Iniciativas de inovação política para participação negra nas eleições

Nas eleições municipais de 2016, apenas 8 em cada 100 candidatos se autodeclaravam negros, segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE)

Foto: Agência Brasil

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Por Ingrid Assunção Farias

Nessa semana tivemos a votação histórica do TSE que define cotas raciais para eleições 2020, desde número de candidaturas até regras para distribuição dos fundos eleitorais. Sendo assim a Coluna Discursos Não Pacificados apresenta a iniciativa do Projeto Enegrecer a Política, que nasce no nordeste brasileiro e ganha repercussão e ação nacional num levante de diversas iniciativas de inovação política para ampliação de pessoas negras nos processos de disputa de poder. 

 

 

O Projeto “Enegrecer a Política” pretende aumentar número de candidaturas negras no Brasil. Entre ações do projeto, que conta com sete organizações de todo o Brasil, estão o mapeamento de candidaturas negras e a organização de rede de apoio voluntário a campanhas negras comprometidas com direitos humanos e luta antirracista. Iniciativa será apresentada em live na próxima terça (25).

 

Apenas 8% das candidaturas municipais de 2016 se autodeclararam negras, segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral. A Fundação Getúlio Vargas, por sua vez, indica que menos de 25% da legislatura federal é composta, atualmente, por pessoas negras. A necessidade de mudar esses números reuniu sete organizações de todo o Brasil (incluindo grupos de Pernambuco) no projeto nacional Enegrecer a Política, que será apresentado em live na próxima terça-feira (25), às 20h, no canal do Youtube.

 

Mapear, debater e apoiar o aumento do número de candidaturas negras para as Eleições 2020 no Brasil, em especial nas regiões Norte/Nordeste, são alguns dos principais objetivos do projeto, além de incentivar a participação política de modo geral das pessoas negras nos processos de tomada de decisão.

 

Liderado majoritariamente por mulheres negras, com representações dos estados da BahiaParáPernambuco e Rio de Janeiro, o foco da Enegrecer é discutir a baixa representatividade negra nas câmaras e governos e criar estratégias para fortalecer essa presença. A live trará como tema “Por Que Enegrecer a Política?”, em que representantes das organizações falarão ao vivo sobre participação de negras e negros na política institucional do país, causas e resultados desse cenário e os caminhos possíveis para se ocupar mais espaços de disputa e poder.

Ingrid Farias, uma das coordenadoras do projeto e mediadora da live, explica que uma eleição com mais pessoas negras eleitas é chave para a luta em defesa dos direitos humanos e por uma sociedade mais igualitária. “A atuação de parlamentares negros tem sido reconhecida pelos movimentos sociais por resistir contra projetos de lei que resultam em políticas públicas que perpetuam racismo, sexismo e desigualdade. O aumento de parlamentares negros e negras alinhados com a defesa dos direitos e da luta antirracista tem sido fundamental para ampliação da atuação contra ataques institucionais racistas, e a favor de propostas pela garantia de direitos e reparação histórica à população negra brasileira”, defende a ativista.

 

Mapear candidaturas e criar redes de apoio

Para entender melhor o cenário, o Enegrecer a Política lançou o Mapeamento de Candidaturas Negras 2020, formulário que tem recebido inscrições de mais de 300 candidatos e candidatas de todo o Brasil, desde quilombos rurais até periferias urbanas, com respostas sobre condições, dificuldades e anseios das candidaturas atuais.

 

Além disso, tem pesquisado as candidaturas negras nas Eleições 2016 nas cidades de Belém (PA), Recife (PE) e Salvador (BA), uma vez que as regiões Norte e Nordeste são foco das ações. Os dados comporão futuramente um dossiê público de acesso gratuito, com dados também das próprias eleições.

 

Outra ação do projeto é a criação de rede de apoio para as candidaturas negras por meio do Voluntariado Antirracista 2020, em que pessoas (de qualquer cor) interessadas em oferecer trabalho e apoio voluntário a candidaturas negras podem deixar sua inscrição. O objetivo da plataforma é incentivar a sociedade civil também a se engajar nas candidaturas em que reconhecem seus ideais e ajudar a cobrir uma grande lacuna, que é a pequena quantidade ou escassez de recursos humanos para dar conta de uma candidatura negra, tendo por causa desde as próprias condições materiais de candidatos e candidatas até falta de apoio nos próprios partidos.

