As denúncias de violações em comunidades terapêuticas

Do Brasil de Fato

Relatório aponta violações em comunidades terapêuticas  

Interceptação e violação de correspondências, violência física, castigos e torturas são algumas das violações denunciadas em 68 comunidades terapêuticas em 25 estados

Viviane Tavares

do Rio de Janeiro (RJ) 

O Conselho Federal de Psicologia apresentou em 2011 o Relatório da 4ª Inspeção Nacional de Direitos Humanos: locais de internação para usuários de drogas, em que mostra violações das mais diferentes formas em 68 comunidades terapêuticas em 25 estados. 

“Há claros indícios de violação de direitos humanos em todos os relatos. De forma acintosa ou sutil, esta prática social tem como pilar a banalização dos direitos dos internos. Exemplificando a afirmativa, registramos: interceptação e violação de correspondências, violência física, castigos, torturas, exposição a situações de humilhação, imposição de credo, exigência de exames clínicos, como o anti- HIV – exigência esta inconstitucional –, intimidações, desrespeito à orientação sexual, revista vexatória de familiares, violação de privacidade, entre outras, são ocorrências registradas em todos os lugares”, diz o relatório. 

Paulo Amarante lembra que há um distanciamento do projeto original das comunidades terapêuticas. 

“O termo comunidade terapêutica diz respeito a um projeto muito importante surgido na Inglaterra no pós-guerra de democratização das instituições psiquiátricas. Militares, inclusive, naquela visão de reconstrução da democracia, queriam, por meio das comunidades terapêuticas, desenvolver um projeto para envolver aqueles pacientes crônicos abandonados, sem perspectiva de tratamento em atividades cotidianas, como ajudar a fazer comida, a discutir o que está ruim e o que está bom, no tratamento em geral. E isso teve efeitos terapêuticos maravilhosos”, lembra. 

Nova fonte

“A princípio, a comunidade terapêutica não pode ser um local fechado, onde há violência, onde não tenha direitos, ou seja, tudo ao contrário do que essas comunidades estão apresentando. Além disso, elas dizem respeito a um serviço de saúde e não são. São serviços muitas das vezes de caráter religioso e que visam ao lucro. Agora a novidade é que todo mundo descobriu como tirar dinheiro do SUS e essa é uma nova fonte”, analisa Amarante. 

O deputado Adriano Diogo (PT/SP), que é presidente da Frente Parlamentar de Luta Antimanicomial, defende que as comunidades terapêuticas são manicômios disfarçados. “Agora o poder público dá este nome pomposo, mas não passam de centros manicomiais. Elas continuam usando o sistema de tranca, de isolamento, de incomunicabilidade. A maioria é de pessoas que usam isso como negócio, para ganhar dinheiro com poucas e honrosas exceções. É um depósito de gente”, diz. 

A presidente do Conselho Regional de Psicologia do Rio de Janeiro, Vivian Fraga, denuncia que o Estado deveria investir mais dinheiro no SUS no lugar de financiar este tipo de tratamento. 

Organizações religiosas 

“Organizações religiosas não deveriam receber subsídios do Estado. Infelizmente, tal prática não está isolada em São Paulo ou no Rio de Janeiro. Estamos falando de uma diretriz do próprio Ministério da Saúde e financiada, em alguns estados, pela política de assistência social”, aponta. 

A professora da EPSJV, Nina Soalheiro, relembra que durante a ditadura militar houve um crescimento estrondoso de leitos privados e que agora esse fenômeno vem se repetindo. 

“É evidente que a Saúde Mental optou estrategicamente por fazer o credenciamento de instituições por pressão dos setores evangélicos do Congresso e agora passa a regulá-las. Em relação ao incentivo a este modelo, vemos isso de forma clara como o recente programa instituto pelo estado de São Paulo, que entrega um valor à família e já destina o seu uso. É uma bolsa que garante a essas clínicas uma clientela cativa. O Estado então se exime da responsabilidade, financiando um setor privado, que além de tudo tem muitos problemas”, informa, citando o programa ‘Cartão Recomeço’, que destina uma bolsa de R$ 1.350 por mês para custear o tratamento do usuário de crack, mas este benefício só pode ser gasto em comunidades terapêuticas conveniadas ao programa. 

Luis Nassif

0 Comentário

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador