Cameron, Hollande e a rivalidade entre França e Inglaterra

Por MiriamL

Do Uol

Hollande e Cameron revivem rivalidade histórica entre França e Inglaterra

Coluna do Alencastro

De Paris

A visita oficial à Inglaterra de François Hollande, recebido na semana passada pelo primeiro ministro David Cameron e pela rainha Elizabeth, fez aflorar as picuinhas que perpetuam a relação conflituosa entre Paris e Londres. Há uma longa rivalidade histórica entre a França e a Inglaterra. Da morte de Joana d’Arc, queimada na fogueira em Rouen (1431) por um tribunal eclesiástico manipulado pelos invasores ingleses, às guerras napoleônicas (1803-1815) e à desconfiança de De Gaulle, vetando em 1967 a entrada da Inglaterra na Comunidade Econômica Europeia (precursora da União Europeia), um contencioso multissecular separa franceses e ingleses. Decerto, os confrontos militares cessaram no século 19. Desde 1904 vigora a Entente Cordiale que consolidou a aliança entre os dois países nas duas guerras mundiais e na Guerra Fria. 

Mas os desentendimentos anglo-franceses prosseguem nos campos diplomático e econômico. A esse respeito, François Crouzet, o grande historiador da Sorbonne especialista da história britânica escreveu um livro emblemático: “A superioridade da Inglaterra sobre a França, a economia e o imaginário”(1985). Durante a presidência de Nicolas Sarkozy, o entendimento foi bom, na medida em que os sucessivos governos britânicos, trabalhistas e conservadores, estavam próximos das posições francesas na política europeia e internacional. Agora, o quadro mudou.

Com o euro e a UE ameaçados pela maior crise econômica mundial desde 1929, há um governo proclamadamente socialista na França e um governo ostensivamente conservador na Inglaterra. Durante a campanha presidencial francesa, Hollande viajou para Londres e encontrou-se com Ed Miliband, líder dos trabalhistas. Mas David Cameron recusou-se a recebê-lo na sede do governo britânico. Na reunião do G20, no México, Cameron tomou a liberdade de dar palpites sobre a política francesa, afirmando que desenrolaria “um tapete vermelho” para receber na Inglaterra os franceses que se mudassem para lá, fugindo do aumento de impostos proposto pelo governo Hollande. A declaração foi mal recebida pelo governo francês e um alto funcionário parisiense, citado ‘em off’ pela imprensa, comentou: “Os ingleses costumavam ser mais bem educados!”

Logo depois, o jornal londrino “Daily Telegraph” anunciou que o governo francês preparava um novo imposto imobiliário que incidiria sobre as 200.000 residências de férias que os ingleses possuem na França.

Durante a visita oficial, os dois governos tentaram desfazer os mal-entendidos. Hollande foi convidado pela rainha Elizabeth 2ª para tomar um chá no castelo de Windsor. A imprensa foi informada que, apesar de Hollande falar muito bem inglês, ambos conversaram em francês (Elizabeth 2ª, como sua mãe, foi educada por governantas francesas e fala francês fluentemente). O ato foi interpretado como uma homenagem da rainha à França e ao presidente Hollande. O comunicado francês explicitou ainda que Elizabeth 2ª “seguia de perto a atualidade política da França”.

Em seguida, na entrevista coletiva em Londres, Cameron e Hollande aplainaram as discordâncias. Hollande usou o humor britânico para comentar a questão do diferencial de impostos entre a França e a Inglaterra. “ Os impostos não são tão diferentes. A faixa mais alta do imposto de renda é de 45% na Inglaterra e 41% na França… e isto não leva os Britânicos a se mudarem para a França, exceto os que tem lá residências de férias, as quais não terão impostos suplementares”.

O jornal de centro esquerda inglês, “The Independent”, geralmente pró-União Europeia (UE), saudou o entendimento entre os dois líderes. Mas o “Financial Times”, mais cético com relação à UE, escreveu que Cameron e Hollande divergiram na abordagem das questões tributárias e de política econômica. No entanto, malgrado as diferenças que os separam, Cameron e Holande estão de acordo sobre um tema essencial para a continuidade da UE. Ambos se opõem à Angela Merkel e apoiam a criação dos eurobonds que seriam emitidos pelo Banco Central Europeu para enxugar a dívida incontrolável dos países mais frágeis da zona euro.  

Luis Nassif

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