Os ecos do baixo nível da campanha de 2010

Por Louren

Realmente, acho que a partir da campanha de 2010, por causa do baixíssimo nível da mesma, a coisa ficou praticamente insuportável, impossível de se trocar ideias num nível minimamente aceitável. Tenho uma experiência interessante sobre isso e peço licença para compartilhar com você.

A minha família tem uma característica interessante: por parte de pai, somos descendentes da “senzala, que ascendeu socialmente”, e, por parte de mãe, somos descendentes da “casa grande arruinada”.

Nossos pais já são falecidos. Ele, agrônomo, funcionário graduado do Ministério da Agricultura e ela professora que se dedicou apenas ao lar. A minha geração (eu e meus 5 irmãos, 1 já falecida) é toda classe média, de nível universitário, profissionais liberais, etc.

Por que conto tudo isso? Porque, na minha família, se reproduz, em ponto menor, o embate da sociedade.

Embora essa origem senzala/casa grande nunca seja comentada (já está praticamente perdida na memória), temos claramente os que pensam como “senzala”, defendendo os pobres, as causas sociais, enfim, os progressistas, que, por isso, votam no PT.

Por outro lado, temos os que pensam como “casa grande” com todos os argumentos da direita e votando com os candidatos da direita.

Conscientemente, nem uns , nem outros, associam sua posição política às origens da familia. Essa é uma observação minha. Como uma curiosidade.

E, acredite, podemos conversar sobre qualquer assunto, somos muito unidos, fraternos, uma convivência excelente em todos os sentidos. Mas, não podemos falar de política. A irracionalidade da “casa grande” inviabiliza qualquer diálogo.

As experiências dos “senzala” são terríveis, porque vivemos cercados dos familiares e amigos da “casa grande” (são todos classe média, de perfil igual ao nosso). Então:

– cansamos de receber, dos amigos, os e-mails terríveis que circulam na internet, inclusive com ofensas.

– ouvimos que somos as únicas famílias que eles (os amigos) conhecem que são PT.

– nossos amigos no facebook são de um reacionarismo que nos horroriza.

E por aí vai.

Como você mesmo pergunta: o que fazer? Nós, “senzala”, compartilhamos algumas táticas de defesa:

– não “puxamos” nenhum assunto político com os “casa grande” da família e quando o mesmo surge da parte deles, respondemos o mais brevemente possível e mudamos o rumo da prosa.

– numa roda de amigos “moradores da orla” (como costumamos nos referir aos agora chamados de coxinhas), após ouvirmos, em silêncio, uma sucessão de sandices em relação ao governo e xingamentos ao Lula e Dilma, meu marido usou um tratamento de choque: se levantou e declarou, alto e bom som, que sempre votou no Lula e na Dilma e vai votar novamente. Foi um escândalo! Gritaram ao mesmo tempo: “Não acredito, um professor da UFRJ votar no PT?” O encontro terminou ali (mas, felizmente, a amizade continua). Só um detalhe, esse espanto se repete a cada eleição. Depois, eles se esquecem e voltam a considerar que pessoas, “do nível deles”, só podem votar como eles, isto é, no PSDB. E voltam a enviar os e-mails.

– os e-mails, não respondemos, por inútil. Perda de tempo e de energia. Deletamos sem nem abrir, a não ser de vez em quando, para monitorar o que está rolando e avaliar o nível.

– um amigo médico enviou um texto escrito por ele mesmo para que eu avaliasse e desse minha opinião. Era sobre o “Mais Médicos”, com comentários absolutamente toscos, que ele, após minhas observações (e de outras pessoas) pretendia dar “ampla divulgação”. Iniciava-se assim: “A Presidente Dilma está muito mal ACESSORADA”. Já que pediu minha opinião, eu dei: Pode começar corrigindo o ACESSORADA. E apontei tudo o que demonstrava o desconhecimento dele sobre o Programa. Sugeri que antes de criticar, ele deveria ter a honestidade de, pelo menos, ler a íntegra da MP. Para ajudá-lo, mandei o link da mesma e, de quebra, o da avaliação da OMS e outros. Ele me respondeu que estava “digerindo” e depois me retornaria. Estou aguardando até hoje. Acho que teve indigestão.

– no facebook, durante as manifestações, só dava ”gigante” que ia para as manifestações andar de um lado para outro como zumbi e postar foto da “balada” e cartazes tenebrosos, ofensivos ou reveladores da mais perfeita ignorância política. Fiz todos os contrapontos que pude, mas, como diz o meu sobrinho “senzala”: “tia, não se consegue acordar quem finge que está dormindo”. Até que os cansados voltaram a postar os gatinhos fofos, os cachorros perdidos, as frases piedosas, etc. Isto é, voltaram a dormir.

– enfim, nós, os ”senzalas”, conversamos, debatemos e refletimos, entre nós mesmos, e compartilhamos tudo o que possa nos instruir, informar, enriquecer e fortalecer em nosso ideal de contribuir para uma sociedade mais justa, igualitária e fraterna.

Espero que esse texto possa ter, para você, esse mesmo sentido.

Luis Nassif

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