Explosões em Beirute ameaçam segurança alimentar do Líbano, que importa 85% do que consome

Metade dos moradores de Líbano já viviam na pobreza antes mesmo das explosões. E com a tragédia desta semana, “a vulnerabilidade só aumentou”, aponta o representante da OMS

REUTERS – HANNAH MCKAY

Da RFI

As explosões de terça-feira (4) em Beirute podem provocar uma crise alimentar no Líbano, país que importa 85% do que consome e já enfrentava dificuldades econômicas. Parte do trigo estocado na capital foi destruído e a população teme a falta de pão. Comunidade internacional começa a enviar ajuda.

A destruição do porto da capital libanesa limitou o acesso à comida no país. As deflagrações afetaram os maiores silos de armazenamento de cereais do Líbano. Quase 15.000 toneladas de trigo, milho e cevada estocados foram destruídos na gigantesca explosão, assim como uma fábrica de farinha que ficava ao lado.

Os libaneses temem que a destruição dos silos, com capacidade para armazenar 120.000 toneladas, acentue a escassez de trigo no Líbano, que já era grave em razão da profunda crise econômica que o país enfrenta. As importações foram reduzidas nos últimos meses pela falta de liquidez e as restrições bancárias.

Segundo o Blominvest Bank, as atividades nos contêineres de cereais já haviam diminuído 45% no primeiro semestre de 2020. Além disso, os preços aumentaram de maneira expressiva devido à desvalorização da libra libanesa.

“Quando vimos os silos (destruídos), entramos em pânico”, conta Ghasan Bu Habib, presidente da rede de padarias Wooden Bakery. “Já tínhamos dificuldades com a pouca farinha e trigo disponíveis. As fábricas não tinham o trigo ou combustível necessários para funcionar”, explica.

Após as explosões, o medo tomou conta dos habitantes de Beirute, que correram para as padarias. “O pão é a única coisa que pode saciar os pobres, já que não podemos sentar para comer um bife com faca e garfo”, comentou Haidar Mussaui, funcionário de uma padaria no bairro comercial de Hamra.

“Já enfrentamos a Covid-19 e a crise econômica, e agora esta catástrofe”, lamenta Suha Zeaiter, diretora-executiva do banco de alimentos libanês, que organiza programas de distribuição de alimentos para as famílias pobres.

Ajuda internacional

A ONU já desbloqueou € 9 bilhões de seu fundo humanitário, mas lançou nesta sexta-feira (7) um apelo urgente à solidariedade internacional. Além da tragédia humana, com um número de mortos e feridos que não para de crescer, a Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação (FAO) afirmou que teme a curto prazo um problema de abastecimento.

Diante dessa situação, a Organização Mundial da Saúde (OMS) afirma precisar de € 15 milhões para enfrentar a crise no Líbano, enquanto a Unicef diz que serão necessários pelo menos € 8 milhões para efetuar suas ações em Beirute. O apelo foi feito durante uma coletiva de imprensa que também reuniu representantes do Programa Alimentar Mundial (PAM), do Alto Comissariado dos Direitos Humanos (ACNUDH ) e do Alto comissariado para os refugiados (ACNUR).

Elisabeth Byrs, porta-voz do PAM, teme que os estragos provocados pelas explosões não apenas limitem o fornecimento, como também “provoquem um aumento de preço dos alimentos, que se tornarão inacessíveis para muitos”. A agência vai enviar 5.000 kits compostos por lentilha, arroz, sal e atum. Cada pacote desses é capaz de alimentar cinco pessoas durante um mês.

Países se mobilizam

Vários países também começaram a se mobilizar. Além da ajuda francesa anunciada na quinta-feira pelo presidente Emmanuel Macron, os Estados Unidos informaram nesta sexta-feira o envio imediato de US$ 15 milhões em alimentos. A ajuda é equivalente a três meses de comida para 50.000 pessoas e três meses de medicamentos para 60.000 pessoas.

O Exército norte-americano também realizou uma entrega de primeiros socorros na quinta-feira, com uma aeronave transportando comida, água e suprimentos médicos.

O Kuwait prometeu o envio de um avião com ajuda médica, enquanto o presidente egípcio, Abdel Fatah al-Sisi, assim como o emir do Catar, xeque Tamim bin Hamad Al-Thani, e o rei da Jordânia, Abdullah II, anunciaram a abertura de hospitais de campanha em Beirute. Países europeus, como Reino Unido, Alemanha e Holanda também expressaram sua solidariedade e prometeram o envio de ajuda.

Crianças desabrigadas e hospitais danificados

“As necessidades são enormes e imediatas”, explicou Marixie Mercado, porta-voz da Unicef. Segundo a representante da agência da ONU, cerca de 100 mil crianças tiveram que deixar suas casas.

Já a OMS teme a saturação dos hospitais, com a falta de medicamentos e produtos básicos para tratar as vítimas. “Três hospitais não funcionam mais e dois foram parcialmente danificados”, explica Christian Lindmeier, porta-voz da organização.

Metade dos moradores de Líbano já viviam na pobreza antes mesmo das explosões. E com a tragédia desta semana, “a vulnerabilidade só aumentou”, aponta o representante da OMS.

(Com informações da AFP)

Redação

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