 

Próximos passos

Nas próximas semanas, o projeto passa a incidir mais diretamente na corrida eleitoral com uma campanha pelo voto em pessoas negras, com ações de comunicação, realização de lives temáticas, lançamento de vídeos e divulgação das pesquisas realizadas até então sobre candidaturas de 2016 e 2020. Um dos objetivos da campanha, além de fomentar o voto em pessoas negras, tanto por pessoas negras como por pessoas não-negras (é importante frisar), é dar espaço para discussões e proposições das candidaturas negras para as cidades brasileiras.

Por que Enegrecer a Política?

Enegrecer a Política é urgente, confirmam os dados. Segundo a Fundação Getúlio Vargas (FGV), menos de 25% da legislatura federal atual é composta por negros (22,02%) e negras (2,5%). Além disso, entre os homens eleitos para a Câmara Federal em 2018, apenas 4% são negros.

 

Nas eleições municipais de 2016, apenas 8 em cada 100 candidatos se autodeclaravam negros, segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), responsável pela divulgação das candidaturas registradas no Brasil. Apenas a partir das Eleições de 2014, conforme Resolução nº 23.405/2014 do TSE, dados sobre cor ou raça passaram a ser declarados pelos candidatos.

 

Tais números não são representativos, quando se tem em mente que a população negra residente no país é de 50,7% e, dentro desse número, 53% são compostos por mulheres negras, segundo o IBGE. Por outro lado, os dados dialogam com a realidade brasileira: no trabalho, negros são maioria da mão-de-obra, mas só ocupam 10% dos cargos de chefia; e pessoas negras recebem até 31% menos que pessoas brancas; no desemprego, a taxa de desemprego é de 5,5% para brancos, mas sobe a 7,1% entre pessoas negras; todos dados do IBGE.

 

Por eleições mais igualitárias

O Enegrecer a Política surge em meio a uma série de iniciativas da sociedade civil pela necessidade de aumentar e melhorar os espaços da política institucional no Brasil na luta pelo fortalecimento da democracia, com criação de projetos, coletivos e plataformas que visam conectar candidatos e candidatas comprometidas com os direitos humanos com cidadãs e cidadãos votantes. Alguns exemplos são a campanha #EuVotoEmNegra; a Coalização Negra Por Direitos;; o Me Farei Ouvir, que lançou recentemente o Manual da Mulher Candidata; e a PANE – Plataforma Antirracista nas Eleições, entre outros.

 

É necessário disputar a democracia representativa como estratégia para luta política por direitos, compreendendo os limites dessa intervenção e garantindo que essa incidência tenha papel político importante para qualificar disputas, ampliar participação social e influenciar inserção de outros perfis de grupos sociais nos espaços de poder, como negros, indígenas, mulheres e outros corpos que sistematicamente foram silenciados”, argumenta ainda Farias. 

 

Quem faz o Enegrecer a Política?

A iniciativa é conduzida por sete organizações da sociedade civil e movimentos sociais dispostos pelo Brasil: Bigu Comunicativismo (PE)Blogueiras Negras (PE)Coletivo de Mulheres Negras Maria-Maria – Comunema (PA)Fórum Marielles (BA)Mulheres Negras Decidem (RJ)Observatório Feminista do Nordeste (NE) e Rede Nacional de Feministas Antiproibicionistas – Renfa/PE (PE). Estamos em quatro estados de três regiões brasileiras: Bahia e Pernambuco, do Nordeste; Pará, do Norte; e Rio de Janeiro, do Sudeste.

 

 

Ingrid Assunção Farias é Programa de Líderes Negras do Fundo Baobá para equidade racial. Ativista antiproibicionista, defensora dos direitos humanos, mãe, nordestina e feminista negra periférica

Redação

1 Comentário

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  1. Esse movimento deveria incluir a implementação dos mandatos coletivos. Considero uma ferramenta extraordinária para aglutinar forças. Eu quero votar em uma candidatura coletiva e trabalhar por ela.

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