O lado humano que envolve a política

Este post de 29 de setembro aborda a mesma questão, centrada também em outro conhecido personagem da nossa política:

Do Blog A Arte das Palavras

O fator humano e a Política

José Serra e Joaquim Barbosa – dois fascinantes objetos de estudo para quem se interessa pelo lado humano da Política.

Aconteceu em 2008. Um dos mais populares governadores dos EUA, cotado para disputar uma futura Presidência, renuncia ao cargo e despede-se da política após a revelação de que era cliente assíduo de uma rede de prostituição de luxo.

http://noticias.uol.com.br/ultnot/2008/03/12/ult23u1451.jhtm

Aconteceu em 1961. Jânio Quadros renuncia. “Foi o maior erro que cometi”, diria depois a um neto. A renúncia levaria o país a uma crise político-militar e, mais tarde, à Ditadura. Jânio não era fissurado em sexo, mas em bebida.

Aconteceu em 1969. O homem pisa na Lua. Até hoje, teóricos da conspiração veem naquelas imagens uma farsa. Uma farsa que envolveria centenas de pessoas, das quais nenhuma até hoje abriu a boca, apesar de viverem num país em que milhões de dólares de adiantamento são pagos por editoras para que sejam revelados fatos exclusivos, como no recente “Não Há Dia Fácil”, relato de um participante do assassinato de Bin Laden.

O que estava presente nos dois primeiros fatos e se encontra estranhamente ausente do terceiro? O fator humano. Aquele que destrói planos pessoais perfeitos e arrebenta qualquer teoria da conspiração do tipo “está tudo dominado”. O fator humano é indomável.

José Serra sonhou a vida inteira em ser presidente da República. Lutou como nenhum outro político por esse sonho, assumido várias vezes em público com suas próprias palavras. E teve a oportunidade de ouro ao disputar a presidência com uma novata na política, em 2010.

Ele, experiente debatedor desde os tempos da UNE em 1962. Ela, enfrentando o público pela primeira vez em 2010.

Ele, apoiado por toda a grande mídia. Ela, massacrada por esta, por blogueiros e colunistas “oficiais” e pela mais sórdida de campanha de correntes de e-mails já vista no País.

Quando se pergunta aos próprios apoiadores midiáticos qual a principal razão do fracasso de Serra, qual é a resposta única? Ele mesmo. A pessoa Serra. O Serra que traiu seus eleitores ao renunciar duas vezes por seu sonho de ser presidente, o Serra que descuidou de fazer um governo atuante e moderno que lhe forneceria referências positivas para as campanhas, o Serra que assumiu realizações que não eram suas, o Serra que só pensava na cadeira presidencial, o Serra que ficou identificado com a atuação de um bando de trolls, o Serra cuja atitude “Eu me basto” alienou seus melhores colaboradores, o Serra desagregador, o Serra violento com a imprensa… O Serra.

Uma vida por um sonho. Que não se concretizou por causa do fator humano.

Joaquim Barbosa, há pouco mais de um mês, era um herói talhado pelo destino. Símbolo da superação social, fiel depositário dos sonhos da grande mídia, alguém que afinal produziria um grande estrago no PT em momento eleitoral, o homem certo no lugar e no momento certos – e cuja popularidade tornaria quase inevitável uma candidatura a Presidente. Nas redes sociais era o Batman, o Justiceiro da Capa Preta, o Vingador do Povo.

Quem perguntar a algum de seus apoiadores por que também esse sonho já acabou, provavelmente ouvirá a mesma resposta: por causa dele. A pessoa Joaquim Barbosa. O Barbosa que desde o início demonstrou estranha impaciência com os procedimentos normais de um julgamento, o Barbosa que afronta qualquer colega que ouse pensar diferente, o Barbosa que se sente ofendido por qualquer motivo, o Barbosa que quer pautar o voto dos colegas, o Barbosa iniciador de bate-bocas lamentáveis na mais alta corte do País, o Barbosa que quis usar o site do STF para atacar em nota o ministro Marco Aurélio, o Barbosa que escandalizou a consciência jurídica do País ao expor seu ímpeto punitivo indiscriminado, o Barbosa que debocha dos réus, o Barbosa que decepcionou com seu comportamento os apoiadores de primeira hora, agora assustados com a possibilidade de que venha a ter um tantinho a mais de poder do que já possui…. O Joaquim Barbosa.

Novamente, o fator humano em ação.

O que causa espanto nessas duas situações é que bastava um pouco de inteligência, um pouco de estratégia, um pouco de paciência para se produzir um final consagrador para ambos, Serra e Barbosa. Mas o fator humano é indomável. E quando ele possui natureza autodestrutiva… tragédia à vista.

Muitos poderão estar pensando num terceiro caso, também óbvio, também atual: Aécio Neves. Mas este, pelo visto, jamais chegará a ter oportunidade tão clara quanto Serra e Barbosa tiveram: bastava esticar a mão e pegar. No caso Aécio, o fator humano destruiu até mesmo essa possibilidade.

Os antigos gregos eram espertos. Sabiam que para produzir uma boa tragédia não precisavam de um vilão hollywoodiano, cujo único pensamento é conquistar ou destruir o mundo.

Na maioria das tragédias da vida real, o maior inimigo está dentro da própria pessoa. Na maioria das histórias da ficção, também.

Luis Nassif

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