluição, insegurança, trânsito parado e tudo o mais que torna esta cidade inóspita e hostil para a vida humana como “exemplos da modernidade da locomotiva do Brasil”.

    Um exemplo simples é a Rádio Millenium, digo, Jovem Pan. Conservadora (foi plataforma midiática de Jânio Quadros) e provinciana (seus “noticiários” têm como trilha sonora a horrenda “Sinfonia Paulistana” (“são paulo que amanhece trabalhando…)), de Billy Blanco, com seus locutores narrando as noticias com voz empostada. Sempre exaltam a “modernidade” paulistana enquanto louvam ações violentas da Polícia e deploram quaisquer políticas de inclusão social.

    Quando a mentira fica grande demais e sua narrativa fica muito incoerente, clamam para a ROTA “agir com energia” contra os “vândalos” e colocam a culpa nos “petralhas”.

    A burguesia paulistana vive em condomínios no raio de 100km da capital ou em mansões paulistanas vigiadas como se estivessem na “zona verde” em Bagdá. Vai e volta de carro blindado ou helicóptero e não vê a cidade. Quer que dane-se o povo que produz a sua opulência brega. Quase um cenário do filme “Elysium”.

    Que negócio é esse deste Prefeito vermelho querer transformar São Paulo em um local habitável? As coisas estão tão bem para esta burguesia com esta cidade a continuar a ser uma grande Soweto.

    Vão eleger um dos “riquinhos” que a direita lançar como candidato a Prefeito.

    1. A sua visão da cidade de São

      A sua visão da cidade de São Paulo e de seus moradores é uma visão televisionada, radiofônica e cheia de preconceitos, iguaizinho ao que criticou. Se analisasse, veria que os prefeitos eleitos fogem muito do seu desejo de encontrar um inimigo: elegemos Erundina, uma líder de esquerda até hoje, com uma independência de pensamento que virou sua marca. Desejo muito sucesso ao partido que tenta criar; elegeu na sequência Paulo Maluf, um conhecido político e empresário, cujo mote de eficiência (não concordo, para mim suas obras geraram o oposto, que é a degradação do entorno pelo rodoviarismo bocó) caiu como uma luva no direitismo que renascia no começo dos anos 90; Maluf elegeu seu sucessor, um economista que ficou conhecido pelo seu padrinho político como a eficiência por trás do “Maluf que fez”. Ah, o Celso Pitta também era negro (quantos prefeitos negros salvador ou o rio elegeram?), mas nunca usou isso politicamente; logo após, elegemos a Marta, uma socialite que era de esquerda, implantando melhorias reais no transporte público e na educação municipal; o Serra foi muito breve, mas seu sucessor Kassab fez um governo corporativista, privilegiando a sua profissão de corretor imobiliário. Quando em campanha a Marta sugeriu que era homossexual, sua intenção de voto explodiu. Paulistano não liga para essas coisas, com a óbvia exceção dos fanáticos religiosos; para terminar, nosso prefeito atual é o Haddad, um prefeito claramente progressista, honesto e que enche de orgulho seus eleitores.

      Se você desligar a televisão e sair nas ruas, vera uma cidade com um pensamento diversificado e em nenhum momento hegemônico de qualquer lado, ao contrário do que diz.

  7. A prefeita Luiza Erundina

    nos anos 80 quando Erundina se elegeu prefeita de SP. Atrevida, onde se viu , mulher, petralha e nordestina querer governar a cidade da elite reacionária ?
    Ela fez muitas melhorias no transporte , saude e educacäo.  era visível aos olhos do trabalhador, do morador da
    periferia, mas a mídia foi mais competente, queimou a imagem da prefeita e elegeu Maluf depois dela.

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