Dilma Rousseff e os riscos da e-mailcracia, por Fábio de Oliveira Ribeiro

Sempre que passa a ser utilizada pela administração pública, uma inovação tecnológica acarreta benefícios e problemas. A escrita possibilitou aos governantes transmitir suas ordens à distância, conservar informações detalhadas sobre seus domínios e súditos e, principalmente, saber como seus predecessores agiram em situações críticas. Entretanto, a multiplicação das mensagens, relatórios e arquivos de documentos acabou instituindo papelocracias em que os escribas e arquivistas formavam círculos fechados de poder em volta dos governantes paralisando a administração ou afastando-os de seus governados.

A distância entre governantes (eleitos ou não) e governados somente cresceu com o aumento da burocratização do Estado ao longo dos séculos XIX e XX. Há algumas décadas, por exemplo, somente tinham acesso aos benefícios da ação governamental aqueles que conheciam os tortuosos caminhos inventados pelos burocratas. Os herdeiros dos primeiros escribas e arquivistas que serviram os reis, faraós, cônsules e imperadores, aprenderam como se apropriar de parcelas do poder cada vez maiores: eles multiplicavam os requerimentos, complicavam os formulários e alongavam os procedimentos administrativos para, assim, governar pequenos feudos dentro do Estado, vendendo atalhos e facilidades aos cidadãos “mais iguais” e dificultando a vida dos cidadãos “menos iguais”.

O advento da informática e da internet tem o potencial de reaproximar o Estado do cidadão. As novas tecnologias da informação aceleram o contato entre os administrados e a administração e facilitam o controle das ações dos burocratas, reduzindo sensivelmente seu poder em razão dos sistemas não poderem ser modificados sem a atuação de programadores. Os desvios ou desonestidades cometidas em nome do Estado ou do governo podem ser mais facilmente detectados e a responsabilização de servidores mal intencionados se torna uma realidade cotidiana. Mas há dois problemas.

A informatização das ações governamentais e o fluxo de dados em rede geram um vasto e crescente oceano de informações que tendem a ser soterradas em servidores sem que os governantes possam extrair das mesmas indicações úteis de tendências, de problemas e de situações que ficam injustamente excluídas da atividade governamental. Isolados na frente de seus monitores de computador criptografados, os governantes passam a receber relatórios parciais elaborados com base nestes dados, sem ter condições de conferir pessoalmente se os mesmos refletem a realidade do país que administram. Novos círculos de poder se formam em volta dos governantes e eles podem acabar mergulhados numa verdadeira e-mailcracia, perdendo o contato com seus governados. Isto para não falar na espionagem criminosa a que os governos altamente informatizados estão sujeitos.

O populismo (década de 1950) se caracterizava por uma relação direta e, paradoxalmente, superficial entre governantes e governados. O militarismo (1964/1988) se caracterizou por um distanciamento deliberado dos governados, que passaram a ser controlados violentamente pelos agentes do Estado. A democracia que o sucedeu se transformou numa papelocracia, cujo ápice se deu durante o governo Fernando Collor. Isolado do povo, o Caçador de Marajás se tornou presa fácil em razão dos abusos administrativos que cometeu acreditando que ficaria eternamente impune por causa da fidelidade daqueles que estavam em volta dele. A informatização e virtualização da administração pública é coisa recente no Brasil. Todavia, tudo indica que caminhamos rapidamente para uma perda de eficiência governamental. Os riscos decorrentes do distanciamento entre governantes e governados existem e não podem ser desprezados.  

Os governantes são eleitos para governar. Quando se fecham sobre si mesmos (papelocracia ou e-mailcracia) ou se deixam sequestrar por círculos de poder que brotaram dentro da administração, eles perdem o contato com a realidade e colocam tudo a perder. Nos próximos 4 anos a maior tarefa de Dilma Rousseff será se reaproximar do povo brasileiro. A presidenta precisa visitar mais os Estados, tomar conhecimento pessoal dos problemas que possibilitaram o crescimento da irracionalidade e do anti-petismo. Ela também precisará combater dentro de seu próprio governo os servidores nomeados e concursados que conspiraram e conspiram para instituir uma e-mailcracia que paralisa a administração e a distancia da população. 

Fábio de Oliveira Ribeiro

4 Comentários

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  1. Fábio, eu não tenho tua capacidade, mesmo assim

    não fica bem rebateres cada comentarista/comentário.Cá entre nós e q ninguém nos veja: pulei tuas 1sª linhas e fui pras outras,de trás pra diante,e cito:”(…)A presidenta precisa visitar mais os Estados, tomar conhecimento pessoal dos pro- blemas que possibilitaram o crescimento da irracionalidade e do anti-petismo (…)”. Não entendo. Há irracionalidade e antipetismo – como é fácil dizer que os outros é q se guiam por irracionalidades!… – bem pertinho, fomentados  inocen-temente, muuito pertinho.Ou tu achas q o PT, de alto a baixo, não tem nada a ver c/isso, internamente e “pra fora”  ? Contém teu orgulho, q contenho minhas imperfeições, combinado?

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